Telmário Mota*
No início de 2019, eu fui sozinho à Venezuela em missão de diplomacia parlamentar para convencer o governo daquele país a reabrir a fronteira com Roraima e retornar o fornecimento de energia elétrica da usina de Guri, fundamental para o abastecimento do meu estado, que é o único do país que não está ligado ao sistema elétrico nacional.
Cheguei a reunir-me com o presidente Maduro e voltei com a promessa de que o problema seria solucionado. E foi. A fronteira foi reaberta e o fluxo de comércio foi retomado. O fornecimento de energia elétrica até hoje não foi restabelecido, por idas e vindas da burocracia do Estado brasileiro e desencontros entre os governos do Brasil e da Venezuela.
Na época, paguei um preço alto pela ousadia de não me acomodar e de transpor os obstáculos burocráticos e arregaçar os braços para resolver problemas que asfixiavam a economia roraimense.
Fui vítima de uma ação criminosa dos quadrilheiros das fake news. A minha foto cumprimentando o presidente constitucional da Venezuela foi apresentada nas redes sociais como se eu tivesse me convertido num militante comunista bolivariano.
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Os bandidos não disseram uma palavra a respeito das razões que me levaram a viajar a Caracas: reabrir a fronteira para restabelecer o fluxo de comércio e obter a volta do fornecimento da energia elétrica para o nosso povo.
Pouco tempo depois, Donald Trump foi à Coreia da Norte reunir-se com o Kim Jong-un e os jornais de todo o mundo estamparam nas suas capas a foto histórica. Mas os cachorros raivosos de Roraima que me atacaram com fake news quando fui ao presidente Maduro defender os interesses do meu povo calaram-se em silêncio obsequioso diante do gesto do presidente dos EUA para com o “ditador” norte-coreano. Além de covardes revelaram-se sabujos do império estadunidense.
É verdade também, e devo prestar aqui o meu reconhecimento e gratidão, que recebi uma inesperada e volumosa manifestação nacional de apoio. Dezenas de personalidades da diplomacia, da política, da economia, do Direito e das artes produziram uma nota de reconhecimento e solidariedade ao meu gesto de buscar a paz e a integração regional.
E por que escrevo a respeito desse assunto um ano depois? Porque hoje a rodovia brasileira na fronteira registra dezenas de quilômetros de caminhões carregados de alimentos destinados à Venezuela. É praticamente o único oxigênio do nosso comércio, um pouco de vida comercial na tragédia da estagnação econômica provocada pelo coronavírus.
Na época, a minha atitude de ir à Venezuela reunir-me com as autoridades em busca de soluções imediatas para o sofrimento que aflige o povo do meu Estado, a minha querida Roraima, causou surpresa em muita gente no Brasil e na América Latina. Muitos se perguntaram: quem é esse Telmário Mota? Como ele tem semelhante coragem de ir sozinho a um país conflagrado e sair de lá com um começo de solução para o fechamento da fronteira entre a Venezuela o Brasil, um problema que parecia não ter solução pelo diálogo e pela diplomacia?
Só faz tais perguntas quem não me conhece. Venho de longe. Recebi dos meus antepassados o legado do compromisso com o povo roraimense e com o povo brasileiro.
O meu bisavô, Coronel Mota, educador, foi o primeiro prefeito e Juiz de Paz de Boa Vista. O seu primeiro filho, o tio Vitor, morreu lutando pelo território nacional contra os invasores ingleses. Junto com ele estava o meu avô, Pedro Rodrigues, o último comandante do Forte São Joaquim do Rio Branco. Aprendi com a minha mãe, Ana, índia macuxi, e com o meu pai, o vaqueiro Tuxaua Pereira, a amar as pessoas e a ter coragem na vida.
Assim como fez o tio Vitor, eu, se necessário, dou a minha vida pelo povo do meu Estado e do meu país.
O Brasil tem uma missão, pela qual eu pauto a minha vida e o meu mandato: construir no hemisfério sul da América um território de paz e de prosperidade para o bem dos nossos povos.
Não tenho a pretensão de ser mais do que sou. Tenho consciência de que a sociedade e a história se movem por gigantescas forças objetivas de natureza econômica e geopolítica. Mas sei também que as mudanças que precisam ocorrer não acontecem por inércia, mas pela ação concreta de homens concretos.
Acredito no papel do indivíduo na história. Um sábio da floresta me ensinou que nas tormentas e nas travessias difíceis, cada um só faz o que pode, só dá o que tem e só mostra o que é. Assim como os meus antepassados, eu faço a minha parte. Que cada um faça a sua. E colha o bem que plantar!
*Telmário Mota é senador por Roraima pelo Partido Republicano da Ordem Social (PROS).
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