Resolvi retornar à realidade brasileira através de um tema que há muito me incomoda: a Lei das Estatais. Aprovamos a Lei 13.303, em junho de 2016. A autoria foi do querido Senador Tasso Jereissati (PSDB-CE). Houve divergências entre a Câmara e o Senado. Era deputado federal e divergi abertamente do espírito presente em um ponto da Lei. Não das suas preocupações gerais com a boa governança.
Estávamos no governo Michel Temer. O país havia enfrentado duas grandes crises morais, onde empresas estatais foram envolvidas em graves denúncias de corrupção. A ideia era blindar essas organizações. A Lei procura corretamente traçar diretrizes com vistas a assegurar o melhor resultado possível e a prevalência do interesse público.
A polêmica ressurgiu com a nomeação pelo presidente Lula do dirigente petista Aloizio Mercadante para a presidência do BNDES e do senador Jean Paul Prates para a presidência da Petrobras. O artigo 17 da Lei das Estatais, na alínea II de seu parágrafo 2º, vedava a nomeação de diretores e conselheiros que nos últimos 36 meses tivessem participado da direção de partidos ou trabalhado em campanhas eleitorais.
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A atividade política, na minha visão, é a mais nobre de todas, a única que pode produzir os grandes avanços necessários. Deve ser enaltecida, estimulada, difundida. E não ser tratada como algo abjeto, contaminado, podre, imoral. Sempre fui um defensor da excelência e da ética na administração pública. Ora, todos os diretores da Petrobras envolvidos na Lava Jato eram de carreira.
Em 2016, levei um nome qualificado como sugestão ao presidente Michel Temer para a Diretoria de Política Urbana e Administração Pública do BNDES. O indicado, pasmem, tinha mestrado em política urbana numa universidade inglesa e outro mestrado, na FGV-RJ, em administração pública. Tinha sido prefeito de uma grande cidade, secretário municipal e estadual. Uma semana depois, recebo telefonema de um ministro palaciano dizendo que apreciavam muito o nome, mas que a Lei das Estatais proibia a nomeação por ele ser membro do Diretório Nacional de um partido político. Meus Deus! Era a política criminalizando a política. Não há democracia sem partidos. No entanto, qual era a sinalização? “Olhem, não levem os partidos e os políticos muito a sério. Essa coisa é meio suja. Precisamos de pessoas “limpinhas”, não contaminadas, isentas, olímpica e tecnicamente independentes”.
Quem disse que grandes empresários e excelentes gestores públicos como o saudoso José Alencar ou Walfrido dos Mares Guia não poderiam presidir o Banco do Brasil , por terem mandato, militância ou participação em campanha? Quem disse que o próprio Tasso Jereissati, excepcional governador do Ceará e empresário de sucesso, não poderia presidir a Petrobras? Qual foi o “gênio da raça” que concebeu que um dos maiores economistas do país, José Serra, prefeito da maior cidade e governador do maior estado brasileiro, ministro, deputado e senador, não poderia presidir o BNDES, por estar “contaminado” pela política? Ninguém pode negar que Mercadante e Jean Paul Prates têm história nos setores da economia e do petróleo.
Diante do tsunami da Lava Jato, o Congresso produziu um desastrado gesto contra sua própria natureza política. O assunto merece e deve ser discutido com mais qualidade e longe de preconceitos rasos.
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