“É lamentável que um ministro do STF, em período de grave crise no país, milite contra as investigações da Operação Lava Jato, com a intenção de decretar o seu fim, e utilize como pauta a remuneração da magistratura”, diz o comunicado da AMB.
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Gilmar criticou ontem as vantagens recebidas por juízes de instâncias inferiores que permitem que eles ultrapassem o teto constitucional, que é a remuneração de um ministro do Supremo, fixada hoje em R$ 33,7 mil. “Os salários nos estados estão na faixa de R$ 50 mil, R$ 60 mil, R$ 100 mil. Como isso é legal, se ninguém pode ultrapassar o teto dos ministros do Supremo, que é trinta e poucos mil? Como se consegue essa margem? Eu tenho a impressão de que o país virou uma república corporativa em que cada qual, se aproveitando da autonomia administrativa e financeira, faz seu pequeno assalto. Não pode ser assim. Acho que isso precisa ser discutido”, disse o ministro.
Segundo a Associação dos Magistrados Brasileiros, as declarações de Gilmar fazem parte de um movimento que pretende “enfraquecer a magistratura”. “A AMB considera inadmissível qualquer ataque vindo de autoridades e instituições ligadas ou não ao Poder Judiciário. Não serão aceitas manifestações deselegantes e afrontosas, ainda mais feitas por integrantes do Judiciário que não iniciaram carreira na primeira instância, em comarcas de difícil acesso e sujeitas a toda série de limitações”, destaca a nota.
Gilmar Mendes virou ministro do Supremo por indicação do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) após ter atuado como advogado-geral da União na gestão tucana. “O ministro defende financiamento empresarial de campanha e busca descredibilizar as propostas anticorrupção que tramitam no Congresso Nacional, ao invés de colaborar para o seu aprimoramento.”
Orientação partidária
A nota da AMB também faz críticas indiretas à postura de Gilmar como ministro do Supremo. “Sustentamos outro conceito de magistratura, que não antecipa julgamento de processo, que não adota orientação partidária, que não exerce atividades empresariais, que respeita as instituições e, principalmente, que recebe somente remuneração oriunda do Estado, acrescida da única exceção legal da função do magistério.” Os magistrados fazem alusão à participação de Gilmar como sócio-fundador do Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP).
Ontem Gilmar disse que os procuradores “se acham o ‘ó do borogodó’” só porque recebem atenção da imprensa e precisam “calçar as sandálias da humildade”. O ministro cobrou que investigadores sejam alvo de apuração para saber quem vazou termos da delação premiada do empreiteiro Léo Pinheiro, da OAS, para a revista Veja. Ele também atacou o pacote das dez medidas de combate à corrupção, idealizado por integrantes do MPF, sob a liderança do procurador Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa da Lava Jato. Chamou uma das propostas de “coisa de cretino”.
De acordo com reportagem publicada pela revista no último fim de semana, o presidente da OAS contou nas negociações para colaborar com a Justiça e reduzir sua pena que indicou técnicos para realizarem uma obra na casa do ministro Dias Toffoli, do STF. Toffoli disse à revista que pagou pelo conserto e não tem relação de intimidade com Léo Pinheiro.
Durante sessão do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, disse que não houve vazamento de informações do Ministério Público Federal sobre os termos de negociação para acordo de delação premiada entre o ex-presidente da OAS e o MPF. Segundo ele, o anexo citado pela Veja não está nas dependências da Procuradoria-Geral da República. “Não vejo como partirmos do pressuposto – porque o fato não é verídico – de uma presunção de delinquência dos agentes públicos, simplesmente porque o fato não existe, não existiu. Esse anexo jamais chegou a qualquer dependência do MP, seja em Curitiba ou Brasília. É quase um estelionato delacional”, rebateu.
Leia a íntegra da nota da AMB:
“AMB repudia ataques à magistratura proferidos pelo ministro do STF, Gilmar Mendes
A Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) repudia as declarações do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes, de que as instituições do Poder Judiciário se aproveitam da autonomia administrativa e financeira para fazer “seu pequeno assalto”.
O Judiciário vem sendo atacado e desrespeitado por uma série de iniciativas que visam a enfraquecer a magistratura. O questionamento sobre seus vencimentos é uma consequência desse movimento, uma vez que coloca em dúvida a recomposição parcial dos subsídios, já prevista na Lei Orçamentária de 2016, cuja aprovação se arrasta desde julho de 2015, quando o STF enviou a proposta ao Congresso Nacional.
A AMB considera inadmissível qualquer ataque vindo de autoridades e instituições ligadas ou não ao Poder Judiciário. Não serão aceitas manifestações deselegantes e afrontosas, ainda mais feitas por integrantes do Judiciário que não iniciaram carreira na primeira instância, em comarcas de difícil acesso e sujeitas a toda série de limitações, inclusive a terem seus foros incendiados, como ocorreu há poucos dias em Goiatuba, no interior de Goiás.
Além disso, o ministro esqueceu de dizer que os magistrados possuem limitações legais e constitucionais a que não estão sujeitas outras carreiras do Estado, estando impedidos de ter outras fontes de renda além da remuneração pelo exercício dos seus cargos, que somente pode ser complementada com a dedicação dentro das salas de aula.
É lamentável que um ministro do STF, em período de grave crise no País, milite contra as investigações da Operação Lava Jato, com a intenção de decretar o seu fim, e utilize como pauta a remuneração da magistratura. O ministro defende financiamento empresarial de campanha e busca descredibilizar as propostas anticorrupção que tramitam no Congresso Nacional, ao invés de colaborar para o seu aprimoramento.
Sustentamos outro conceito de magistratura, que não antecipa julgamento de processo, que não adota orientação partidária, que não exerce atividades empresariais, que respeita as instituições e, principalmente, que recebe somente remuneração oriunda do Estado, acrescida da única exceção legal da função do magistério.
Dessa forma, a AMB repudia que autoridades se aproveitem de um momento tão fundamental para a democracia para buscar espaço midiático, desrespeitando as instituições. A entidade reforça que é fundamental, cada vez mais, fortalecer o Judiciário como um órgão que tem atuado fortemente a favor do cidadão brasileiro, prezando sua autonomia e independência funcional.
João Ricardo Costa
Presidente da AMB”
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