Em negociação no Congresso há semanas, o projeto de lei 3729/04, que cria a Lei Geral de Licenciamento Ambiental, foi atualizado em um texto substitutivo que prevê isentar da necessidade de licenciamento obras de melhoria, modernização e ampliação em instalações pré-existentes. O texto ao qual o Congresso em Foco teve acesso, que é uma proposta-base ainda sujeita a mudanças, preocupa os ambientalistas. Pela redação atual, a percepção é de que essa isenção possa representar um ‘cheque em branco’ para o setor de infraestrutura.
“Isso pode significar desde um simples tapa buraco em uma rodovia, que obviamente não precisa de licenciamento, mas pode significar o asfaltamento de uma rodovia de mais de mil quilômetros que hoje é de terra, e isso muda completamente toda a dinâmica de ocupação da terra no entorno. Embora possa ser classificada como melhoria ou modernização, uma obra como essa pode ter efeitos ambientais muito graves, como induzir ocupação irregular de terras públicas, mais desmatamento, muito mais caminhões passando e mais derramamento de cargas perigosas, por exemplo”, destaca Raul do Valle, coordenador de Justiça Socioambiental da organização não governamental WWF.
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A solução apontada por alguns especialistas é que a licença já seja concedida considerando o tipo de melhoria que o empreendedor queira fazer no futuro. O texto atual, provisório, será debatido em audiências públicas comandadas pelo grupo de trabalho formado pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), para construir uma proposta de consenso entre os setores produtivo e ambientalista.
O coordenador do grupo é o deputado Kim Kataguiri (DEM-SP), que desde abril vem recebendo contribuições de diferentes setores para embasar o relatório preliminar. Dos outros dez membros nomeados, apenas dois são historicamente ligados à pauta ambiental. A primeira reunião do GT ocorreu nesta terça-feira (11).
O texto também prevê que a emissão da licença prévia para as obras deve ocorrer no máximo oito meses após a entrega do estudo de impacto ambiental. Este é o maior período de análise dentre as opções previstas no texto. Quando o pedido de licenciamento demandar outros tipos de estudos menos abrangentes, o prazo máximo para a emissão será de quatro meses. Atualmente, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) já trabalha com prazos, regulados por normas internas da autarquia, porém maiores. Os mais afetados neste caso devem ser os órgãos estaduais, responsáveis por cerca de 90% das licenças emitidas no país.
“Acho que deveria ter a possibilidade de os órgãos ambientais, a cada caso, ajustarem os prazos, à luz do tipo de empreendimento e quantidade de informação que aquele órgão já tem. No caso de uma estrada que será aberta perto de outra estrada, ou seja, que já se estudou essa região e já se sabe o que tem lá, o órgão pode falar que neste caso está bom o prazo em oito meses”, comenta Raul do Valle.
Saneamento básico
A proposta atende ao setor de saneamento básico, já que obras de instalação de serviços de água e esgoto não estarão sujeitas a licenciamento ambiental. O texto isenta do procedimento as “instalações necessárias ao abastecimento público de água potável, desde a captação até as ligações prediais e respectivos instrumentos de medição e das instalações operacionais de coleta, transporte e tratamento dos esgotos sanitários, sem prejuízo do licenciamento da destinação final dos resíduos oriundos dos processos de tratamento de água e de esgoto”. Neste caso, a preocupação dos ambientalistas é que a captação de água na maioria das vezes ocorre dentro de áreas de preservação, onde estão os rios.
Em conversas anteriores, durante a elaboração da proposta preliminar, o presidente da Comissão de Meio Ambiente da Câmara, deputado Rodrigo Agostinho (PSB-SP) avaliou que os trechos sobre infraestrutura e agronegócio devem ser os principais pontos de disputa do texto.
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Agronegócio
O relatório preliminar também isenta atividades rurais de licenciamento ambiental, como pede o agronegócio, mas há outro mecanismo de controle previsto para a atividade agrícola. O relatório preliminar, portanto, caminha para uma solução intermediária entre os interesses envolvidos. O documento prevê que os produtores terão de assinar uma declaração de conformidade, aceitando atuar dentro de certos padrões de controle ambiental para o uso de agrotóxicos, por exemplo, entre outros requisitos estabelecidos pelo Ministério da Agricultura.
O texto estabelece alguns princípios norteadores para o licenciamento, como prezar pela participação pública e pela preponderância do interesse público, assim como pela celeridade e economia processual. Sobre participação pública, o texto substitutivo menciona que durante o estudo de impacto ambiental deve ser realizada ao menos uma audiência pública presencial com a população da área diretamente afetada pelo empreendimento, mas estabelece critérios para que mais de uma audiência seja feita. A consulta pública virtual também está prevista, com prazo de duração entre 15 e 30 dias. O mecanismo é próximo das práticas atuais, mas existem formas de consulta pública mais avançadas em outras legislações brasileiras.
O licenciamento ambiental é o processo em que o Estado, seja por meio de órgãos federais, estaduais ou municipais, estabelece as regras para que atividades e empreendimentos que possam causar danos ao meio ambiente ou usem recursos ambientais se instalem e possam funcionar. O tema é um debate antigo e difícil que o Poder Legislativo enfrenta.
O projeto 3729/04 já passou por três comissões especiais desde que começou a tramitar em 2004, teve dois relatórios aprovados, na Comissão de Agricultura da Câmara, em 2014, e o segundo pela Comissão do Meio Ambiente, em 2017. No final de 2017, depois de doze versões, o relatório que foi preparado pela Comissão de Finanças e Tributação foi arquivado sem votação e o projeto acabou enviado para o plenário da Câmara, onde desde então aguarda consenso para ser analisado.
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