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Aprovado com considerável maioria na CCJ, com 37 votos a favor e 14 contra, o substitutivo ao Projeto de Lei 5069/2013 estabelece penas para quem prestar informações sobre a prática do aborto, e dá a liberdade para que profissionais da saúde se recusem a realizar o procedimento caso ele vá de encontro às suas convicções, ainda que esteja dentro dos casos previstos em lei. De autoria do então líder do PMDB na Câmara, Eduardo Cunha (RJ), o texto é criticado por representantes de movimentos feministas por dificultar o atendimento às mulheres vítimas de violência sexual.
O deputado rebate as críticas. “Na maior parte da construção desses argumentos está um desejo – que o projeto contraria – de ver o aborto legalizado no Brasil”, diz Evandro Gussi, assumidamente contrário à legalização da prática. Veja os principais trechos da entrevista concedida por Evandro Gussi ao Congresso em Foco:
Exame de corpo de delito e registro de ocorrência
Um dos itens polêmicos do texto aprovado é o que trata da realização de exame de corpo de delito para comprovar prática do estupro. Segundo o deputado, esse trecho do PL busca facilitar a realização do procedimento de aborto. “Hoje a mulher precisa provar no processo penal que ela foi estuprada para que não seja punida do crime de aborto. O que nós estamos fazendo é facilitando, simplificando para que o exame de corpo de delito já seja uma prova suficiente do estupro”, argumenta.
Após o atendimento médico, o projeto determina que a mulher seja encaminhada para registrar a ocorrência em delegacia. Segundo o relator do projeto, o boletim de ocorrência de estupro seria um estímulo à punição dos agressores. Estudo publicado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) em 2014 indica que, no geral, 70% dos estupros são cometidos por parentes, namorados, amigos ou conhecidos da vítima, “o que indica que o principal inimigo está dentro de casa e que a violência nasce dentro dos lares”, diz a nota técnica do instituto.
Questionado sobre esses casos em que a violência ocorre em âmbito familiar, o que causaria constrangimentos à vítima no registro da ocorrência, o deputado sugeriu que os índices que quantificam os casos de abuso sexual em ambientes familiares não são confiáveis. “Essa fantasia que foi criada de que a casa é o lugar mais perigoso, de que a maioria das coisas acontece lá dentro… Primeiro, isso não é verdadeiro. Em segundo lugar, onde isso eventualmente aconteça, precisa ser necessariamente punido. Ou seja, nós temos que criar o maior número de instrumentos possíveis para que esse sujeito seja punido”, conclui.
Assista a debate sobre o projeto entre Gussi e a deputada Cristiane Brasil (PTB-RJ):
Liberdade de consciência
O texto apresentado por Evandro Gussi estabelece que “nenhum profissional de saúde ou instituição, em nenhum caso, poderá ser obrigado a aconselhar, receitar ou administrar procedimento ou medicamento que considere abortivo”. O deputado argumenta que o parágrafo não fere a laicidade do Estado, pois não diz respeito a questões religiosas, mas às convicções de cada indivíduo. “A liberdade de consciência é inviolável, o que nós estamos fazendo no texto é apenas especificar para o caso o que o texto constitucional já diz de maneira genérica”, avalia o deputado, citando o inciso VI do artigo 5º da Constituição Federal. “O regime democrático mostra que existe um limite. Naquilo que diz respeito à sua consciência, aos seus valores filosóficos, religiosos ou morais, eu não posso entrar”, completa.
No Brasil o aborto é ilegal, e não é punido apenas nos casos em que há risco de morte da gestante ou quando a gravidez é resultante de estupro. Porém, de acordo com o novo texto, ainda que o profissional de saúde não venha a ser punido, ou seja, ainda que o procedimento se enquadre nas duas exceções previstas pelo Código Penal, ele poderá se recusar a fazê-lo.
“Se ele [o profissional] tiver uma objeção de consciência, ainda que ela [a gestante] não seja punida por estar fazendo aquele aborto, e que ele não seja punido por fazer aquele aborto, eu não posso obrigá-lo a fazer. Ele pode chamar outro médico. Eu não posso obrigar uma pessoa a ir contra a consciência. Foram assim que agiram os regimes totalitários. O primeiro passo de todos os regimes totalitários, nazismo, fascismo, comunismo – tanto na União Soviética quanto no Camboja, no Vietnã e assim por diante –, esses regimes se caracterizaram entre outras coisas por violentar a consciência das pessoas”, defende.
Pílula do dia seguinte
O deputado esclarece que o projeto não proíbe o acesso ao coquetel anti-HIV e à pílula do dia seguinte. “A pílula do dia seguinte até hoje é um consenso de que ela não é abortiva. Tem muita gente que acha que é abortiva – gente que inclusive é contrária ao projeto –, pelo que eu percebi. Ficaram tão preocupados com a pílula do dia seguinte, sendo que eu estava dizendo que ela não é abortiva… E se é não abortiva não tem problema algum”, explica.
O problema surge quando não há consenso em relação às substâncias abortivas, uma vez que o texto deixa essa avaliação a critério do profissional de saúde ao dizer que ele “não poderá ser obrigado a receitar ou administrar procedimento ou medicamento que considere abortivo”. Evandro Gussi defende que essa é uma questão de garantia da liberdade de consciência. “Digamos que surja um remédio amanhã, cujos efeitos dividam a ciência: uma parte dos cientistas diz que ele é abortivo, outra parte diz que ele não é abortivo. Eu não posso obrigar, de fato, um farmacêutico, por exemplo, a vender no estabelecimento dele um remédio que ele julgue ser abortivo”, argumentou, acrescentando. “Na verdade eu estou preservando a consciência daquele que acredita naquilo.”
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