Rodolfo Torres
O presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), chega neste domingo (2) ao final do sexto mês no terceiro mandato no comando do Legislativo brasileiro. O mais experiente parlamentar brasileiro nada tem para comemorar. O peemedebista está acuado por denúncias diárias de irregularidades e já responde a 11 pedidos de investigação no Conselho de Ética da Casa. (leia mais)
Entre as denúncias, estão: venda de terra sem pagamento de imposto; omissão de imóvel à Justiça Eleitoral; participação na edição de atos secretos para, inclusive, nomear o namorado de uma neta.
O presidente do Senado também é questionado sobre a atuação do neto José Adriano Cordeiro Sarney, dono de uma empresa que atuava na concessão de crédito consignado a funcionários do Senado. Em outro ponto, o peemedebista é acusado de ter mentido em plenário sobre sua relação com a Fundação José Sarney, que teria desviado recursos da Petrobras.
“É o período mais turbulento da história do Senado. O pior semestre, por conta de uma oligarquia abrangente”, analisa o professor da Universidade de Brasília (UnB) David Fleischer.
O cientista político nascido nos Estados Unidos, naturalizado brasileiro, também estranha o fato de um ex-presidente assumir o controle do Congresso. “Em todos os sistemas presidencialistas que conheço, não vi nenhum no qual o presidente da República assuma o Legislativo. Isso é uma concentração de poder muito nociva.”
Para Fleischer, o terceiro mandato de Sarney foi ainda pior do que as administrações turbulentas de dois correligionários do senador pelo Amapá – Jader Barbalho (PA) e Renan Calheiros (AL) – pela descoberta dos atos secretos, praticados há 14 anos, e envolvendo todo o Senado.
Jader renunciou à presidência da Casa e ao mandato de senador em outubro de 2001 após uma intensa disputa contra o já falecido senador Antonio Carlos Magalhães (DEM-BA), que também renunciou ao mandato de senador naquele ano. Ambos trocaram pesadas acusações de corrupção. Sobre Jader, pesavam denúncias de desvio de recursos do Banco do Estado do Pará (Banpará) e de irregularidades na Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (Sudam). Atualmente, Jader é deputado federal.
Mais recentemente, em dezembro de 2007, Renan renunciou à presidência do Senado após uma série de denúncias de irregularidades. Entre elas, o uso de “laranjas” para a compra de empresas de comunicação, a tentativa de espionagem de senadores, e o intermédio de um lobista no pagamento de despesas particulares do senador alagoano.
Outro especialista consultado pelo Congresso em Foco, o filósofo Roberto Romano, professor de ética e filosofia política da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), considera a complexa estrutura interna do maior partido político brasileiro como um dos fatores principais para as recorrentes crises no Senado.
“Sempre que um presidente do PMDB sentar na cadeira azul, vai haver problema. O problema do Senado é o PMDB”, afirma, complementando que a Casa tem sido uma espécie de “campo minado” para o governo. “Há um desequilíbrio entre a base de apoio do governo na Câmara e no Senado.”
Nesse caldeirão político, Roberto Romano também ressalta a forma hegemônica com que Sarney assumiu a presidência do Senado em fevereiro deste ano. Para ele, a recondução do parlamentar ao controle da Casa desestabilizou as relações internas no plenário.
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Assim como Fleischer, Romano também tem a percepção de que a saída de Sarney do mais alto cargo do Congresso é apenas uma questão de tempo. Além dos acadêmicos, essa visão ganha mais força a cada dia depois de o presidente Lula afirmar que a crise do Senado não é um problema dele. (leia mais)
Contudo, Roberto Romano lembra que os aliados de Sarney podem usar os senadores suplentes, a quem classifica de “núcleo delirante”, como tropa de choque para intimidar os adversários. Entre os suplentes aliados a Sarney estão o presidente do Conselho de Ética, Paulo Duque (PMDB-RJ), e Wellington Salgado (PMDB-MG), que participou em 2007 da tropa de choque de Renan Calheiros. “Os senadores eleitos disputam voto e são mais racionais”, analisa Romano.
Em seu último pronunciamento antes do recesso parlamentar, José Sarney chegou a citar o filósofo romano Sêneca: “As grandes injustiças só podem ser combatidas com o silêncio, a paciência e o tempo”.
“Assumi a presidência do Senado Federal com o duplo desafio de renovar sua estrutura administrativa e restaurar sua atividade política. Infelizmente, avaliei mal. As circunstâncias tornaram a reforma administrativa numa pretensa crise de desmoralização do Senado e inviabilizaram a discussão dos grandes temas de nosso momento político”, afirmou o peemedebista, ressaltando algumas medidas que trouxeram uma economia de R$ 10 milhões à Casa (restrição da cota de passagens áreas dos senadores, redução da impressão de material gráfico e extinção de 11 secretarias).
Sarney ainda lembrou da anulação dos atos secretos e da criação do Portal da Transparência do Senado, que traz informações sobre contratos, verba indenizatória e despesas da Casa. “Não temos o que esconder, mas o que mostrar. Vamos reduzir não só as nossas despesas, mas os nossos efetivos”, disse Sarney naquela ocasião.
Balanço do semestre
O presidente do Senado volta esta semana ao trabalho com o único objetivo de sobreviver no cargo. No balanço do semestre passado, Sarney fez um grande exercício para enaltecer a produção dos senadores. “Foi um semestre de intenso trabalho legislativo, que conseguimos realizar apesar do instituto da medida provisória e da crise política que se personalizou em minha pessoa.”
O presidente destacou algumas matérias analisadas no período, como a criminalização da prática sexual com menores de 18 anos que se encontram em situação de prostituição, a regulamentação da atividade de motoboys, e a isenção de imposto de renda para aposentados e pensionistas com mais de 70 anos.
De acordo com a Secretaria Geral da Mesa, o Senado aprovou no primeiro semestre do ano 188 projetos de lei, 15 medidas provisórias, duas propostas de emenda à Constituição, 21 projetos de resolução, 37 projetos de decreto legislativo, entre outras matérias.
Dentre elas, também merecem destaque a PEC dos Precatórios (que cria um regime especial de pagamento de precatórios para os entes da administração pública) e a PEC dos Vereadores (que aumenta o número dos legisladores municipais no país). Essas matérias atualmente estão tramitando na Câmara.
Ainda sob a presidência de Sarney também foram analisadas medidas provisórias relevantes, como a que cria e a que aprova benefícios fiscais ao programa habitacional Minha Casa, Minha Vida.
O objetivo do programa é construir 1 milhão de casas para famílias com renda de até dez salários mínimos. O governo investirá R$ 34 bilhões no programa, que será conduzido em parceria com estados, municípios e a iniciativa privada.
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