O Instituto de Fiscalização e Controle (IFC) emitiu nesta semana uma nota para repudiar a reação da Câmara dos Deputados, cujo presidente, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), anunciou que vai protolocar no Conselho Nacional de Justiça (CNJ) uma representação contra o juiz Márlon Reis. O instituto é formado por profissionais que atuam na área de fiscalização e controle no poder público.
Henrique Alves e outros deputados criticaram Reis por conta do livro O nobre deputado, que embasou reportagem exibida pelo Fantástico, da TV Globo, no domingo passado (8). No livro, o magistrado usou um personagem fictício chamado Cândido Peçanha, um deputado corrupto e corruptor, para mostrar falhas do sistema eleitoral brasileiro.
Veja a íntegra da nota do IFC:
A reação do Presidente da Câmara dos Deputados, Henrique Eduardo Alves, à matéria veiculada no programa da TV Globo, Fantástico, no domingo dia 8 de junho necessita de ser avaliada a partir de dois aspectos, um positivo e outro negativo. A favor da Câmara, e de seu presidente, pode-se dizer que era absolutamente necessário que houvesse alguma resposta por parte do Parlamento Federal. Pesa contra a Câmara, e seu presidente, no entanto, o mérito da resposta, que segue na linha utilizada a exaustão no cenário político nacional, da defesa mediante a acusação.
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Na ausência de nota oficial da Câmara dos Deputados, e de seu presidente, comentamos a seguir trechos da matéria publicada no sítio da internet da Câmara dos Deputados, na página Câmara Notícias (http://www2.camara.leg.br/camaranoticias/noticias/POLITICA/470160-CAMARA-VAI-AO-CNJ-CONTRA-JUIZ-AUTOR-DE-LIVRO-SOBRE-DEPUTADO-CORRUPTO-FICTICIO.html)
Quanto à ideia de que a reportagem divulgada no Fantástico no domingo desestimula o exercício da cidadania e, ao contrário do objetivo veiculado, reforça a ideia de que a política de nada serve à população brasileira, há uma série de equívocos que comentamos a seguir. O que desestimula o exercício da cidadania não é a matéria de televisão ou o livro do Dr. Marlon Reis, e, sim, os abusos cometidos pelos agentes públicos e a desigualdade nas condições de eleição em função do sistema eleitoral vigente. Assim, a ideia de que a política de nada serve à população brasileira são decorrentes das práticas narradas no livro e não na divulgação televisiva dessas práticas. E mais, não se trata de uma ideia, mas de prática verificada e comprovada no dia a dia dos brasileiros.
É ainda mais absurda a crítica de que não a Câmara dos Deputados não teve direito de defesa, conforme a seguinte afirmação: as diversas alusões a um deputado fictício, associadas a repetidas imagens no Plenário da Câmara dos Deputados e do Palácio do Congresso traduzem exercício impróprio do direito de informar: sem possibilitar o direito de defesa, vilipendiam a imagem do Parlamento. Tal comentário confunde elementos distintos, criando uma tese estranha de que o livro do Dr. Marlon Reis estaria fazendo acusações: não está, o livro contém informações sobre fatos que são verificados no cotidiano da política eleitoral brasileira. O vilipêndio à Câmara dos Deputados tem sido cometido por seus próprios integrantes, em uma série de escândalos dos quais só se menciona aqui a manutenção do mandato de um parlamentar condenado pela Justiça e preso! A imagem do parlamento tem sido diariamente vilipendiada pelos acordos espúrios ali realizados, o distanciamento da população e a simbiose com o Poder Executivo que descaracteriza sua competência constitucional.
Quanto à ideia de que o desvio de verbas de merenda escolar e de asfaltamento não podem ser atribuídas ao Congresso Nacional trata-se de meia verdade. De fato, a liberação dos recursos provenientes de emendas parlamentares ao orçamento da União é de responsabilidade do Poder Executivo. No entanto, são inúmeros os casos de irregularidades na execução dessas emendas.
Dentre todas as reações citadas, a mais descabida é a do líder do PMDB na Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, que se referiu ao Dr. Marlon Reis nos seguintes termos: esse cidadão foi leviano com esta Casa, achacou contra a honra de 513 deputados com suposições, como se todos fôssemos responsáveis pela conduta de um parlamentar que não identificou, afirmou. Diante de tal comentário, a impressão que fica é de um parlamentar acuado pelas informações trazidas à luz pela reportagem do Fantástico.
A reação da Câmara dos Deputados demonstra arrogância, incapacidade de reconhecimento de erros e despreparo para a convivência e a aceitação de críticas.
Os movimentos sociais de controle social no País esperam do Parlamento Federal, neste momento:
1. O reconhecimento de que no sistema eleitoral brasileiro as práticas relatadas na reportagem do Fantástico são verdadeiras e que é necessário reformar o modelo para evitá-las.
2. O reconhecimento de que a insatisfação popular com o parlamento tem origem no desvirtuamento da ação dos parlamentares, que vem ocorrendo há décadas no País, fazendo com que as casas legislativas percam o respeito da população.
3. O reconhecimento de que o sistema eleitoral brasileiro, e de maneira mais ampla, o sistema político representativo precisa de reforma urgente.
4. A convocação para os cidadãos participarem de forma consciente dos pleitos eleitorais de outubro próximo, de forma a promover a eleição de pessoas comprometidas com o interesse público.
5. A preparação de orientação e a divulgação de informação aos eleitores que os permita conhecer de maneira aprofundada a história e as propostas dos candidatos à Câmara Federal no pleito de outubro próximo.
Além disso, instamos a Câmara dos Deputados a convocar o Dr. Marlon Reis para que ele exponha perante esta casa legislativa as informações levantadas em suas pesquisas, de forma a promover as mudanças institucionais necessárias para conter os abusos ali levantados.
Agindo assim, a Câmara dos Deputados dará provas de sua maturidade, seriamente questionada no episódio aqui comentado, em função da reação de seu presidente e outros de seus membros, que em nenhum momento tratam do conteúdo da questão, essa sim, matéria de grande relevância para a Nação. A citada reação, inclusive, coloca em cheque diante dos eleitores a credibilidade dos parlamentares que a promoveram, por sua inadequação. Aguardamos, portanto, nova manifestação do presidente da Câmara dos Deputados, mais contrita, e condizente com os anseios dos cidadãos.
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