O racismo é um desses conceitos que, por mais que a gente fale, sempre tem mais camadas para explorar. É algo que está enraizado nas fundações da nossa sociedade, afetando tudo, da política à economia.
Bom, conversei com Wania Sant’anna, historiadora e pesquisadora de relações raciais e de gênero, presidente do Conselho de Governança do Ibase, colunista do Congresso em Foco na coluna Olhares Negros.
A minha pergunta para a Wania foi: dá para contar com essas plataformas na luta antirracista?
“Em que pese a situação de discriminação racial e racismo presente nas redes de mídias sociais, temos que reconhecer que este lugar virtual também tem sido especial para o contraponto, para o enfrentamento ao racismo. Quando uma situação de racismo chega, nua e crua, às redes sociais, elas apresentam uma situação para os negros e negras não é atual, mas é uma violação de direito, agressão e crime, experimentado por outras pessoas negras e outras gerações de pessoas negras. Dar visibilidade a essas agressões é uma diferença extraordinária no cenário brasileiro, que não raro, minimiza as consequências dessa violação de direitos. A repercussão do que aconteceu em novembro de 2020, com o assassinato do João Alberto Silveira Freitas num supermercado em porto Alegre não teria sido possível se não tivesse sigo gravado e postado em reses sociais e obtive as reações do movimento negro e da sociedade brasileira a esta agressão. Então, a visibilidade dos casos e a nominação de situações de racismo fazem uma diferença enorme nos dias de hoje.”
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Considerando que os espaços virtuais não substituem as interações e os embates do mundo real, como a gente pode expandir essa discussão para o papel das instituições e das políticas públicas, desmascarando a imagem de um país pacífico e tolerante?
Pois é, o Brasil foi construído sobre desigualdades profundas, reforçadas pela escravidão dos negros e indígenas. Para mudar isso, precisamos de ações concretas, tanto no nível pessoal quanto no institucional. E sim, a grande mídia tem um papel crucial neste sentido, e até mesmo programas como o Big Brother Brasil, apesar de superficialidade e da banalização da defesa racial sem ações concretas, também cumpre uma função social. Wania Sant’Anna destaca este papel:
“O que nós podemos afirmar com certeza é que as edições recentes do Big Brother têm trazido o debate sobre racismo e discriminação racial e que as redes sociais repercutem este debate. Podemos concordar ou discordar do tom e das abordagens, mas o programa traz o assunto para o cotidiano da sociedade. Nesse sentido, o programa não é uma bolha e o debate atravessa literalmente as paredes da casa e isso é muito positivo. É perceptível a ampliação da presença negra entre os participantes e outras características da diversidade humana e cultural também estão presentes, além da naturalidade dos participantes das regiões norte e nordeste. São indicativos que demonstram essa diversidade e a mudança de perfil dos participantes. E é sempre desejável que essa mudança seja expandida. No que diz respeito à representação negra, temos então os nossos saberes, as nossas experiências de vida e visão de mundo entrando na casa. Em alguma medida, essas pautas têm sido debatidas, em algumas edições, em algumas mais, em outras menos. É bem diferente das primeiras edições. O Davi, por exemplo, o fenômeno da atual temporada, é um exemplo da mudança, ele é um jovem negro, morador de Cajazeiras, uma das maiores favelas de periferia da cidade de Salvador, ele é uma potência no território”.
E o que a Câmara faz no combate ao racismo?
Projetos e leis que reconhecem nossa igualdade constitucional e combatem o racismo, como a lei de injúria racial, são passos importantes. Mas lembramos: não basta não ser racista; é essencial ser antirracista, famosa frase da escritora Angela Davis.
É preciso que cada cidadão se engaje nesta luta e que o Estado aprofunde a adoção de práticas antirracistas no cotidiano e a implementação de políticas públicas que visem erradicar as desigualdades raciais e promover uma sociedade mais justa e inclusiva.
Nesse sentido, a elucidação do crime contra a vereadora Marielle Franco foi uma conquista do movimento negro, como afirma Wania Sant’Anna.
“Essa é uma semana muito especial para todas as pessoas e organizações dispostas a construir a democracia na sociedade brasileira. Chegar ao ponto que chegamos na elucidação dos assassinatos da vereadora Marielle Franco e seu companheiro de trabalho Anderson Gomes é algo muito importante. É uma demonstração de que a justiça deve um ideal para todas as situações de violações de direito, em especial, quando vidas são ceifas, que é o caso de Marielle e Anderson. E este caso precisa de respostas e de responsabilização. Marielle como vereadora em exercício foi assassinada e vemos de forma mais transparente que as pessoas envolvidas neste caso específico são pessoas da vida política, e este perfil que nos convence a afirmar que foi um assassinato com viés político… O movimento de mulheres negras e o movimento negro estão nesta denuncia e neste pesar a seis anos, desde este 14 de março que está congelado na memória. Nós fomos às ruas todos esses anos, solidários às famílias de Marielle e Anderson. Nós temos uma afeição de Dona Marinete e ao seu Antônio, eles são pessoas muito especiais e se tornaram, de alguma forma, uma parte de nossa família. São a nossa mãe e nosso pai e penso que hoje eles têm muitos filhos e muitos filhos espelhados pelo País e pelo mundo, porque nós nos reconhecemos na dor que eles têm”.
Wania nos lembra que a vereadora sempre será uma voz especial na luta contra o racismo e pelos direitos humanos e diretos das mulheres.
Acesse as nossas redes sociais e deixe a sua opinião. Você tem coragem de se assumir como tendo um legado racista que influencia suas atitudes mesmo que você não perceba isso de forma consciente? Está pronto para virar essa página e refletir sobre suas falas, suas condutas e suas ações? Você escolhe ser antirracista?
O texto acima expressa a visão de quem o assina, não necessariamente do Congresso em Foco. Se você quer publicar algo sobre o mesmo tema, mas com um diferente ponto de vista, envie sua sugestão de texto para redacao@congressoemfoco.com.br.