Não precisa se afobar: basta sentar e esperar o triunfo dos imbecis. Eles nunca falham. Nelson Rodrigues dizia que “os idiotas vão tomar conta do mundo; não pela capacidade, mas pela quantidade. Eles são muitos”.
“Idiota” é apenas um entre vários sinônimos de “imbecil”. Para não dizerem que isso é papo de esquerdista, lembro que Nelson era um moralista conservador de carteirinha. Não tinha nada de esquerdista. Agora me acompanhe.
>Advogado de assassino da juíza Patrícia Acioli é nomeado no Ministério da Saúde
A capacidade do atual governo de produzir imbecilidades é incomensurável. Está difícil dar destaque a apenas uma idiotice, porque nem bem aparece uma e logo chega outra pra lhe tomar o lugar. Mas, nos últimos dias, a quantidade e a, digamos, qualidade das idiotices fizeram transbordar os reservatórios.
Bolsonaro: o tiozão tosco
Bolsonaro lembra muito aqueles tiozões toscos – você deve ter um, todo mundo tem. Ou pelo menos conhece um deles. Eles se acham inteligentes e divertidos. Contam umas piadas burras e grosseiras, às vezes pornográficas, totalmente sem graça. E, no final, pra garantir pelo menos a audiência deles mesmos, relincham como asnos (dê uma paradinha, experimente imitar um asno e vai ver como estou certo). Eles se acham o máximo. Com a certeza do aplauso de outros imbecis, como aquela claque que todo dia vai babar ovo ali na entrada do Palácio da Alvorada, aí mesmo é que o asno, desculpe, aí mesmo é que o Bolsonaro se esbalda. A última, essa de que “os da direita tomam cloroquina e os da esquerda tomam tubaína” é a fina pérola da mais admirável idiotice. No dia seguinte, na manjada toada do morde-e-assopra, solidarizou-se com as famílias abatidas pela perda de entes queridos. Todo mundo sabe que só fez aquilo pra cumprir tabela. Não está compadecido é com coisa alguma. A narrativa que ele queria que ficasse – e acertou na mosca – não é a da solidariedade às famílias dos mortos, mas a cretinice da cloroquina versus tubaína, que a turma dele saiu relinchando por aí.
Um dia inteiro com Damares. Ninguém merece.
Quem também relinchou outro dia foi a incansável Damares. No dia em que o país batia o marco trágico dos mais de mil mortos diários, anunciou o quê? Um concurso infantil das máscaras mais “bonitas e criativas”! Nem se tocou pros mortos. Importante é divertir as crianças, não é mesmo? Pior é o prêmio: os vencedores ganharão um dia inteiro na companhia dela, Damares, e da Primeira-dama, Michele. Agora me diz aqui: isso é prêmio ou é castigo?
O carrossel das imbecilidades prossegue. No mesmo dia, véspera de levar entre sorrisos idiotas um solene pé-na-bunda, a namoradinha de Bolsonaro (sim, porque do Brasil ela deixou de ser faz tempo), anunciou que produzirá vídeos sobre as “realizações” de seus dois intermináveis meses de gestão. Agora escuta aqui: que realizações, cara-pálida? Pior foi o anúncio de que pretende também dar aulas de como dar entrevistas. Nisso, deve-se reconhecer que ela é competente. A entrevista em que se revelou saudosa da ditadura bateu recordes de audiência. Bela aula. Grande professora.
Na concorrência pelo título de Imbecil do Ano, o ministro da Educação (Educação? É isso mesmo, ele é ministro…da Educação?) anunciou uma enquete virtual pra saber a opinião dos estudantes sobre o adiamento do Enem. Agora, escuta aqui: o Senado suspendeu as provas justamente pela falta de acesso dos estudantes pobres… à internet! O cara quer mesmo saber a opinião dos estudantes em geral ou só dos que podiam acessar a internet? Porque os que podem é claro que votar contra o adiamento porque têm condições de fazer as provas. E os outros? Que outros?
Bolsonaro nunca foi motoboy de farmácia
Agora, escuta aqui de novo: pelo que se sabe, Bolsonaro nunca foi nem motoboy de farmácia. Então, que autoridade esse capitão tem pra recomendar – e até mandar – o Ministério da Saúde autorizar o uso da cloroquina? “Não vá o oleiro além do pote”, diz o ditado. Pois se não tem competência nem pra recomendar chá de alho com limão pra curar resfriado, e se orgulha de ter sido treinado pra matar, e não pra salvar vidas (entrevista à Gazeta do Povo, 2017), que diabo quer indicando remédio pra isso ou aquilo? E por que cargas d’água alguém deveria acreditar nele?
Escrevo na certeza de que, quando este artigo for publicado, já haverá imbecilidades fresquinhas por aí. Paciência. Os imbecis são rápidos. E são muitos.
Não há vacina para a imbecilidade
Por isso, como dizia o velho Nelson, eles vencerão. Aqui mesmo no Brasil temos a prova viva à nossa frente. Nós, os que vivemos os anos de chumbo da ditadura militar, achávamos que o país estava vacinado e os imbecis de 1964 não tinham chance de voltar a contaminar o país. Pois eles estão de volta, mandando jornalistas calarem a boca, defendendo a tortura, querendo fechar o Legislativo e o Judiciário. Há um golpe em marcha. O capitão acorda e sonha com isso. Não à toa vem semeando militares a torto e a direito em todos os setores do governo. O Ministério da Saúde, então, parece mais o Ministério da Defesa.
Os imbecis são incansáveis. Como são muitos e têm uma enorme capacidade de reprodução, nem precisa se afobar: eles sempre triunfarão.