A extinção da propaganda eleitoral paga na televisão e no rádio foi mais um dos casuísmos políticos patrocinados pelo regime militar nos anos 70. A legislação vigente até então tinha como maior mérito estabelecer um mecanismo de mercado no acesso dos partidos e candidatos aos meios de comunicação, garantindo a existência de laços mais fortes e permanentes entre os eleitores e a classe política. Aquelas propostas que, por qualquer motivo, fossem incapazes de obter patrocínio voluntário da sociedade ficavam com o seu espaço de divulgação comprometido. Assim como acontece, por exemplo, na democracia norte-americana.
Esse formato institucional era tanto mais interessante porque já convivia também, desde os anos 60, com a propaganda eleitoral gratuita dos partidos e candidatos. O “horário eleitoral” (como esse espaço é hoje conhecido) surgiu como um mecanismo para “democratizar” o acesso da classe política à televisão e ao rádio. Nesse formato, todos os candidatos têm livre acesso (em caráter rotativo) às mídias eletrônicas concessionárias do poder público (em rede nacional, estadual ou municipal), e o tempo é distribuído na proporção da votação obtida pelos seus respectivos partidos na eleição anterior.
Assim como no caso do voto obrigatório, o horário eleitoral funciona como uma conveniente reserva de mercado para a classe política. O acesso gratuito aos meios de comunicação dispensa os políticos e os partidos da necessidade de encontrar apoio financeiro na sociedade para divulgar seus programas e para promover suas campanhas eleitorais. Desobrigados de buscar o apoio financeiro de indivíduos e de empresas para comprar espaço publicitário na programação das emissoras, os candidatos e os partidos têm menos incentivos para representar os interesses reais de seus eleitores.
Nesse quase meio século de existência, a única tentativa de modernização do horário eleitoral gratuito aconteceu em meados da década de 90. Naquela ocasião, a legislação reduziu o tempo de duração dos tradicionais programas exibidos em rede obrigatória (de 60 para 45 dias, exceto aos domingos), e passou a permitir, durante o período de campanha, a exibição de inserções curtas (15 ou 30 segundos), distribuídas ao longo da programação normal das emissoras. Por terem um formato mais moderno e por não serem exibidos em rede, esses “comerciais” podem ser considerados uma mudança positiva. Mas as inovações pararam por aí.
A partir da próxima semana – e até o final do mês de setembro – o horário eleitoral gratuito passará a frequentar novamente os nossos aparelhos de TV e os rádios dos nossos carros. Para fugir dele, só recorrendo às TVs por assinatura ou à internet. Mas, na prática, isso é quase impossível. Virtualmente todos os eleitores, ainda que não o façam diariamente, assistem (no todo ou em parte) à propaganda eleitoral gratuita (aos programas em rede e/ou aos comerciais) durante as semanas de campanha.
Além disso, é preciso reconhecer que a propaganda (eleitoral e partidária) gratuita é, com toda a certeza, uma das duas ou três fontes de informação política mais importantes para a população. Além dessa função informativa, a propaganda eleitoral também é fundamental para a decisão do voto. As pesquisas mostram que parcelas significativas do eleitorado escolhem os seus candidatos nas eleições assistindo à propaganda eleitoral. Naturalmente, esse fenômeno está associado às nossas reduzidas taxas de identificação partidária.
Para o bem ou para o mal, a propaganda eleitoral (e partidária) gratuita na televisão e no rádio veio para ficar. Acho quase impossível que algum dia seja restabelecida a possibilidade de propaganda eleitoral paga nesses veículos (ainda que em caráter complementar). Mas isso não significa que os nossos legisladores não possam voltar a trilhar o caminho das inovações institucionais no setor. Por que não experimentarmos, por exemplo, uma redução adicional da duração do horário eleitoral tradicional, em favor do aumento da frequência das modernas inserções comerciais?
Ou então, assim como já se cogita fazer com a Voz do Brasil, por que não permitir que as emissoras transmitam a propaganda eleitoral obrigatória dentro de um intervalo de horário mais elástico, por exemplo entre 20 horas e meia-noite? Assim, a formação das redes (nacionais, estaduais ou municipais) também não seria mais necessária. Os eleitores que não podem recorrer à internet ou à TV por assinatura teriam, ao menos, algumas opções de programação.
Fica aí uma sugestão (gratuita) para a próxima legislatura do Congresso Nacional!
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