O Ministério da Justiça autorizou, nesta quarta-feira (18), a criação do Grupo Técnico Especializado (GTE) para “fornecer subsídios em assuntos que envolvam demarcação de terra indígena”. A decisão, publicada no Diário Oficial da União e assinada pelo ministro Alexandre de Moraes, já recebeu críticas de especialistas e organizações ligadas aos direitos dos povos indígenas. Para eles, as alterações previstas pela pasta na demarcação das terras vão dificultar a conclusão dos mais de 280 processos que estão em andamento em todo o Brasil.
De acordo com a publicação do ministério, o grupo terá o poder de reavaliar esses processos já abertos e, além disso, fazer “diligências” e verificar o “cumprimento da jurisprudência” do Supremo Tribunal Federal (STF) em cada caso. Ainda de acordo com a portaria, o GTE será composto por representantes da Fundação Nacional do Índio (Funai), terá uma consultoria jurídica, uma secretaria especial de direitos humanos e outra de política de promoção da igualdade racial.
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O ministério também destaca que, a partir de agora, o grupo poderá solicitar a “reparação” aos indígenas em caso de “perda de área”, tema que alerta, principalmente, entidades do agronegócio. Apesar disso, a medida fragiliza a análise feita pela Funai nos processos de demarcação das terras. Isso porque, com o novo texto, toda a análise feita sobre os casos pela fundação terão que passar pelo crivo do GTE.
A legislação em vigor – estabelecida no decreto 1.775, de janeiro de 1996, foi assinado pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e pelo então ministro da Justiça, Nelson Jobim – prevê que a análise antropológica da terra caracterizada como indígena, como a apresentação de laudos e testemunhas, acontecem durante o trâmite do processo na Funai. Assim que encerrada a investigação feita pela fundação, o processo é encaminhado ao ministro da Justiça e, em seguida, para a Presidência da República.
“Surpresa e preocupação”
Questionado pela Folha, o secretário executivo do Conselho Indígena Missionário (Cimi), Cleber Buzatto, destacou que a decisão do Ministério da Justiça foi recebida com “surpresa e preocupação” e que “não houve qualquer tipo de discussão com o movimento indígena”. “Nesse sentido, entendemos que há uma ilegalidade na portaria”, destacou.
Já a advogada do Instituto Socioambiental (ISA), Juliana de Paula Batista, “a portaria cria um novo sistema de demarcação, usurpando a competência do presidente da República”. De acordo com ela, a medida estabelece ainda uma “reanálise do trabalho antropológico” não prevista na legislação em vigor.
Ao Estadão, Carlos Frederico Marés, jurista e ex-presidente da Funai (1999 e 2000), afirmou que a mudança prevê segurar as demarcações em andamento. “O que está se criando é um nível intermediário entre o nível técnico e político. Trata-se de criar uma comissão para agir politicamente e burocratizar a demarcação. É um passo a mais para travar o processo”, disse.
“São medidas para causar constrangimento nos funcionários que fazem os relatórios de demarcação. Se houvesse jurisprudência do STF para todos os casos, isso nem precisaria estar na portaria. Bastaria que se cumprisse a lei. A verdade é que há uma ofensiva sobre todos processos de demarcação. A ideia é aplacar a resistência indígena. Temos todos os sinais disso. Hoje a situação da Funai é mais precária de todos os tempos. É um órgão que não tem mais capacidade de intervenção ou diálogo com os índios”, acrescentou Carlos Marés.
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