*Fernando Cavalcanti, **Fábio Araújo
As guerras são por natureza imprevisíveis e suas consequências inesperadas. No caso específico da invasão Russa contra a Ucrânia até pouquíssimo tempo atrás diversos analistas especializados em relações internacionais achavam que seria pouco crível a possibilidade de um conflito bélico entre estes dois países, e que a mobilização de tropas russas na fronteira ucraniana não passava uma forma do Kremlin pressionar o governo ucraniano que flertava em aderir à Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN). Não há como não se lembrar de uma celebre frase de Marques de Maricá: “Os homens preferem geralmente o engano, que os tranquiliza, à incerteza, que os incomoda.” E para infelicidade de todos, muitos dos analistas erraram em seus prognósticos.
Um dos primeiros efeitos do conflito foi a escalada dos preços de commodities agrícolas e energéticas. A Ucrânia é grande produtor de grãos e maior exportador global fertilizantes têm sido impactadas diretamente na sua cadeia de produção em virtude do conflito em seu território. Enquanto a Rússia, que é grande produtora e exportadora de trigo, milho, petróleo e natural foi diretamente impactada por sanções de diversos países ocidentais, prejudicando sobremaneira o fluxo destes produtos para o mercado global. Para se ter uma ideia, o impacto no preço do petróleo corresponde a um aumento de 30% sobre os preços previstos antes da guerra.
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Além imensurável crise humanitária que assola a população Ucraniana, com milhões de refugiados tentando escapar dos efeitos diretos da Guerra, o conflito poderá acarretar consequências até o momento incalculáveis para toda a população mundial, como uma crise alimentar em virtude do desabastecimento de grãos e fertilizantes.
Como exemplo, aqui no mercado interno brasileiro, nas últimas semana sentimos o aumento considerável dos combustíveis e de produtos que utilizam o trigo como insumo. Diversos setores já sentem os impactos imediatos da guerra, como o setor de logística, transportes públicos e aplicativos de entregas.
Dados do último relatório Focus do Banco Central apontam que a perspectiva inflacionária para este ano aumento 1 ponto percentual nas últimas quatro semanas, onde o IPCA previsto para este chega 6,59% com tendência de alta. Como consequência, a taxa básica de juros deve fechar o ano acima de 13%, impactando diretamente a atividade produtiva. O Boletim Macro de março da FGV-IBRE, aponta que o aumento da inflação e o desarranjo na cadeia de suprimentos em virtude da guerra já impacta o Índice de Confiança dos Empresários que teve um recuo 1,2% em relação ao mês anterior.
Os efeitos da guerra somados à proximidade do período eleitoral vêm obrigando o governo brasileiro a anunciar diversas medidas nos últimos dias, como tentativa de atenuar os impactos na economia, como a “injeção de 150 bilhões de reais” em medidas como a liberação de novo saque do FGTS; a criação de programa de microcrédito digital; a ampliação de empréstimos consignados e a antecipação do 13º salário de aposentados e pensionistas do INSS. Além disso, o Ministério da Economia zerou até o final do ano as alíquotas de importação de alguns produtos, como macarrão, óleo de soja e outros para ajudar na queda da inflação.
Como se não bastasse as agruras da guerra, os novos surtos de Covid-19 e os consequentes lockdowns em diversas províncias chinesas são um componente adicional de incerteza sobre a economia mundial.
O momento requer muita atenção, em especial às medidas do governo para mitigar os efeitos da crise internacional sobre a economia brasileira sem deteriorar o nosso já combalido quadro fiscal e muita resiliência para desbravarmos este ano desafiador.
*Fernando Cavalcanti é economista e vice-presidente do Nelson Willians Group
**Fabio Araújo é economista e especialista em economia urbana e engenharia financeira
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