Foi animada, pra usar um adjetivo suave, a reunião do Conselho Superior da Defensoria Pública da União (CSDPU) na última sexta-feira (14). O colegiado decidiu instituir a exigência de vacinação para acessar qualquer unidade da Defensoria Pública da União (DPU) – veja no final do texto a íntegra da resolução aprovada.
Mas a decisão foi antecedida por cenas de conflito aberto entre os defensores da União. O momento mais acalorado ocorreu depois que o defensor Jovino Bento Júnior, contrário à medida, fez uma comparação favorável a Adolf Hitler ao analisar o comportamento do governo da Austrália em relação ao tenista número um do mundo, o sérvio Novak Djokovic.
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Se estiver com pressa, entre logo no vídeo acima e veja os principais trechos da discussão. Ou então você pode seguir comigo mais algumas linhas e assistir ao vídeo depois.
Djokovic, você sabe, foi impedido de participar do Australian Open, um dos principais torneios de tênis do mundo, por se recusar a tomar vacina. Não foi um procedimento isolado contra o atleta. É o que o governo australiano exige de todos os estrangeiros, assim como faz um número crescente de nações. Sendo Djokovic quem é, porém, a história rendeu horrores. Terminou no último fim de semana, com o veredito final da Justiça confirmando o direito do governo de lhe negar entrada. E Djokovic, claro, se tornou um símbolo do ativismo antivacinas nestes tempos de covid-19.
Palavras literais de Jovino: “Nem Hitler fez com Jesse Owens na Alemanha o que o governo da Austrália está tentando fazer com Djokovic. E é exatamente isso. Jesse Owens foi aquele negro que ganhou quatro medalhas olímpicas nas Olimpíadas de 1936, em Berlim, né, tudo sendo assistido por Hitler. E Hitler não o impediu de competir, de entrar no país, como começa a se ver hoje nos países”.
Reação do conselheiro Antonio de Maia Pádua: “Não se pode admitir que alguém acorde cedo, se prepare, ponha um terno e uma gravata para vir elogiar a conduta de Hitler perante o Conselho Superior da Defensoria ou qualquer outro lugar! Ou qualquer outro lugar! Não… nada que venha dali é paradigma, é exemplo, é algo a ser imitado. Nada!”
Jovino ficou conhecido após acionar judicialmente a rede de lojas Magazine Luiza por ter aberto um programa de trainee destinado exclusivamente a jovens negros. A sua tese jurídica foi rechaçada pela DPU e pelo Ministério Público Federal (MPF), mas também o levou a colher manifestações explícitas de simpatia. Teve, por exemplo, a solidariedade de vários parlamentares bolsonaristas após denunciar ter sido vítima de ameaças de morte por causa da sua atuação no caso. E nota de apoio do MP Pró-Sociedade:
NOTA DE APOIO ao Defensor Público Jovino Bento Júnior pela coragem de lutar contra o sistema propondo ação judicial contra o preconceituoso programa de trainee do Magazine Luíza que faz distinção entre seres humanos negros, brancos, amarelos etc.
Você não está sozinho Dr. Jovino! pic.twitter.com/FEmwAHbOdZ— MP Pró-Sociedade (@m_ppro) October 15, 2020
Ele disse, durante a reunião do CSDPU, que não se vacinou por ter descoberto recentemente que não pode tomar a vacina contra a covid. Enquadra-se, conforme afirmou, na situação de “grupos com contraindicação à vacina”. Relata ter se encontrado em 12 de janeiro com o secretário-executivo adjunto do Ministério da Saúde, Alessandro Glauco dos Anjos de Vasconcelos: “Ficou muito clara a posição do Ministério da Saúde contra a vacinação obrigatória”.
O defensor e outros membros do DPU também foram autores de uma representação, formalizada no último dia 7, para que o Ministério da Saúde informe a população sobre os riscos das vacinas. “É um direito de todo cidadão, todo consumidor”, justificou.
Autor da proposta afinal acatada pelo CSDPU, o defensor da União Ricardo Russel Brandão Cavalcanti enfatizou que são óbvios os benefícios trazidos pelas vacinas, que elas oferecem riscos mínimos e que a exigência de vacinação tem amparo na ciência e já é feita por diversos tribunais e órgãos públicos brasileiros.
Veja a íntegra da resolução aprovada pelo Conselho Superior da DPU:
“RESOLUÇÃO Nº 193, DE 14 DE JANEIRO DE 2022
Estabelece orientações e medidas sanitárias para retorno das atividades presenciais no âmbito de todas as Unidades da Defensoria Pública da União.
O CONSELHO SUPERIOR DA DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO, no uso das atribuições que lhe são conferidas pelo inciso I do art. 10 da Lei Complementar 80/1994, resolve:
CONSIDERANDO a necessidade de normatização de orientações e medidas sanitárias para retorno das atividades presenciais no âmbito de todas as Unidades da Defensoria Pública da União em face da pandemia SARS-CoV-2.
Art. 1º. No prazo de cinco dias, contados da publicação desta resolução, os e as Defensoras Públicas Federais, servidoras, estagiárias e colaboradoras da Defensoria Pública da União apresentarão, conforme o caso, ao setor de recursos humanos:
I – cópia de documento comprobatório de vacinação completa contra a COVID-19; ou
II – atestado médico que evidencie contraindicação para a vacinação contra a COVID-19.
Parágrafo único. No caso do inciso II, será exigida a apresentação de teste RT-PCR ou teste antígeno negativo para COVID-19 realizado nas últimas 72h, sem ônus à Defensoria Pública da União.
Art. 2º. Para ingresso nas unidades da Defensoria Pública da União é obrigatória a apresentação de:
- comprovante de imunização com observância do calendário estabelecido pela autoridade sanitária; ou
- atestado que comprove a impossibilidade de imunização por indicação médica e teste RT-PCR ou de antígeno negativos para COVID-19, realizados nas últimas 72h.
Parágrafo único. O caput e seus incisos não se aplicam a pessoas em situação de vulnerabilidade que impeça ou dificulte a imunização, tais como pessoas em situação de rua, catadores e catadoras de recicláveis, dentre outros.
Art. 3°. Essa resolução entra em vigor na data da sua publicação, revogadas as disposições em contrário.”
Caso tenha chegado até aqui sem ter o vídeo ainda, não deixe de conferir as falas dos defensores durante a transmissão ao vivo da reunião do CSPU.” (Com Cynthia Araujo)
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