Convocado pela CPI dos Bingos para confirmar as declarações dadas ao jornal O Globo, o ex-secretário do PT Silvio Pereira mais confundiu do que esclareceu os senadores que lotaram ontem o plenário da comissão para ouvi-lo. Num depoimento confuso, Silvinho poupou Lula de responsabilidade pelo esquema de arrecadação montado pelo empresário Marcos Valério de Souza. E reforçou as dúvidas sobre seu estado de saúde mental. Mesmo confirmando a veracidade da entrevista, com algumas ressalvas, o ex-petista disse que não sabia se o que havia dito era verdadeiro ou não.
Silvinho afirmou que a entrevista foi dada com base em coisas que outras pessoas disseram. Portanto, ele não saberia afirmar se "as informações da entrevista são verdadeiras". Silvinho também não disse quem são essas "pessoas". O ex-secretário acrescentou que a entrevista pode ter sido fruto de suas próprias idéias fantasiosas.
Veracidade em xeque
"Não sei mais onde está a verdade nessa entrevista, o que é verdadeiro, o que não é", afirmou. "Tem coisas que lembro. Outras que não. Não quero fazer confirmação leviana. Eu não estava no meu estado emocional normal", completou. O ex-dirigente admitiu que estava depondo sob a ação de medicamentos. Segundo atestado médico apresentado por seu advogado ao Supremo Tribunal Federal (STF), Silvinho sofre de estresse pós-traumático de distimia (um tipo de quadro depressivo).
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Por mais de uma vez, Silvio disse não ter lido a reportagem, mas caiu em contradição ao dizer, em determinado momento, que muito do que falou à repórter Soraya Aggege não foi publicado. As evasivas do ex-secretário irritaram o presidente da CPI, senador Efraim Moraes (PFL-PB). "Vossa senhoria me permita, está querendo fazer a gente de besta", repreendeu o senador, que mais tarde leu a reportagem durante a sessão.
Os líderes
Na entrevista, Silvio afirmara que o esquema de Marcos Valério pretendia arrecadar R$ 1 bilhão no governo petista e que quem mandava no PT era o presidente Lula, o ex-deputado José Dirceu, o ex-presidente do partido José Genoino e o senador Aloizio Mercadante. Aos senadores, o ex-secretário confirmou que eram eles os grandes líderes do PT. Silvinho não disse, no entanto, se eles comandariam o esquema de compra de votos de deputados da base aliada. "Eles eram a grande liderança dentro do PT. Eu não sentava nesta mesa", afirmou.
Sobre a informação de que "nunca foi ouvido pelo PT e que o partido não queria lhe ouvir", Silvinho explicou que ligou para o então secretário-geral do PT, Ricardo Berzoini, que assumira seu cargo, e se colocou à disposição do partido, logo depois que se licenciou. "Ele disse que eu precisava cuidar da minha vida, me reconstruir. Foi uma conversa por telefone e nunca mais voltei a falar com Berzoini."
"Não quero cuspir no prato em que comi"
O ex-secretário do PT disse que não pretendia prejudicar ninguém com a entrevista. "Não quero prejudicar nenhum inimigo, quanto mais meus amigos". Ele afirmou que, após 22 anos de militância partidária, quer distância da vida política. "Queria estar fora de qualquer coisa que cheirasse a política", afirmou. "Não quero cuspir no prato em que comi, mas queria estar com minha família, longe de tudo", completou.
Silvio também disse não lembrar que tenha dito que iriam matá-lo, após conceder a entrevista. "Eu não lembro de ter dito que vão me matar. Isso eu não conversei com as pessoas da política. Eu não lembro de ter dito esta palavra." Ao ser perguntado se teme pela sua vida, respondeu: "Eu tenho medo de mim mesmo".
Desculpas a Valério
Ao ser perguntado pelo senador Agripino Maia (PFL-RN) o que queria dizer ao declarar que "atrás do Marcos Valério deve haver cem Marcos Valérios", Silvinho defendeu o empresário: "A questão é uma injustiça da minha parte com ele. Marcos Valério está virando sinônimo de corrupção. Eu, pessoalmente, não tenho esta visão ruim do Marcos Valério. Ele não teve este papel de destaque, de alguém que queira se aproveitar, como estão dizendo".
Silvinho afirmou também que deve ter cometido erros e que pagará por eles caso sejam comprovados. Ele insistiu que não "tem discernimento" para confirmar ou negar acusações feitas por ele. "Hoje está tudo muito confuso. Evidente que erros eu devo ter cometido e outros devem ter cometido. Nós estamos sendo todos julgados, processados. Se errei, pagarei por isso. Se os outros erraram, devem também pagar por isso. Seja qual for o erro: pequeno, grande ou máximo", disse o ex-petista.
Ele admitiu que teve uma crise nervosa ao ser informado pela repórter de que suas declarações seriam publicadas na forma de entrevista. Abatido e com a mão esquerda enfaixada, Silvinho disse que a repórter o procurou, na última quarta-feira, sob o pretexto de produzir um perfil dele para o jornal. Ela teria voltado ao seu apartamento, em São Paulo, no dia seguinte, para checar as declarações.
"Não dei entrevista"
O ex-petista contou que, à medida que a repórter lia suas anotações, perdeu o controle e acabou se ferindo ao arremessar alguns objetos. "Eu disse: ‘Não quero que esse material seja publicado. Não dei entrevista’. A conversa foi tensa e durou uma hora. Eu tentava me controlar". Segundo o relato publicado pela própria repórter, o ex-dirigente – que pediu a desfiliação do PT após o escândalo do mensalão vir a público – saiu quebrando a casa, na sua presença.
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