As denúncias de envolvimento do deputado Bispo Rodrigues (PL-RJ), da Igreja Universal do Reino de Deus, com o ex-subchefe de Assuntos Parlamentares da Presidência da República, Waldomiro Diniz, dividiu os membros da Frente Parlamentar Evangélica, formada por 58 deputados de vários partidos.
A frente inclui nomes e personagens tão díspares como os deputados Walter Pinheiro (PT-BA) e Silas Câmara (PTB-AM) e é presidida por Adelor Vieira (PMDB-SC), membro da Assembléia de Deus.
Os evangélicos do Congresso não têm uma posição formada a respeito da instalação de uma comissão parlamentar de inquérito para investigar os atos do ex-assessor de José Dirceu no Palácio do Planalto. Mas Adelor admite assinar o pedido de criação da comissão, "dependendo do desenvolvimento da apuração".
Ele dá a entender, porém, que a bancada é contrária a qualquer tipo de jogo de azar e não deve criar problemas ao governo para aprovar a medida provisória que proibiu o funcionamento de casas de bingo no país. Ontem, 20 mil pessoas fizeram uma manifestação em Brasília contra a medida, sob a alegação de que a MP causa desemprego.
Existe, porém, um racha no movimento. O senador Marcello Crivella (PL-RJ), também ligado à Igreja Universal, já se disse favorável aos bingos.
Além de condenar os jogos, o coordenador da frente evangélica, em entrevista ao Congresso em Foco, atacou o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e defendeu que a reforma agrária seja feita pelos estados e municípios, com recursos repassados pelo governo federal. Publicidade
“O MST, na minha avaliação, tem extrapolado e tem ido para um confronto. Tem servido para alimentar egos de certas lideranças. Tem usado pessoas que não são sem-terra. O governo precisa saber quem são os bem intencionados e quem são aqueles que estão mal intencionados”, disse.
De olho nas eleições municipais de outubro, ele disse que os evangélicos querem mais espaço na sociedade: “O nosso propósito é eleger o maior número de vereadores em todas as cidades, ter pelo menos um evangélico em todas as Câmaras. É uma meta que estamos buscando atingir a cada ano”.
Adelor se disse ainda contrário ao controle externo do Judiciário e às listas fechadas previstas na reforma política. Também criticou os projetos que prevêem a união civil de homossexuais. "Não temos nenhuma discriminação nem preconceito (contra homossexuais). Existem pessoas que foram regeneradas", alegou.
Congresso em Foco – O senhor é favorável à instalação de uma comissão parlamentar de inquérito para apurar o caso Waldomiro?
Adelor Vieira – O caso tem que ser esclarecido, seja através do Ministério Público, seja por outro órgão que tenha o direito de fazer esse tipo de investigação. É preciso buscar a verdade, seja como for.
O senhor assinaria o pedido de uma CPI para esse caso?
CPI é o maior instrumento de apuração e se usa para casos graves, quando há pontos fundamentais que merecem ser objeto de investigação parlamentar. E esse é um caso grave. Dependendo do desenvolvimento da apuração, eu assinaria.
"Dependendo do desenvolvimento da apuração, eu assinaria (o pedido de CPI)"
O senhor recebeu alguma orientação nesse sentido por parte da liderança de seu partido, o PMDB, que é um aliado do governo?
Por enquanto, não houve qualquer orientação do partido, nem sei se haverá.
As denúncias contra Waldomiro respingaram no deputado Bispo Rodrigues (PL-RJ), que acabou sendo afastado da Igreja Universal do Reino de Deus, enquanto os fatos são apurados. Como a bancada evangélica recebeu essa denúncia de possível envolvimento de um de seus integrantes em irregularidades?
São fatos correlatos, que fazem parte de um mesmo processo. Sempre que há um fator como esse, ocorre um desgaste e a perda de credibilidade para as instituições. Agora, cada um tem de pagar por seus atos. Se a denúncia for comprovada, a punição é um processo natural. Estamos vivendo o aperfeiçoamento da democracia no Brasil.
"Cada um tem de pagar por seus atos"
O caso macula a própria bancada evangélica?
Sempre que se faz parte de uma instituição em que isso ocorre com um de seus integrantes, há um desgaste natural. Mas os nossos valores positivos são muitos e se sobrepõem a isso. Não podemos fazer diferente. É preciso que se chegue a uma conclusão por parte do Ministério Público, independentemente de qualquer igreja. Eu lamento, como se fosse com qualquer outro integrante do Legislativo.
O senhor acha que o ex-bispo deveria se afastar, por livre e espontânea vontade, do cargo, enquanto as denúncias são apuradas?
Primeiro é preciso saber a veracidade dos fatos, o que só vamos saber quando tivermos em mãos todos os depoimentos. A igreja (Universal do Reino de Deus) já tomou sua posição. O Parlamento tem que aguardar os desdobramentos.
O governo acertou ao editar a Medida Provisória que proíbe o funcionamento dos bingos?
Nós, evangélicos, sempre fomos contrários a toda espécie de jogatina, na qual se incluem os bingos. A Bíblia diz que o homem deve ganhar o pão com o suor do rosto e não apostando na sorte. Não se mostra o lado obscuro, da lavagem do dinheiro, do narcotráfico. Esse não foi o primeiro nem será o último escândalo envolvendo jogos. Ai daqueles que entram por esse caminho, porque mais cedo ou mais tarde eles se arrependerão. O governo tem outras formas de gerar emprego na indústria, na agricultura, na ciência e na tecnologia. Se hoje são gerados cerca de 300 mil empregos, como alegam as entidades que representam os jogos, daqui a cinco ou dez anos esse número será muito maior, caso o governo não tome uma atitude. Não podemos concordar nem com a oficialização dos jogos pela Caixa Econômica Federal.
"Nós, evangélicos, sempre fomos contrários a toda espécie de jogatina. Não podemos concordar nem com a oficialização dos jogos pela Caixa Econômica Federal "
A bancada evangélica tem um peso grande sobre o eleitorado. Como vai ser nestas eleições?
Assim como os partidos, as posições são tomadas de acordo com as conveniências de cada município. O nosso propósito é eleger o maior número de vereadores em todas as cidades, ter pelo menos um evangélico em todas as Câmaras. É uma meta que estamos buscando atingir a cada ano. Queremos influenciar positivamente na sociedade, isso envolve ocupação de espaços. Não queremos espaço apenas no Legislativo. Desejamos também espaço no Executivo. O Judiciário é outra questão, mas queremos também ter bons magistrados. Nós já temos muitos prefeitos, mas queremos aumentar. A nossa participação nesse caso é suprapartidária.
"Não queremos espaço apenas no Legislativo. Desejamos também espaço no Executivo"
Não vemos bancada católica ou espírita no Congresso. O que move a formação de uma bancada evangélica? Por que essa relação entre política e religião?
Não há uma mistura de religião com política. Somos uma parcela significativa da sociedade e não queremos ser omissos nem submissos. Queremos participar, influenciar, contribuir. A nossa intenção é de contribuir para um Brasil melhor e socialmente mais justo. Só poderemos alcançar isso se participarmos.
Como vocês estão vendo o governo Lula? Os evangélicos tinham um candidato, que era o ex-governador Anthony Garotinho…
Os evangélicos não tinham candidato. O Garotinho era um evangélico que se lançou candidato. Ele não foi lançado pelos evangélicos, mas pelo PSB. Essa é a diferença que temos de entender. Eu fui lançado pelo PMDB, sou vice-líder do partido e minha convicção religiosa é cristã. Minha denominação religiosa é Assembléia de Deus, assim como temos os deputados Walter Pinheiro, que é do PT, e Silas Câmara, do PTB. Não foram os evangélicos que lançaram o Garotinho, ele foi lançado por um partido.
Como vocês vêem a questão da lista fechada prevista na reforma política?
Entendemos que a reforma política é importante e necessária. Queremos a fidelidade partidária, fazer com que os partidos sejam fortalecidos. Não entendemos que seja necessário instituir uma lista fechada para fortalecer os partidos. Se fizermos isso partidariamente vamos certamente inibir ou diminuir a participação das minorias, como o negro, a mulher, o pobre, que dificilmente serão cabeça de lista.
"Queremos a fidelidade partidária, fazer com que os partidos sejam fortalecidos. Não entendemos que seja necessário instituir uma lista fechada para isso"
Como o senhor vê a reforma do Judiciário?
Independente da instituição de um órgão de controle externo, creio que uma reforma que pautasse um Judiciário mais ágil, mais próximo do cidadão, fosse tão importante quanto o controle externo. Defendo um Judiciário mais transparente e aberto do que criar um órgão para policiar o Judiciário. O Poder Legislativo é uma vitrine, é mais aberto, vulnerável e transparente.
O Judiciário é ainda mais fechado, por causa dos processos, que são mais sigilosos. Gostaria que houvesse uma legislação que pudesse flexibilizar, equipar melhor o Judiciário, criar mais varas. Não podemos ter, como temos, varas com até 30 mil processos encalhados em comarcas com 50 mil habitantes. Precisamos criar mais juizes de pequenas causas, fazer um grande mutirão na Justiça, para que no máximo em um ano houvesse o julgamento.
"Defendo um Judiciário mais transparente e aberto do que criar um órgão para policiar o Judiciário"
Quantos evangélicos existem no Brasil?
Estamos entre 22% e 23% da população.
A quê o senhor atribui o preconceito contra os evangélicos da parte de vários segmentos da sociedade?
É falta de conhecimento, ignorância. O fato de o cidadão ser um intelectual não significa que ele não ignore determinadas coisas, até por formação. O evangelho está em todas as classes.
O senhor acha que os evangélicos são bem tratados pelo governo Lula?
Na verdade, nós ainda estamos nos organizando. Eu creio que ainda não somos mais ouvidos porque ainda não estamos bem unidos no nosso propósito. Nós ainda estamos em um processo de conscientização dos vários segmentos. Nós, também, ainda não estamos conscientes de que podemos contribuir muito mais para esse governo para o bem da sociedade.
Vocês são contra a união civil entre homossexuais. Também são contra o homossexualismo. Isso não é intolerância?
Na verdade, nós não temos nenhuma discriminação nem preconceito a esse respeito. Existem pessoas que foram regeneradas. Nós acreditamos que a união civil fere princípios bíblicos e Bíblia é a regra de conduta. O que diz a Bíblia? Não é bom que o homem viva só e Deus faz uma companheira. Nós entendemos que isso é para a preservação da raça humana.
"Não temos nenhuma discriminação nem preconceito (contra homossexuais). Existem pessoas que foram regeneradas"
Como os evangélicos encaram o MST?
Acho que toda manifestação é válida desde que seja dentro de um espírito de decência e de ordem. Tem que ter um motivo e tem que ser ordeira. O MST, na minha avaliação, tem extrapolado e tem ido para um confronto. Tem servido para alimentar egos de certas lideranças. Tem usado pessoas que não são sem-terra. Tem faltado com a verdade porque utiliza pessoas em seu movimento que são de centros urbanos. O movimento tem se descaracterizado. Eu acredito que tem muita gente boa ali, mas o governo precisa saber quem são os bem intencionados e quem são aqueles que estão mal intencionados.
Como fazer isso?
Eu tenho trabalhado para fazer isso uma bandeira da frente parlamentar, um projeto de lei em que o governo possa, a exemplo do fez com as reformas da Previdência e tributária, chamar os governos dos estados e passar essa responsabilidade também aos estados e, se possível, aos municípios. Cada estado faria um levantamento socioeconômico desse movimento, cadastrando para saber quem são, onde estão e quais as suas origens e reestadualizassem aqueles que estão fora do seu estado de origem.
Como assim?
Se tem gente do Mato Grosso do Sul em Santa Catarina, quem vai cuidar dele é o governo de Mato Grosso do Sul. A reforma agrária seria feita pelos estados. Seria uma parceria com o governo federal. O governo federal mandaria os recursos para os estados. Os estados sabem as terras que podem ser desapropriadas. Nós vamos trabalhar isso este ano. A reforma agrária é fundamental para o país. As igrejas podem entrar nessa mobilização. As igrejas, numa parceria, poderão fazer o levantamento socioeconômico. O governo do estado pode criar uma estrutura para fazer o levantamento através das igrejas. E aí o Fome Zero entraria.
Vocês são a favor do planejamento familiar?
Somos, é claro. Somos a favor do uso da camisinha. Somos contra a distribuição de preservativos nas escolas.
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