Entidades de promoção e defesa dos direitos humanos das pessoas LGBTI+ criticaram, nesta quinta-feira (15), decisão da Federação de Patinagem do Paraná (FPPA-PR) que restringe uma criança transgênero de usar os sanitários femininos durante o Campeonato Paranaense de Patinação, marcado para os dias 24 e 25 de março em Londrina (PR). A criança de 9 anos, que deverá competir no campeonato na modalidade feminina, só poderá utilizar o banheiro desde que acompanhada por um responsável do sexo feminino. Os pais da atleta, no entanto, são um casal homoafetivo masculino.
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Em nota, o Transgrupo Marcela Prado, a associação Dom da Terra AfroLGBT, a Associação Paranaense da Parada da Diversidade (APPAD), o Grupo Dignidade, o Centro Paranaense da Cidadania (Cepac), o Espaço Paranaense da Diversidade LGBT (Epad), o Instituto Brasileiro de Diversidade Sexual (IBDSEX), o coletivo Mães pela Diversidade, a Aliança Nacional LGBTI e a rede GayLatino manifestaram sua “indignação e repúdio” à decisão tomada pela federação, que, segundo as entidades, causa constrangimento e desrespeita a Constituição Federal e princípios de direitos humanos sagrados em tratados internacionais, como a Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, e o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, de 1966.
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“Ao mesmo tempo em que reconhecemos que a Federação de Patinação do Paraná tomou a decisão de autorizar a atleta a competir na categoria feminina, a restrição de que ‘a menor poderá utilizar o banheiro feminino acompanhado (sic) de responsável do sexo feminino’, fere o Estatuto da Criança e do Adolescente ao causar constrangimento (art. 18) e fere os princípios constitucionais da dignidade humana, da liberdade e – sobretudo – da não discriminação”, afirma o texto.
Para as entidades, as restrições aplicadas à criança podem ser encaradas como discriminação, já que as mesmas medidas não foram impostas aos demais atletas do campeonato. Também foi criticada a exigência de que a criança seja acompanhada ao banheiro por um responsável do sexo feminino, uma vez que “é do conhecimento da Federação de Patinação do Paraná que a jovem atleta é filha de um casal homoafetivo masculino e que, portanto, os responsáveis por ela são dois homens”.
“[A decisão] também fere diretrizes como a Resolução nº 12 de 16 de janeiro de 2015 do Conselho Nacional de Combate à Discriminação e Promoção dos Direitos de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais, que estabelece que ‘deve ser garantido o uso de banheiros, vestiários e demais espaços segregados por gênero, quando houver, de acordo com a identidade de gênero de cada sujeito’ (art. 6)”, acrescenta a nota.
Constrangimento
Um dos pais da criança, o professor de patinação Cleber Reikdal classificou a decisão da Federação de Patinagem do Paraná como “completamente preconceituosa”.
“Nós temos duas filhas. Uma pode usar o banheiro, a outra não. Essa não é a primeira situação do tipo que acontece dentro da federação. No campeonato do ano passado mesmo, um mês antes da competição, para você ter uma ideia, a gente já tinha passado para eles o laudo do psiquiatra, da psicóloga, informado o nome social dela, para deixar tudo certinho. No dia da competição, levamos toda a documentação original para eles, reforçamos sobre isso. E mais ou menos 20 minutos depois, quando ela foi competir, o que aconteceu? Chamaram ela pelo nome original, e não pelo nome social. Ou seja, são coisas que eles já vêm fazendo há algum tempo”, relatou ao Congresso em Foco.
“No campeonato seguinte, mandamos e-mail falando que não faríamos ela passar por essa situação de novo, querendo saber como seria o posicionamento da Federação, se ela iria respeitar o nome social, como deveria ser. A partir desse momento, passaram a não responder mais nenhum questionamento nosso, e ela acabou perdendo essa segunda competição”, contou.
Para Cleber, a decisão de autorizar a participação de sua filha na competição, mas proibir que ela seja acompanhada ao vestiário pelos pais, é uma forma de exclusão. Segundo ele, a criança já participou de competições em outros estados, e na ocasião não houve problema algum.
“Como é que ela se troca? É uma criança. Como ela vai fazer para ir ao banheiro?”, questionou ele. “Não só é uma maneira de constranger, como já não é a primeira. É uma forma de tentar bloquear e excluir a pessoa, até que uma hora ela fica desmotivada e pronto, parou, não participou, não tem mais isso para resolver”, lamentou o professor.
Transtornos
A reportagem procurou a Federação de Patinagem do Paraná para esclarecer o caso. Segundo o presidente da entidade, Ricardo Di Pretoro, a decisão não visava causar constrangimento à criança, mas sim atender aos questionamentos feitos por pais de outros atletas.
“Esse problema aconteceu na federação já no ano passado. A atleta foi apresentada no campeonato para nós, e como era a primeira apresentação dela, em uma decisão inicial nós a deixamos participar normalmente, com uma carta da médica que havia feito a solicitação, que nós acatamos. Nesse evento, tivemos um problema com os pais, que são do sexo masculino, porque alguns pais de outras crianças vieram reclamar que os pais dela estavam utilizando o banheiro feminino. Não é um problema com ela, mas com os pais que estavam lá, visto que haviam outras crianças, outras meninas com as mães, no banheiro. Isso causou um transtorno”, informou.
Ele explicou que, em antecipação ao problema que poderia se repetir no campeonato deste ano, a Federação resolveu que a criança poderia participar do torneio na modalidade feminina, o que abre precedentes para casos do tipo no futuro. A única ressalva feita foi com relação às idas ao vestiário.
“Essa é uma questão nova para nós, então a federação se antecipou ao problema, ao próximo campeonato, e fizemos um estudo junto ao COB [Comitê Olímpico Brasileiro], a todas as entidades esportivas, para saber se já existia algum caso do tipo. Visto isso, foi aprovada a decisão de que não poderíamos restringir a menina de participar do campeonato. A tentativa da federação foi de preservar a criança. Tomamos uma decisão inédita, de que ela iria participar junto com as meninas sem nenhum problema, sem constrangimento, com o nome social e tudo o mais. A única ressalva feita é que, ao ir ao vestiário, que ela está autorizada a frequentar, fica bem claro na ata, solicitamos que o acompanhamento seja feito por alguém do sexo feminino, para não causar constrangimento para os outros atletas e pais, só isso”, reiterou Ricardo.
A decisão da federação de patinação do Paraná tem o apoio da Confederação Brasileira de Hóquei e Patinação (CBHP). Para o presidente da entidade, Moacyr Neuenschwander Filho, os protestos contra a determinação têm base em uma “distorção muito grande dos fatos”.
“A Federação agiu corretamente. É um caso novo para nós, acho que é novo no mundo. Houve muita queixa dos pais e mães dos outros atletas no ano passado. Por isso, a Confederação entende que as determinações foram adequadas, sem nenhum tipo de exclusão, pelo contrário. Foram tomadas baseadas na lei, na sociedade, no que está ocorrendo no mundo hoje”, completou ele.
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