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Dez deputados federais eleitos em 2002 receberam doações das duas principais indústrias de armamentos brasileiras: a Taurus, com sede no Rio Grande do Sul, e a Companhia Brasileira de Cartuchos (CBC), localizada nos municípios paulistas de Guapituba e Ribeirão Pires. Juntas, as duas indústrias injetaram R$ 355 mil nas campanhas dos candidatos eleitos para uma vaga no Legislativo em Brasília (leia mais). O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que agora defende o desarmamento da população, foi quem mais recebeu recursos durante sua campanha eleitoral: R$ 100 mil, da Companhia Brasileira de Cartuchos. O Congresso em Foco procurou os parlamentares que receberam contribuição da indústria de armas em 2002 para saber a posição deles diante do projeto que regulamenta o referendo. Dos dez, apenas dois manifestaram apoio à consulta popular: Enio Bacci (PDT-RS) e Sigmaringa Seixas (PT-DF), vice-líder do governo na Câmara. Leia também Presidente da Comissão de Segurança Pública, Bacci recebeu R$ 10 mil da Taurus, 15% do total de sua campanha. “A maioria da bancada do meu estado é contrária, mas eu sou totalmente favorável (ao referendo)”, afirma o deputado. Sigmaringa não quis responder diretamente se a doação de campanha influenciaria o seu voto na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania. O petista recebeu R$ 40 mil da CBC. Demonstrando irritação com a abordagem, apontou para o coordenador da organização não-governamental Viva Rio, Antonio Rangel: “Pergunta para ele ali”. Amigo de Sigmaringa desde os 14 anos de idade, Rangel disse que o vice-líder do governo lhe assegurou, logo após as eleições, que sequer tinha conhecimento de que havia recebido doação da empresa de cartuchos. Na avaliação do cientista político, o deputado é um dos principais articulares do referendo dentro do PT. O presidente nacional do PTB, deputado Roberto Jefferson (RJ), era uma das principais vozes contrárias ao Estatuto do Desarmamento em 2003. Recebeu R$ 50 mil da Taurus, cerca de 35% do gasto total declarado de sua campanha. A assessoria de imprensa do deputado informou que ele não quer mais falar sobre o assunto, mas não explicou o motivo da negativa nem a posição do petebista em relação ao referendo. O deputado gaúcho Alceu Collares (PDT) também recebeu R$ 50 mil da Taurus, cerca de 24% do orçamento da campanha eleitoral. Contrário ao referendo, Collares afirma que o valor doado pela empresa “era tão pequeno que ele nem sequer se lembrava”. “Recebi uma doação declarada de uma indústria do meu estado”, completou o deputado. O deputado Mendes Ribeiro Filho (PMDB-RS) recebeu R$ 15 mil da indústria gaúcha, o equivalente a 10% dos gastos da campanha. “Aceitei a doação com base na legislação eleitoral e está tudo declarado”, afirma o peemedebista, também contrário ao referendo. “Eu sou é a favor do desarmamento dos bandidos, coisa que não vai acontecer com o referendo”, afirma. A Taurus doou R$ 10 mil a Pompeo de Mattos (PDT-RS), cerca de 7,8% do total dos gastos declarados pelo deputado com a campanha. Mattos disse que, mesmo antes da doação da indústria, era contrário à qualquer discussão sobre o referendo, “por princípio. “Não me influencio por doação de campanha alguma”, sustenta o deputado. E acrescenta: “No meu estado, é politicamente correto defender a indústria local”. O deputado Alberto Fraga (sem partido-DF) recebeu R$ 60 mil da empresa paulista CBC. O valor equivale a 64% do arrecadado pela campanha do parlamentar, que é coronel da reserva da Polícia Militar “Recebi mesmo, até o presidente Lula recebeu”, responde Fraga, um dos líderes da chamada bancada da bala. “A legislação é muito ruim, e o governo não dá conta da segurança pública. Como é que o governo pode proibir o cidadão de se defender?”, questiona. Apesar de se manifestar favoravelmente ao referendo, Bacci responsabiliza o governo por vender a proposta como a salvação para acabar com a criminalidade no país. “Estão criando uma expectativa irreal na população”, alerta o parlamentar, ao sugerir que é necessário coibir o tráfico internacional de armas e aumentar as ações de apreensão de armamentos ilegais. Assim como Bacci, Fraga diz estar preocupado com a ilusão de segurança que o governo tem vendido para a população, após a proibição da venda de armas. O deputado tenta mostrar isso com números, segundo ele, oficiais do Ministério da Justiça. No ano passado, cerca de 1,2 mil armas legais foram vendidas no país. Dessas, mais de 900 equiparam forças policiais e militares e pouco mais de 200 pararam nas mãos do cidadão comum. “Essas 290 mil armas recolhidas pela campanha do Desarmamento não fazem diferença alguma”, sustenta. “A maioria das armas era velha”, completa Fraga. Por meio de sua assessoria de imprensa, o deputado Robson Tuma (PFL-SP), que recebeu R$ 50 mil da CBC, limitou-se a informar que “é a favor do desarmamento dos bandidos e da sociedade”. A assessoria não informou a posição do deputado sobre o referendo. O deputado Josias Quintal (PMDB-RJ), que recebeu R$ 40 mil da CBC, disse que é contrário ao referendo este ano por motivos econômicos. “Por que não realizamos esse plebiscito no ano que vem, junto das eleições, e não gastamos nada a mais”, questiona Quintal. Para ele, há interesses econômicos e eleitorais por trás desse referendo. O único parlamentar a não responder aos contatos feitos pelo Congresso em Foco foi o gaúcho Nelson Proença (PPS), que recebeu R$ 30 mil da CBC. |
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