Humberto Ribeiro *
Um projeto de lei maduro, desejado pela sociedade e urgente para o Brasil, o PL 2630/20 tem o objetivo de criar a Lei de Liberdade, Responsabilidade e Transparência da Internet. Desde 2020, o projeto passa por discussões no Congresso Nacional e na sociedade: foi aprovado no Senado, rendeu dezenas de audiências públicas, e foi aprovado por grupo de trabalho na Câmara dos Deputados.
Os eventos recentes demonstram cabalmente a urgência da votação do projeto: os ataques ao processo eleitoral de 2022, a invasão dos três poderes da República em 8 de janeiro, a pandemia de covid-19, além dos ataques a escolas e creches e o crescimento de grupos neonazistas nas redes sociais são indícios da necessária regulação. Diante da gravidade da irresponsabilidade das big techs com as externalidades negativas de suas atividades no Brasil, no dia 25 de abril de 2023 a Câmara dos Deputados aprovou em Brasília o pedido de urgência da tramitação do projeto.
As big techs, porém, têm reagido de maneira antiética, desinformando a sociedade sobre o projeto de lei, ameaçando e constrangendo parlamentares, atacando a independência do Congresso Nacional e o processo legislativo. Essa situação é mais um indício de que a regulação das big techs é urgente e que deve ser realizada para a própria preservação da integridade do Poder Legislativo.
Mas a sociedade sabe o que quer: pesquisa do Instituto Atlas, mostra que, na sociedade, há uma posição antagônica à das big techs: 78% dos entrevistados são favoráveis à regulação e 94% enxergam o ambiente das redes sociais inseguro para as crianças e adolescentes.
Além disso, mais de 100 entidades da sociedade, da academia e do jornalismo reunidas na Sala de Articulação contra a Desinformação (SAD), emitiram um documento ressoando um posicionamento uníssono: a defesa do PL2630/20 “para construir um ambiente digital democrático, seguro e saudável, (…) aumentar as exigências de transparência e responsabilizar as plataformas por conteúdo impulsionado”. Assinaram o documento instituições como o Sleeping Giants, o Instituto Vladimir Herzog, a SBPC, a Fenaj e a Coalizão Direitos na Rede.
Regular apenas as gigantes; proteger a sociedade e os pequenos…
A quem se aplica? As regras, responsabilidades, punições e sanções previstas no PL 2630 aplicam-se às big techs, as grandes empresas que administram as redes sociais, as ferramentas de buscas e serviços de mensagens com mais de 10 milhões de usuários. As empresas nacionais de tecnologia, assim, ganham fôlego para crescer em um mercado dominado por monopólios estrangeiros.
O PL da Liberdade de Expressão! Querem te enganar ao associar o projeto à censura. O PL 2630/20 não estabelece a censura, mas, pelo contrário, estabelece a Liberdade de Expressão como um princípio, além de mecanismos objetivos para a proteção da sociedade e dos parlamentares contra a censura privada e o abuso de poder das big techs. As big techs passarão a ter a obrigação de informar aos usuários sobre a moderação, oferecer a possibilidade de recurso e responder aos pedidos de revisão. Também terão de elaborar relatórios semestrais informando como exerceram a moderação no país, qual o tamanho e perfil de suas equipes e, também, relatórios anuais informando os riscos que oferecem à Liberdade de Expressão e as medidas que estão adotando para mitigá-los.
A liberdade religiosa, por exemplo, é parte fundamental da livre expressão, assim, tudo que exposto acima aplica-se, também, à Liberdade Religiosa. Mas o PL 2630 tratou de deixar explícito em seu art. 3º, IV, que a proteção dos cultos, dogmas e livros sagrados é um princípio que deve orientar a interpretação de todo o texto.
O PL da Proteção das Crianças! Precisamos combater crimes de abuso, estupro, violência, incitação ao suicídio, massacres, automutilação, pornografia infantil e toda sorte de outros crimes contra as crianças e os adolescentes cometidos em ambiente virtual. O PL possui um capítulo específico sobre a proteção dos menores, além de criar o dever de cuidado das plataformas para o combate a esses crimes. Controle parental e verificação de faixa etária; adequação dos serviços às necessidades desse público; responsabilização por imagens de abuso e exploração sexual infantil; nível elevado de privacidade, proteção de dados e segurança dos menores; proibição da publicidade e segmentação direcionada a esse público. Todas essas medidas, além de outras, estão previstas no PL 2630/20. Por isso, quem defende as crianças, defende o PL 2630 SIM. (arts. 7º, 11, inciso IV, 39 e 40).
O PL do Combate aos Crimes Digitais. As plataformas terão o DEVER de criar mecanismos de denúncia e demonstrarem que estão adotando medidas para o combate aos crimes contra o Estado de Direito e os Poderes, além de terrorismo, racismo, violência contra a mulher, induzimento ao suicídio e automutilação, contra as crianças e a saúde pública. Contra o crime, PL 2630, SIM (art. 11, 18 e 50).
Além disso, precisamos de transparência e de igualdade. Qual o número de usuários? Qual a equipe envolvida na moderação? Quantas contas e conteúdos as big techs removeram? Por qual motivo? Como funciona a recomendação de conteúdos? Você, brasileiro, não tem essas informações em seu país, mas as big techs disponibilizam para outros países, como todos os europeus. Por acaso temos menos direitos que os europeus? O PL 2630 nos garante a igualdade na transparência e no acesso a essas informações. Por isso, quem é patriota defende o PL 2630, SIM.
O PL da Soberania Brasileira! As big techs estão mentindo, não existirá Ministério da Verdade, nem o poder do Executivo para a censura. O órgão regulador (ou entidade autônoma de supervisão) não terá a competência de determinar a remoção de conteúdos, mas tão somente de garantir a observância da lei, dos deveres de cuidado e de transparência, além de aplicar sanções para empresas que descumprem as disposições legais emanadas pelo Poder Legislativo brasileiro, a representação máxima da vontade soberana do Povo. Assim funciona em qualquer setor submetido às agências reguladoras, tanto no Brasil quanto no exterior. Elas querem desrespeitar as decisões do Poder Legislativo, por isso quem defende a soberania, defende PL 2630 SIM!
O PL da Responsabilidade e Transparência da Publicidade! Sem regulação, as big techs irão destruir a imprensa, a publicidade nacional e as empresas Brasileiras. Monopólios que remetem bilhões de dólares em lucros para o exterior, as big techs gozam de assimetria regulatória que dá a essas empresas vantagens competitivas em relação à imprensa e ao setor publicitário.
Em primeiro lugar, as big techs cumprem padrões de transparência da publicidade tanto nos Estados Unidos, como na Europa, Coreia do Sul e em outros territórios, mas estão negando essa transparência ao Brasil. Os repositórios de anúncios são ferramentas essenciais para que a sociedade consiga fiscalizar as práticas antiéticas dessas empresas. Quem não se lembra do Google, da Meta e do Telegram gastando milhões de dólares nas últimas semanas para atacar o Poder Legislativo? Com os repositórios de anúncios, essas práticas antiéticas das big techs estarão desmascaradas e nós, brasileiros, saberemos exatamente o que elas estão fazendo para interferir em nossa soberania e como estão sendo remuneradas por criminosos para amplificar conteúdos ilícitos. (art. 26, §4º)
Por fim, como todas as empresas que atuam em território brasileiro, as big techs serão responsáveis pelos conteúdos que otimizarem/impulsionarem, através do recebimento de contraprestação financeira. Ou seja, a partir do momento em que as big techs são pagas com a finalidade de ampliar a exibição e o alcance de conteúdos que sejam ilícitos conforme determinação da lei, então serão responsabilizadas solidariamente com o anunciante. Assim, nesse, e apenas nesse caso, as big techs não devem gozar da imunidade estabelecida pelo Marco Civil da Internet, pois não agem como meras intermediárias, mas possuem uma posição ativa na apresentação ampliada de conteúdos ilícitos, como terrorismo, crimes contra crianças e adolescentes, ataques à independência do Poder Legislativo e violência contra a mulher. Você acha justo o lucro bilionário dessas empresas com a prática de crimes? (art. 6º, II)
* Humberto Ribeiro é advogado e diretor jurídico e de pesquisas do Sleeping Giants Brasil.
O texto acima expressa a visão de quem o assina, não necessariamente do Congresso em Foco. Se você quer publicar algo sobre o mesmo tema, mas com um diferente ponto de vista, envie sua sugestão de texto para redacao@congressoemfoco.com.br.
Deixe um comentário