Renata Camargo
O clima de divergência entre o ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, e o do Meio Ambiente, Carlos Minc, esquentou nesta terça-feira (23), durante a audiência pública para debater dados ambientais realizada na Comissão de Meio Ambiente da Câmara. O novo desgaste entre os ministros foi provocado por uma discordância em torno de pareceres técnicos sobre áreas que podem ser utilizadas para a produção agropecuária.
Segundo o estudo da Embrapa “Monitoramento por Satélite”, defendido por Stephanes, se a legislação ambiental for cumprida na íntegra, 71% do território nacional serão destinados a áreas de preservação sem possibilidade de uso para atividades econômicas. Mas, de acordo com dados do Ministério do Meio Ambiente, as áreas impossibilitadas de uso se restringem a apenas 3,4% do território.
Em seu discurso durante a audiência pública, o ministro da Agricultura se posicionou com indignação em relação às declarações do técnico Braúlio Dias, diretor de conservação da biodiversidade do Ministério do Meio Ambiente, que também participava do debate. Responsável pelo estudo técnico da pasta de Minc, Bráulio considerou a pesquisa da Embrapa dotada de “estimativas grosseiras” e não “apropriadas”.
“Eu respeito os defensores do meio ambiente, mas não necessariamente concordo com o que eles defendem. E não é monopólio dos ambientalistas entender de meio ambiente. Tenho procurado ter muita racionalidade nesse debate. A Embrapa é uma unidade criada há 20 anos. Essa instituição fez a solicitação de um ministro de Estado para que ela colocasse no mapa do Brasil toda a legislação ambiental. O que ela fez está correto. Desqualificar é que não está correto”, disse irritado Stephanes.
O estudo da Embrapa é utilizado para embasar a posição do Ministério da Agricultura na defesa de mudanças profundas na legislação ambiental, como a retirada de percentuais estabelecidos por lei federal para áreas de proteção permanente (APPs) e de reservas legais. A pesquisa orienta, sobretudo, a proposta ruralista para a criação do Código Ambiental Brasileiro, que revoga o atual Código Florestal.
Reação
Presente em parte da audiência, Minc tentou amenizar o desgaste em torno dos estudos técnicos. Sob o argumento de que a discordância dizia respeito ao parecer de um pesquisador, o ministro afirmou que o Meio Ambiente não estaria desqualificando a Embrapa. Minc admitiu, no entanto, que há uma divergência técnica entre os dois ministérios do governo e considerou que as duas pastas estão defendendo teses opostas.
“Há realmente uma divergência entre o parecer técnico de uma área do Ministério do Meio Ambiente e de um parecer técnico de um pesquisador da Embrapa. Eles divergem se é verdade ou não de que o Brasil é uma grande unidade de conservação e que isso está impedindo a agricultura”, disse Minc. “Para nós, não é verdade que o Brasil seja uma unidade de conservação completamente engessada e que a agricultura esteja asfixiada por isso. Há uma posição divergente, mas ela é pontual em relação a esse estudo”, amenizou Minc.
O ministro do Meio Ambiente defendeu que, apesar desse ponto de discordância, as duas pastas concordam na defesa do “desmatamento zero” e no argumento de que o plantio de soja não é o grande responsável pelo desmatamento. Para os ministros, o vilão da devastação ambiental é o avanço da pecuária.
Embate técnico
Segundo estudo do pesquisador Evaristo Miranda, da Embrapa Monitoramento por Satélite, se a legislação ambiental fosse cumprida na íntegra, 71% do território brasileiro seriam áreas de reserva legal, APPs, unidades de conservação e terras indígenas. Restariam apenas 29% para a produção agropecuária e outras atividades econômicas.
De acordo com o estudo do MMA, apenas 3,4% do território brasileiro estão em unidades de conservação e proteção integral, ou seja, em áreas de proteção que oferecem restrição absoluta para a atividade econômica e que devem ser mantidas sem qualquer produção agropecuária. Segundo o diretor Bráulio Dias, o pesquisador Evaristo Miranda propôs estimativas baseadas em um mapeamento topográfico inadequado e considerou como inutilizáveis unidades de conservação que podem ter uso sustentável.
“Essas são as áreas mais extensas e podemos ter todo o tipo de atividade nessas áreas. As estimativas que o senhor Evaristo divulgou são estimativas grosseiras sobre a extensão de mapeamento, não é apropriada. Nos preocupa o uso dessas informações sem a devida comprovação técnica e científica e isso pode levar a conclusões errôneas sobre a extensão desses territórios e o seu papel. A APP permite fazer o uso agroflorestal”, considerou Braúlio.
Para engrossar o debate, o ministro Carlos Minc disse ainda que, nos últimos anos, a agricultura brasileira se desenvolveu muito mais em produtividade do que em extensão. Segundo Minc, em dez anos, a produção dobrou, enquanto o aumento de área utilizada para agricultura aumentou em apenas 11%.
“Nós achamos que o Brasil é um dos poucos países do mundo que pode expandir, simultaneamente, a área de produção de alimentos, de etanol e combustível e a biodiversidade. Em 15 anos, triplicou o número de espécies ameaçadas de extinção. Passou de 240 para 620. Se nós fossemos um país que é uma verdadeira unidade de conservação, em que nada se pode ser feito, não teria acontecido isso. A nossa tese é de que temos proteção a menos e não a mais”, defendeu Minc.
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