O senador pelo PSL do Rio de Janeiro, Flávio Nantes Bolsonaro, tem 38 anos e é o filho mais velho do presidente da República, Jair Bolsonaro. Marcado por problemas na Justiça envolvendo transações financeiras suspeitas em nome de seu ex-assessor Fabrício Queiroz, Flávio se destaca pela habilidade política e discrição nos comentários.
Dos filhos com mandato eletivo, Flávio é o único que não comentou publicamente a crise entre o mandatário e o partido que é filiado.
O vereador Carlos Bolsonaro (PSC-RJ) e o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) não só se manifestam sobre a crise como entram de cabeça nas desavenças com os integrantes do PSL.
Carlos passou o último domingo (13) brigando com o líder do PSL no Senado, Major Olímpio (SP), e Eduardo trava uma disputa violenta para derrubar o deputado delegado Waldir (GO) da liderança do PSL e assumir o cargo.
Apesar de não fazer manifestações públicas, Flávio assinou junto com Eduardo Bolsonaro e mais 19 deputados pedido de auditoria externa das contas do PSL.
Por conta dessa crise entre Jair Bolsonaro e o presidente nacional do PSL, Luciano Bivar, Flávio perderá o comando do partido no Rio de Janeiro e Eduardo o de São Paulo. A assessoria de Flávio afirmou que o senador não foi notificado da decisão.
O senador é alvo constante da ala do PSL ligada a Bivar, tanto o líder da sigla na Câmara, delegado Waldir (GO), como no Senado, Major Olímpio (SP), relembram constantemente o caso do ex-assessor de Flávio, Fabrício Queiroz, apontado em relatório do antigo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), rebatizado como Unidade de Inteligência Financeira (UIF), como movimentador de grandes quantias em dinheiro ilícitas em nome de Flávio.
As investigações sobre o caso Queiroz foram suspensas pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes no dia 1º de outubro.
O filho do presidente alegou, em reclamação ao Supremo, que as apurações contra ele prosseguiram no Rio de Janeiro mesmo após determinação em contrário do presidente do Supremo, Dias Toffoli.
O presidente do STF suspendeu, em julho, todos os processos nos quais havia compartilhamento, sem autorização judicial, de dados sigilosos pelo UIF (ex-Coaf).
De acordo com o despacho de Gilmar, Flávio pediu ao Tribunal de Justiça e ao Ministério Público que suspendam as investigações até o julgamento em plenário da decisão de Toffoli, previsto para 21 de novembro. A defesa do senador alega que o Coaf enviou dados ao Ministério Público sem autorização da Justiça.
Para exemplificar que as investigações contra ele continuam, Flávio diz que o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ) determinou, em 27 de agosto, a inclusão de dois habeas corpus apresentados por seus advogados na pauta de julgamento. A defesa sustenta que os recursos não poderiam ter sido pautados em decorrência da suspensão determinada por Toffoli. O argumento foi aceito por Gilmar.
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O filho mais velho do presidente foi acusado por seus colegas de partido no Senado por ter agido para esvaziar as assinaturas para a criação uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que quer investigar membros de tribunais superiores, conhecida como CPI da Lava Toga.
O atrito entre ele os senadores críticos ao STF resultou na saída da senadora Selma Arruda do PSL, que foi para o Podemos.
De perfil mais discreto que seu entorno familiar, o senador costuma agir nos bastidores e não faz declarações impensadas. No Senado Federal, ele ajuda a aprovar matérias de interesse do governo federal e até a escolher indicações que passam pelo seu pai na Presidência da República.
No Senado, Flávio foi o relator da submissão da indicação da Presidência de Luís Fernando Serra para ser embaixador do Brasil na França.
Em um momento fora da curva em abril deste ano, o primogênito de Bolsonaro abriu mão da habitual discrição e escreveu no Twitter: “quero que vocês SE EXPLODAM!!!”. O comentário foi uma resposta ao grupo radical islâmico Hamas, que repudiou a visita de Jair Bolsonaro a Israel.
Um dia depois, o congressista se arrependeu e apagou a mensagem.
O primeiro mandato eletivo de Flávio foi como deputado estadual pelo Rio de Janeiro, cargo que exerceu de 2003 até 2018 quando foi eleito senador. Durante esse tempo ele já foi filiado ao PP, PSC e PSL.
Pelo PSC concorreu à prefeitura do Rio de Janeiro em 2016 ficando em quarto lugar, com 11% dos votos válidos, atrás de Pedro Paulo, candidato pelo MDB, mas hoje no DEM, Marcelo Freixo (Psol) e Marcelo Crivella (PRB), que é o prefeito eleito.
No Senado Federal é o 3º secretário da Mesa Diretora presidida por Davi Alcolumbre (DEM-AP) e participa como titular das comissões de Assuntos Econômicos, de Serviços e Infraestrutura, Comissão Mista de Planos, Orçamentos, Públicos e Fiscalização, Conselho da Ordem do Congresso Nacional, Subcomissão Temporária Sobre a Venezuela e Grupo Parlamentar Brasil-Guiana.
Eduardo Bolsonaro embaixador
Embora tenha esfriado a tentativa do presidente Jair Bolsonaro nomear seu terceiro filho como embaixador do Brasil nos Estados Unidos, durante o auge das negociações, Flávio assumiu um papel de protagonismo em favor do irmão mais novo.
Foi dele inclusive a iniciativa de marcar um jantar para apresentar Eduardo a senadores. Toda indicação presidencial de embaixada precisa passar pelo crivo do Senado Federal. A espécie de pré-sabatina foi feita no final de agosto na casa do senador Lucas Barreto (PSD-AP).
Na época ele ressaltou as habilidades de Flávio como articulador político e as características discretas do político do PSL: “todo mundo gosta do Flávio, essa é que a verdade. Quase não falou nada lá, tem um sentimento diferente, trabalha muito nos bastidores”, disse o senador do Amapá.
Viagem à China
Em setembro após a aprovação do projeto de lei que desburocratizou o regime geral das empresas telefônicas, Flávio e mais um grupo de senadores viajaram à China para conhecer as instalações da empresa de tecnologia da informação Huawei, uma das interessadas em participar das licitações e implantar a tecnologia 5G na telefonia brasileira.
Viagem similar foi feita em janeiro por deputados do PSL. Na época eles foram muito atacados nas redes sociais por apoiadores de Jair Bolsonaro já que estavam em um “país comunista”. O principal insuflador do atrito foi o escritor Olavo de Carvalho, espécie de guru do bolsonarismo. Já na viagem que Flávio fez não houve nenhum tipo de reação.
Ao voltar da viagem Flávio elogiou a tecnologia chinesa: “coisa de outro mundo, nos surpreendemos, fomos sem expectativa nenhuma. Fomos sem saber como era, igual àquelas pessoas que não querem ir para a Europa porque acham que lá só tem programa de velho, museu”.
No entanto, em uma espécie de agrado às hostes bolsonaristas, o senador não poupou críticas ao modelo de governo do país. “Mas é um país autoritário, até as redes sociais são controladas”, disse durante sessão do Congresso Nacional que analisava os vetos presidenciais ao projeto de abuso de autoridade, a primeira que participou após voltar de viagem
Articulação política
O senador usa a facilidade de acesso que tem ao governo federal e auxilia nos projetos de interesse da Presidência. Junto com o líder do governo no Senado, Fernando Bezerra Coelha (MDB-PE), Flávio foi um dos responsáveis pela contenção de danos nos vetos sobre abuso de autoridade. Em vez dos deputados e senadores derrubarem todos os vetos de seu pai, o resultado final foi uma rejeição parcial.
Além disso, o congressista ajudou a debandar a insatisfação do Rio de Janeiro na matéria sobre a partilha das receitas do leilão do pré-sal.
Relatório de autoria do senador Cid Gomes (PDT-CE) usava os fundos Participação de Estados e Municípios (FPE e FPM) como critérios da partilha, isso privilegia estados do Norte e Nordeste.
Para destinar mais dinheiro ao Rio de Janeiro, Flávio apresentou uma emenda na qual a União abriu mão de parte da receita que tem direito em favor de estados exportadores.
Bezerra destacou ao Congresso em Foco o papel do filho de Bolsonaro: “Ele é muito pró-ativo! Se coloca à disposição para ajudar na tramitação de matérias de interesse do governo! Ao buscar proximidade e diálogo com os colegas ajuda a construir um ambiente de maior compreensão no senado!”.
Já a líder do PP no Senado, Daniella Ribeiro (PP-PB), diz que Flávio exerce o seu papel como qualquer senador e que a liderança do governo tem função e nome definidos.
“O papel do líder do governo é bem claro e a função é exercida por Fernando Bezerra Coelho. Flávio cumpre o papel dele como qualquer senador”, disse ao Congresso em Foco.
A senadora relatou o projeto de lei que muda o regime geral das empresas telefônicas. “Aprovação da Lei das Teles foi uma tarefa conjunta de todo o Senado, todos os senadores ajudaram, inclusive a oposição, tanto que foi aprovado por unanimidade”.
Diálogo com a oposição
Em entrevista ao Congresso em Foco publicada no dia 31 de agosto, o senador de oposição Cid Gomes, comentou sobre o filho mais velho de Jair Bolsonaro.
Embora tenha posições divergentes com o governo federal e com as ideiais defendidas por Flávio, Cid não economizou elogios ao falar de como seu colega senador se comporta.
“Eu acho o menino aqui [Flávio], deles na minha impressão o mais ponderado. É um cara discreto, não é arrogante. Essa função é delicada. Eu por exemplo, não gosto, não é da minha índole ser agressivo demais, mas tem horas que esse governo você perde a paciência de procurar um adjetivo menos agudo, mas eu fico envergonhado, envergonhado não, incomodado de fazer na frente dele”, disse.
Também da oposição, o deputado federal Marcelo Freixo (Psol-RJ) foi colega de Flávio por 12 anos, de 2007 a 2018, na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro. O político do Psol também afirmou que a convivência com o então deputado estadual era harmoniosa.
“Eu convivi com Flávio durante 12 anos, sempre tive muito diálogo e todas as divergências, sempre pensamos muito diferente em relação a tudo, a não ser no momento de votar a defesa do funcionalismo público, que muitas vezes votamos igual e era uma brincadeira no plenário dizendo que ele votava igual ao bancada do Psol”, disse ao Congresso em Foco.
No entanto, o deputado do Psol afirmou que não esperava que o ex-assessor de Flávio, Fabrício Queiroz, fizesse transações financeiras ilícitas. Além disso, Freixo acredita que o senador e sua família tem relação com milícias no Rio de Janeiro.
“Sempre muito diálogo, muito respeitoso no trato da diferença. Eu me surpreendi muito quando vi as relações de milicianos, matadores dentro de seu gabinete. O próprio Queiroz era uma pessoa que eu sempre via, sempre encontrava porque trabalhava lado a lado do Flávio todo dia. Não imaginava que o Queiroz fosse uma pessoa que organizasse rachadinha no gabinete de Flávio nem fosse a pessoa que analisasse as entradas da família nas zonas de milícia como ficou muito claro, isso me surpreendeu muito”.
E completou: “mesmo sabendo que eles defendiam a legalização das milícias, uma polícia violenta, o Jair Bolsonaro defendeu tortura, mesmo diante dessas atrocidades eu não imaginava que os vínculos fossem chegar a esse ponto que hoje nós sabemos. Participei de algumas CPIs com Flávio, sempre todas as diferenças, sempre votamos muito diferente em relação a quase tudo, mas me surpreendeu esse movimento dele nesse ponto”.
Perguntado sobre as diferenças entre Flávio e seu pai, Freixo afirma que a essência é a mesma.
“Eles têm o mesmo DNA. O Flávio é mais educado, tem civilidade, se aproxima de uma civilização. diferente do Jair, Carlos… De todos eles é o que mais sabe dialogar, sabe conversar. Mas o pensamento de todos é muito parecido, o Flávio só pensa a mesma coisa de uma maneira mais educada”, disse.
Além de serem colegas como deputados estaduais, Freixo e Flávio foram concorrentes na eleição para a Prefeitura do Rio de Janeiro em 2016. Ao relatar o pleito, o deputado da oposição reforçou a relação tranquila entre ele o senador.
“Disputamos a Prefeitura, ele ficou em quarto lugar, eu em segundo. Tivemos embates normais, alguns debates ficaram mais conhecidos, inclusive com um debate na televisão que ele tentou me provocar e eu fiz uma rebatida que virou meme. Eu falei ‘Flávio, você não tem um problema, você herda’, isso ganhou um espaço muito grande nos comentários das redes sociais. Terminamos a campanha e continuamos convivendo na Assembleia e não mudou a relação, teve um embate normal de campanha”, declarou Freixo.
Durante a disputa em 2016, Flávio desmaiou em debate eleitoral transmitido ao vivo pela emissora de televisão Band. Na ocasião, a também candidata Jandira Feghali (PC do B), médica, tentou socorrer o concorrente, mas Jair Bolsonaro não deixou.
Freixo não estava presente no debate, mas comentou o episódio. “Aquele desmaio dele tem a ver com a pressão da família, da loucura que é conviver com essas pessoas”, disse.
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