No melhor dos cenários, um crescimento econômico de 0,2% e uma inflação de 4,5%. Nas contas públicas, a inédita previsão de déficit de R$ 30,5 bilhões, o equivalente a 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB). Esta é a perspectiva para 2016, segundo a proposta orçamentária entregue pelo governo ao Congresso Nacional esta semana. Em outras palavras, o recado é claro: 2015 tende a deixar saudades – acredite se quiser.
Esta é a primeira vez na história do país que o governo federal entrega um projeto de orçamento deficitário, uma novidade mal recebida pelo Legislativo. Deputados e senadores terão de buscar alternativas para cobrir o buraco durante a tramitação da proposta. Aprovado, o projeto vira a Lei Orçamentária Anual (LOA) 2016, que define os recursos dispostos pela União (Executivo, Legislativo e Judiciário) para gastos previstos no ano.
Uma das saídas estudadas pelo governo para cobrir o buraco foi abortada no último sábado, em reunião da presidente Dilma Rousseff com os ministros Joaquim Levy (Fazenda), Nelson Barbosa (Planejamento) e Aloizio Mercadante (Casa Civil): a reencarnação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), uma releitura do chamado imposto do cheque, que, pelas estimativas do governo, geraria um incremento anual de R$ 80 bilhões à receita. Em meio à resistência do empresariado, de parlamentares da base e até do vice-presidente Michel Temer, a sugestão acabou engavetada, deixando um rombo a ser coberto na previsão orçamentária.
Parlamentares da oposição pressionaram sem sucesso o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), a devolver o projeto a Dilma, sem qualquer apreciação. O alagoano, na posição de presidente do Congresso, disse que a peça orçamentária deverá ser melhorada pelos parlamentares, sem que seja necessário impor o constrangimento da rejeição ao Executivo.
O desgaste causado pela proposta gerou o primeiro encontro entre Dilma e Cunha, após o peemedebista se autodeclarar opositor do governo. O deputado, no entanto, não cedeu dessa vez às vontades da oposição. A petista pediu apoio ao presidente da Câmara para conseguir a aprovação do projeto. Diferentemente de Renan, Cunha afirmou que não é de responsabilidade do Congresso procurar solução para o déficit. Além da retração do PIB, da diferença entre arrecadação e despesas, o governo ainda apontou inflação de 4,5%, salário mínimo de R$ 865,50 para o ano que vem e previsão de queda dos investimentos nas estatais, como Infraero e Petrobras.
Apesar do desgaste na relação Executivo e Legislativo após a apresentação da proposta orçamentária, Dilma conseguiu sair por cima de uma das batalhas travadas entre os poderes. Na quarta-feira (2), o Congresso Nacional agendou votação dos vetos presidenciais, o que incluía a apreciação do reajuste salarial de até 78,56% do Judiciário, que pode resultar em impacto de R$ 25,7 bilhões aos cofres públicos. A sessão foi cancelada por falta de quórum e, agora, só será novamente realizada em 22 de setembro.
Para a possível derrubada dos vetos, seria preciso que pelo menos 257 deputados e 41 senadores participassem da votação. O número mínimo foi atingido pelos deputados, mas os senadores não conseguiram a presença necessária para o início dos trabalhos. A ausência dos parlamentares foi encarada como manobra do governo para impedir a aprovação de itens da pauta-bomba. Minutos antes de a sessão ser cancelada, o deputado Miro Teixeira (PROS-RJ) disse, em plenário, que assessores do governo federal ligaram para os parlamentares da base governista pedindo que não comparecessem. O objetivo, segundo ele, era impedir a derrubada dos vetos. “Isso faz parte de uma farsa”, discursou.
Separadamente, as Casas legislativas não deixaram de lado as pautas polêmicas. Contrariando a Câmara, na quarta-feira (2), o Senado aprovou projeto de lei (PL 75/2015) que elimina o financiamento privado de campanha eleitoral. A mudança vai contra a proposta de reforma política(PEC182/07) aprovada em dois turnos na Câmara, quando deputados avalizaram a constitucionalização das doações empresariais a candidatos. No momento, a PEC da reforma política na Câmara adormece nas gavetas do Senado.
As vontades de Cunha, por sua vez, também foram atendidas. O projeto de lei (PLC 25/07) que aumenta em 250% o limite de enquadramento da microempresa no regime especial de tributação do Simples Nacional foi aprovado. Presente na pauta-bomba, a Receita Federal calculou que a ampliação da concessão reduzirá em R$ 11 bilhões a arrecadação.
As mudanças para os integrantes do chamado Supersimples devem entrar em vigor em 2016, segundo a proposta. Atualmente, as empresas com faturamento anual máximo de R$ 360 mil podem integrar o sistema simplificado de tributação. De acordo com o novo texto, para participar do Supersimples será permitida uma receita bruta anual de até R$ 900 mil.
No caso de empresas de pequeno porte, a participação no programa também foi estendida para aquelas que possuem receita bruta anual de R$ 900 mil a R$ 14 milhões. Até então, esse intervalo era de R$ 360 mil a R$ 3,6 milhões, o que representa um aumento de 400%. Nesse caso, haverá uma implementação gradual da nova faixa de concessão. Em 2017, o novo limite será de R$ 7,2 milhões e, somente em 2018, as empresas com receita bruta maior de R$ 7,2 milhões até R$ 14,4 milhões poderão participar do Supersimples.
A Câmara aprovou, entre os destaques do projeto, a extensão do benefício aos micro e pequenos produtores de bebidas alcoólicas e também uma alíquota menor para escritórios de arquitetura.
* Este texto faz parte da seção Flashback, do projeto Truco no Congresso, feito pelo Congresso em Foco e a agência Pública.
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