O que são instituições? Este é um debate sem fim no mundo acadêmico. Por que elas são importantes? Como são construídas e como mudam? Como morrem? O que faz algumas fortes e outras frágeis? Que valores e incentivos as governam? Como se adaptam – ou não – às mudanças pelas quais as sociedades passam? Como desenvolvê-las para que sirvam à sociedade? Por que devemos nos preocupar com elas – ou não?
Esta é uma boa hora para conversarmos sobre nossas instituições. A razão é simples: “a política pede futuro”, como disse o ex-presidente Cardoso em entrevista recente. E eleições majoritárias, incluindo os cargos de Presidente, Governadores, Deputados Federais, Deputados Estaduais e Senadores são uma extraordinária oportunidade para o país atualizar-se e dizer a que se propõe. Não surpreendentemente candidatos como o ex-presidente Lula apresentam-se como restauradores da esperança.
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Se fizéssemos uma radiografia das instituições brasileiras o resultado seria com certeza heterogêneo, nebuloso e discutível. Os motivos para a confusão são vários. O primeiro é simples e tem pouco a ver com o governo do dia: uma enorme desinformação sobre as instituições, notadamente as governamentais. Este é um problema histórico, mas que se agrava em ambientes de turbulência, caracterizados pela disseminação de “fake news” e comportamentos midiáticos amplificadores de extremismos.
Uma segunda dificuldade é falta de informações – problema agravado pelo progressivo descumprimento da Lei de Acesso a Informação e por interpretações distorcidas de seus princípios. Além disso, vivemos um momento em que tanto o executivo como o legislativo tomam iniciativas destinadas a bloquear o acesso das pessoas a dados e informações públicas, como no caso do “orçamento secreto” – a radiografia dos recursos distribuídos via emendas com identificação de parlamentares e instituições beneficiados.
Um terceiro aspecto diz respeito ao feixe de escolhas embutido em cada instituição. Valores, propósitos, direcionamentos, normativos, capacidades institucionais, modus operandi e outras importantes dimensões políticas e organizacionais variam de acordo com cada organização. “O governo”, “o SUS”, “as Forças Armadas “, “a área econômica”, “o Itamaraty”, “a Cultura”, “a Segurança”, “a Justiça”… são instituições que nem sempre correspondem exatamente a organizações.
Focar nas instituições no Brasil hoje é problematizar seu papel e para que servem. A combinação da visão do atual Presidente da República – primeiro destruir, para depois construir outra coisa – com a do Ministro da Economia – quanto menor o Estado melhor para economia – produziu um cenário desafiador para o país, para o serviço público e para a sociedade brasileira.
A situação varia muito conforme a área do governo. As áreas de infra estrutura e militar têm se beneficiado por serem prioridades presidenciais. Mas o cenário noutros setores como educação, meio ambiente, desenvolvimento social, cultura, ciência e tecnologia é desolador. Saúde talvez seja o e exemplo mais interessante em função da resiliência demonstrada pelo SUS. Mas o colapso crescente da infraestrutura de dados em várias áreas sugere riscos de os apagões intermitentes resultarem em uma escuridão sistêmica neste ano eleitoral que promete muita turbulência.
Os desafios do próximo governo serão imensos. Precisará fortalecer os ministérios, autarquias e fundações da área social. É verdade que, a despeito de seus vultuosos orçamentos e dos respectivos tamanhos, os ministérios da Saúde e Educação sempre foram mais frágeis e menos profissionalizados, em contraste com as áreas econômicas, jurídica e de infraestrutura. O fato de que a profissionalização destas áreas não ter sido priorizada e de funcionarem com base em quadros cedidos e arranjos provisórios está custando caro ao país. A carreira de analistas de políticas sociais não teve a mesma prioridade, atenção e aderência do que as de infraestrutura, jurídicas, segurança e econômicas.
Outros ministérios afetados pelas políticas de desmonte ou esvaziamento – como relações exteriores, meio ambiente e ciência, tecnologia & inovação – têm sido também duramente afetados pelas decisões governamentais, mas seus quadros têm resistido e preservado rotinas, projetos e, às vezes, até políticas públicas.
As pessoas são parte chave das instituições. E, mesmo que a tecnologia tenha mudado um pouco isso, o capital humano continua sendo um dos maiores ativos estratégicos das instituições – públicas e privadas.
A construção de um serviço público nacional, profissional, moderno e qualificado é uma tarefa inacabada. Para tornar as coisas mais complexas é importante atentar para o fato de que a tarefa mudou e talvez não seja mais a do século XX. O mundo não é mais o mesmo, considerando mudanças como a revolução tecnológica, a flexibilização das relações laborais, a internalização do imperativo fiscal e o impacto da pandemia de covid 19 sobre o mundo do trabalho. Essas novas realidades redefinirão a natureza do serviço público, que ainda não as processou e internalizou.
O próximo governo não poderá se furtar a priorizar este tema. Instituições governamentais serão protagonistas em papéis relevantes para a implementação de políticas que traduzam as promessas de campanha e os projetos de país. Estas instituições precisarão ser objeto de atenção e de um tipo de apoio que não têm recebido nos últimos anos.
Mais do que o alinhamento das estruturas de incentivos para que desempenhem suas funções no contexto das atividades de governo, as organizações públicas federais precisarão de uma revisão profunda do seu modus operandi em função de seu lugar na esfera pública. Este é um ano para se aprofundar diagnósticos, fazer discussões, processar visões conflitivas e incubar propostas. O tempo perdido custará caro ao país. Há muito a ser feito desde já, até porque não será neste ano que as tendências delineadas nos últimos anos serão revertidas.
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