Rubinho Nunes*
“É um orgulho, uma satisfação que eu tenho dizer para essa imprensa maravilhosa que eu não quero acabar com a Lava Jato, eu acabei com a Lava Jato, porque não tem mais corrupção no governo”, afirmou Jair Bolsonaro em 7 de outubro de 2020. O presidente não só enterrou a operação, como montou um paraíso da impunidade e da corrupção no país.
Nesta segunda-feira (14), o Brasil caiu para sexto lugar no Índice de Capacidade de Combate à Corrupção (CCC), produzido pelas entidades Americas Society/Council of the Americas, fórum que debate questões políticas, sociais e econômicas na América Latina. Ficamos atrás Uruguai, Chile, Costa Rica, Peru e Argentina — sim, ficamos atrás até mesmo dos nossos hermanos socialistas que nos chamaram de selvagens.
Esse resultado é mérito do presidente da República, que interferiu na Polícia Federal, extinguiu o Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras), nomeou o petista Augusto Aras para a procuradoria-geral da República — que mais tarde passou a ser conhecido pela alcunha de “engavetador-geral da República” —, fez acordo na advocacia-geral da União e indicou Kássio Nunes — que votou a favor da soltura de Lula da Silva — para o Supremo Tribunal Federal.
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Todo o esquema foi composto pelo governo para blindar o senador Flávio Bolsonaro e barrar um possível processo de impeachment do presidente. A estrutura criminosa ficou exposta no escândalo do “Tratolão”, compra explícita de apoio político por meio de emendas parlamentares obscuras.
Brasileiros que acreditaram nas bandeiras de combate à corrupção e anti privilégios pregada aos quatro cantos pelo então candidato Jair Bolsonaro se veem traídos, enganados mais uma vez pelo sistema. Ironicamente, o Brasil elegeu, para acabar com a estrutura sistemática de corrupção, justamente a própria face dessa estrutura.
O fim do combate à corrupção ficou escancarado não apenas aos olhos do cidadão brasileiro, mas perante toda a comunidade internacional: a OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), grupo ao qual o Brasil almeja adentrar há anos, adotou medidas inéditas frente ao retrocesso no combate à corrupção no país. Representantes do governo Jair Bolsonaro ficaram literalmente sem palavras frente aos questionamentos realizados pela OCDE.
O diretor de análise política para o Brasil, Thomaz Favaro, avalia que “a capacidade de aplicação das leis anticorrupção no Brasil teve um declínio, assim como a autonomia das principais agências, como a Polícia Federal e a PGR. As grandes investigações deixaram de existir, e o fim da Lava Jato, em fevereiro, é o grande símbolo disso”.
O futuro do combate à corrupção no Brasil é ainda mais sombrio: na Câmara dos Deputados, tramita um Projeto de Lei que inutiliza a principal lei anticorrupção do país, que trata de atos que atentem contra os princípios da administração pública.
Relatado pelo deputado petista Carlos Zarattini, o texto pretende “suavizar” penas de violações sem dano ao patrimônio público. A famosa “carteirada” — já característica do brasileiro —, nepotismo e tantas outras infrações que, em tese, não danificam o patrimônio público, não serão mais abrangidas pela lei que, inclusive, foi responsável pelo impeachment do ex-presidente Fernando Collor.
Além disso, a própria imprensa será fortemente afetada por essa “atualização”, já que negligenciar pedidos baseados na Lei de Acesso à Informação não será mais punido como improbidade. Não fosse suficiente o retrocesso no combate à corrupção, a liberdade de imprensa também se vê ameaçada. De acordo como o ranking anual do “Repórteres sem Fronteiras”, o Brasil está no vermelho, ou seja, um ambiente de alto risco para jornalistas.
Para fechar com chave de ouro, o projeto impõe um prazo de seis meses para o Ministério Público concluir investigações, independente das circunstâncias e dificuldades dos casos. A limitação à liberdade de imprensa também é uma forma clara de garantir a impunidade no país.
Fica evidente que todas as vezes em que os apoiadores do governo disseram “deixa o homem trabalhar”, era no sentido de trabalhar em prol da corrupção e da impunidade. Bolsonaro criou um parque de diversões para sua família e seus aliados do centrão.
*Rubinho Nunes é vereador em São Paulo (sem partido), advogado e coordenador nacional do MBL (Movimento Brasil Livre).
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