Quando ouvirmos protestos do chamado mercado, especialmente em relação à PEC da Transição, devemos nos ater que, na prática, essa facção de mercado que se assanha seletivamente, equivale ao 1% mais rico do país; àquela turma que, quando somamos sua renda e patrimônio, chegamos à 50% da renda e do patrimônio da nação; àquela turma que ganha dinheiro com dinheiro, com a super exploração do trabalho de milhares de brasileiros e com a especulação financeira nas bolsas, onde são gerados movimentos de sobe e desce diários, que criam a falsa impressão de medir a tendência da economia a longo prazo, quando na verdade são diários, pontuais e usados muitas vezes para tentar influenciar as políticas de governo, de acordo com seus interesses.
Esse 1% se traduz nos bilionários, que possuem forte poder de influência na política nacional e conseguem gritar e tocar o terror através de setores da imprensa e contam ainda com o suporte de grupos financeiros internacionais que não possuem compromisso nenhum com o Brasil. Na maioria, investem no capital financeiro, que não tem pátria e voa em fração de segundos de um lugar para outro onde encontre chance de lucro mais rápido, fácil e irresponsável. Dinheiro não gera riqueza; o que gera riqueza sustentável e perene em uma nação é o trabalho, e não a especulação.
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São os investimentos no capital produtivo os verdadeiros geradores de riqueza, emprego e renda de um modo mais seguro nos países. E, possivelmente, não é essa a facção do mercado que está esperneando, pois entendem a necessidade de que o dinheiro circule ao invés de ficar acumulado nas mãos de poucos.
Portanto, esses protestos não dizem respeito às empresas de modo geral, muito menos às médias e pequenas, que são o coração da nossa economia e respondem por 76% dos empregos do Brasil, nem aos pequenos investidores, que muitas vezes enfrentam enormes dificuldades de se fazerem ouvidos e atendidos em suas necessidades.
Não sei se por ganância e visão de curto prazo ou por ignorância, mas é inacreditável, que essa fação de bilionários, que se intitula como defensora do mercado em geral, grite em favor de um teto de gastos, sem se preocupar minimamente com um piso contra a fome. O combate à fome, à desigualdade e o enfrentamento aos problemas sociais, para além de uma questão de dignidade humana, é relevante também do ponto de vista econômico. Quando o Estado oferece condições mínimas de sobrevivência com dignidade aos mais vulneráveis, esses cidadãos, ao longo do tempo, são incorporados ao mercado de trabalho, fazendo a economia girar. Incorporar o pobre no orçamento, não é demagogia; significa projetar um crescimento econômico maior, que beneficiará diretamente as pequenas e médias empresas.
Mas, ao que se percebe, além de insensível para com a pobreza estrutural do país, essa facção do mercado é também contraditória. Por quê? Basta observar o esperneio seletivo desse 1%: Jair Bolsonaro e Paulo Guedes arrombaram o teto de gastos em mais de R$ 795 bilhões e não se tem notícias de nenhum abalo sísmico na bolsa. Executou-se um orçamento secreto bilionário, sem fiscalização no emprego do dinheiro público e nocivo às políticas públicas, mas isso não estremeceu essa facção. Já contabilizamos mais de um mês após as eleições, e o fato do Brasil estar sem presidente, não gera especulação na bolsa. Jair Bolsonaro sumiu do cargo depois da derrota, deixou o país à deriva, às portas de uma onda de crescimento de casos de covid-19, mas, o dólar não subiu, nem a bolsa caiu por causa disso, nem por causa da péssima condução no combate à pandemia.
PublicidadePorém, quando o presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, tenta autorização do Congresso para estourar o teto em torno de R$ 198 bilhões de Reais, valor quatro vezes menor do que o praticado pelo ainda presidente, para matar a fome de quem está na fila do osso e morando nas ruas, a bolsa cai, o dólar sobe e está feito o terrorismo travestido de equilíbrio fiscal.
Interessante é que grande parte do valor solicitado pelo presidente eleito se destinará aos interesses da maioria da população, que já afetada por graves mazelas sociais, corre o risco de sofrer a interrupção das políticas públicas mais urgentes. Isso porque, ao apagar das luzes, o governo Bolsonaro tenta fechar o caixa bloqueando verbas e deixando diversas áreas completamente sem orçamento exequível para 2023: farmácia popular, bolsa família, carros-pipa, fila no INSS com mais de 5 milhões de pessoas mendigando seus direitos, além dos sucessivos cortes nas universidades públicas, que são fundamentais para o desenvolvimento da pesquisa, ciência e tecnologia, essenciais ao desenvolvimento socioeconômico de qualquer país.
Mesmo com toda a pressão seletiva e indevida dessa facção, um fato importante não pode ser perdido de vista: quem venceu as eleições presidenciais em 2022 foram, principalmente, a democracia e o combate a fome! Por isso, não se pode fechar os olhos para a realidade e para o que a democracia apontou nas urnas. Ao mesmo tempo em que os preços dos alimentos estão disparando, grande parte dos mais pobres estão se endividando para comprar comida e pagar contas básicas e há outra parte que não tem nem mesmo essa capacidade de endividamento.
Essa facção do mercado não aceita que perdeu as eleições, esbraveja por meio de setores da imprensa, se esconde em suas mansões, escritórios e resort luxuosos, na copa do Catar, e se aproveita de alienados que tomam sol, chuva e rezam por golpe militar na porta dos quartéis. Por um lado, parece compor uma aliança golpista com bolsonaristas criminosos, apoiando bloqueios nas estradas, em ataques à democracia e a estabilidade do país. Por outro lado, se abala com bloqueios do MST, MTST e demais movimentos sociais que reivindicam terras, moradia digna, ou lutam por melhorias na saúde e educação.
Por fim, fica óbvio que a questão essencial não é furar ou não furar o teto. Mas para onde vai o dinheiro, quando se fura o teto. É isso que clareia os sinais dados por essa facção do mercado e desmascara os seus assanhamentos seletivos, e os seus interesses em ganhar mais dinheiro com os juros abusivos que remuneram a dívida pública e com especulação na bolsa. Tudo isso, passando por setores da mídia, que deseja sobreviver e por parte do Congresso, que cria dificuldades para se beneficiar com facilidades.
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