Bajonas Teixeira de Brito Junior*
Entre 132 países do mundo, o Brasil é o mais feliz segundo pesquisa do instituto Gallup. Isto foi noticiado pela Veja e anunciado na página do UOL no último dia 30 de agosto. No fim da nota, o jornalista da Veja faz, contudo, uma observação: na categoria “felicidade presente”, o país mais feliz do mundo continua sendo a Dinamarca, enquanto a modalidade em que o Brasil é campeão é a “felicidade futura”.
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Fiquei curioso com o assunto e procurei na internet. Na verdade, o Gallup procura dar uma versão objetiva à sua pesquisa e fala em well-being (bem-estar) ao invés de happiness (felicidade). Em termos do sentimento presente de bem-estar, o Brasil ocupa uma posição menos exuberante mas, em verdade, não menos digna de atenção. Está em sétimo lugar. A Venezuela ocupa a quarta posição, mas isso a Veja não iria revelar (leia mais)
Mas o que me interessou não foi isso. O que me perguntei foi qual seria a posição do Brasil numa pesquisa sobre os países mais atentos à cronologia dos fatos. Penso que os ingleses, sempre bastante escrupulosos com horários e datas, ficariam em primeiro lugar. Mas quanto ao Brasil, eu não sei. Seu forte não é bem a pontualidade, nem o Carnaval tem dia certo para acontecer. O assunto da cronologia me deixou intrigado depois que li, logo em seguida, que um servidor da Abin exibe prova dos ‘grampos’ no STF. Vamos aos fatos:
1) Já me pareceram estranhas essa impessoalidade excessiva e essa dedicação cívica de um modesto “servidor”. Sujeito oculto e anônimo, certamente obscuro e, claro, dedicado, este servidor exibe provas dos grampos. A prova é uma conversa entre o presidente do STF e o senador Demóstenes Torres (DEM-GO). O blog do Josias de Souza diz que a “conversa está estampada nas páginas da última edição de Veja“.
2) A conversa entre Gilmar Mendes e Demóstenes Torres teria ocorrido no dia 15 de julho. Ora, se atentarmos aos fatos, veremos que o nhenhenhém a respeito de gravações do presidente Gilmar Mendes é anterior a essa data e surgiu no bojo da indignação nacional com sua decisão de liberar, pela segunda vez, o banqueiro Daniel Dantas.
3) A Folha de S. Paulo, de 11 de julho de 2008, publicou que “Mendes soube que estava sendo monitorado por uma desembargadora do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3),
4) Certamente, fosse verdadeira a notícia de um araponga pendurado na linha de Mendes, teria levantado vôo no dia 11. Não se precisa mais que o mínimo de bom-senso para chegar a essa conclusão. Por que continuaria a gravar as suas conversas até o dia 15, depois de toda a tsunami em copo d’água levantada pelo ministro?
5) Com base nessas indignações sem objeto perfeitamente configurado, tivemos lenha suficiente para as caldeiras das locomotivas da proibição das algemas; da histérica denúncia de “espetacularização da Justiça” (qual?), e, agora, da “regularização” das escutas telefônicas.
6) Qualquer um sabe que o instrumento mais eficaz de investigação dos crimes de corrupção são as escutas telefônicas. Isso está provado a ad nauseam pelas dezenas de grandes operações da Polícia Federal.
7) O que se afigura, cada vez mais nitidamente, é que há uma equação, mal formulada, típica de estrategistas de sabotagens de meia tigela, que querem a todo custo derrubar Paulo Lacerda da Abin e enfraquecer, por outro lado, tanto quanto possível, a Polícia Federal.
8) De que serve, por exemplo, a súmula vinculante das algemas? Única e exclusivamente para que corruptos ricos não sejam vistos na televisão e nos jornais algemados. Mais nada. O preso pobre, sem direito à “espetacularização da Justiça”, continuará tão algemado quanto antes. Afinal, de bermuda, fugiria mais facilmente do longo braço da Justiça que seu confrade bem sucedido. Além disso, terno e gravata não é a indumentária adequada para o cooper.
9) Essas gambiarras mal feitas para desmoralizar a Abin e a PF são, ao lado dos assassinatos de líderes sindicais no campo, a face mais visível do desejo de alguns segmentos de implementarem a luta de classes no país. Usando métodos típicos da KGB ou da Gestapo, mas sem a macabra competência que as singularizava, plantando fatos desconexos com as datas e sentando para esperar a “espetacularização dos grampos”.
Creio que está na hora de se abrir uma Escola Superior de Intriga e Sabotagem no Brasil. Enquanto isso não acontecer, teremos de assistir continuamente a esses enfadonhos esquemas mal preparados, a essas denúncias cujas datas não batem e a toda essa pintura primitiva, mas também porca, de cenários que abusam da inteligência do leitor. Paciência tem limite. É preciso pôr um ponto-final nesse amadorismo canhestro. Aliás, por falar nisso, leiam o que diz a Veja de sua fonte: “O diálogo entre o senador e o ministro foi repassado à revista por um servidor da própria Abin sob a condição de manter o anonimato de sua identidade. O relato do araponga é estarrecedor.” Sem dúvida. Estarrecedor.
*Bajonas Teixeira de Brito Junior é doutor em Filosofia, autor do ensaio traduzido pelo filósofo francês Michael Soubbotnik Aspects historiques et logiques de la classification raciale au Brésil (Cf. na Internet) e do livro Lógica do disparate.
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