Duas entidades antirracistas protocolaram uma nova ação civil pública contra a rede de mercados Carrefour por conta de dois novos casos de racismo ocorridos na semana passada. A ação foi protocolada pela Educação e Cidadania de Afrodescendentes e Carentes (Educafro) e pelo Centro Santos Dias de Direitos Humanos.
Na última sexta-feira (7), o advogado negro Vinícius de Paula, marido da jogadora de vôlei Fabiana Claudino, acusou a empresa de racismo após uma atendente se recusar a atendê-lo em uma unidade do mercado em Alphaville, São Paulo. Dois dias depois, a professora Isabel Oliveira afirmou que foi perseguida por um segurança enquanto fazia compras em uma unidade do Atacadão, pertencente ao grupo, em Curitiba. Em protesto, ela ficou seminua e escreveu no corpo a pergunta “sou uma ameaça?”. As imagens do protesto viralizaram nas redes sociais.
Em 2020, as entidades processaram o Carrefour e firmaram um termo de ajustamento de conduta após o assassinato de João Alberto Freitas em uma unidade do mercado em Porto Alegre (RS). A nova ação ajuizada contra a rede destaca que o Carrefour “não implementou as necessárias mudanças em sua cultura organizacional, mantendo o racismo institucional que lhe é sabidamente ínsito”.
Segundo o advogado Márlon Reis, que representa as entidades, o termo de ajustamento não vem sendo cumprido, como apontam os novos casos de racismo. “Os casos de racismo no Grupo Carrefour, que envolve também a rede Atacadão, demonstram que o anúncio de medidas não é suficiente. É preciso alterar o DNA da empresa. Não é sobre uma crise, é sobre um modo de ser discriminatório que precisa ser debelado”, afirmou ao Congresso em Foco.
Confira a íntegra da ação:
Entenda os casos
No dia 7 de abril, Vinicius de Paula tentou usar um caixa preferencial da unidade de Aplhaville do Carrefour que estava sem clientes, mas a funcionária recusou-se a atendê-lo alegando que poderia receber uma multa. Ao se dirigir a outro caixa, Vinícius viu a mesma atendente receber uma cliente branca.
Em nota divulgada à imprensa, o Carrefour confirmou o caso e afirmou que a colaborada foi desligada do quadro da empresa. “A rede informa que a situação com o cliente aconteceu no dia 7/04, às 15h e, imediatamente, a colaboradora foi afastada pela gerência, e no mesmo dia foi desligada. Acolhemos o cliente e nos mantivemos abertos ao diálogo. Repudiamos qualquer tipo de discriminação e temos uma política de tolerância zero contra este tipo de comportamento inadequado”, afirmou o Carrefour.
Já no dia 9 de abril, Isabel Oliveira foi perseguida por um segurança enquanto fazia cobras no Atacadão Parolin, em Curitiba. Após o ocorrido, a professora retornou ao local e tirou as roupas em protesto, escrevendo no corpo a pergunta “sou uma ameaça?”.
Em nota, o Atacadão informou que “não identificou indícios de abordagem indevida” contra a cliente após ouvir funcionários e analisar as imagens das câmeras de segurança. “Lamentamos que a cliente tenha se sentido da maneira relatada, o que, evidentemente, vai totalmente contra nossos objetivos. A empresa possui uma política de tolerância zero contra qualquer tipo de comportamento discriminatório ou abordagem inadequada”, destacou.
Os casos foram comentados pelo presidente Lula (PT) em reunião ministerial sobre os 100 dias de governo nessa segunda-feira (10). “Ontem o Carrefour cometeu mais um crime. Um fiscal acompanhou uma moça negra, que ia fazer compras, achando que ela ia roubar. Ela teve que fazer compras de calcinha e sutiã para provar que não ia roubar. É a segunda vez que o Carrefour faz esse tipo de coisa”, afirmou Lula. “Queria dizer para a direção do Carrefour, que se eles quiserem fazer isso em seu país de origem, que façam, mas nesse país aqui, a gente não vai admitir o racismo e o que essa gente tenta impor ao Brasil”, completou.
Ao Congresso em Foco, o Carrefour informou estar à disposição das autoridades e das entidades que moveram a ação civil para prestar todas as informações necessárias. Sobre os casos de racismo citados no processo, a rede confirma que a colaboradora que se recusou a atender Vinicius de Paula foi desligada no mesmo dia do ato; no caso de Isabelo Oliveira, foi aberta uma apuração interna que resultou na suspensão do funcionário denunciado pela professora. “O compromisso do Grupo Carrefour Brasil na luta antirracista vai além do discurso, com a implementação de mais de 50 ações nessa frente nos últimos dois anos”, destacou o Carrefour.
Confira a íntegra do posicionamento da empresa:
“O Grupo Carrefour Brasil informa que está à disposição das autoridades e das entidades citadas para prestar todas as informações e contribuir com o que for necessário.
Em relação aos acontecimentos recentes, a empresa reafirma sua postura de tolerância zero contra qualquer tipo de racismo, e informa que agiu rapidamente com a implementação de medidas imediatas em ambas as situações. No caso do Sr. Vinicius, a colaboradora envolvida foi imediatamente afastada pela gerência e desligada no mesmo dia. E, no caso da Sra. Isabel, a companhia abriu apuração interna e suspendeu o funcionário indicado pela cliente durante o período de investigação, além de colocar as imagens das câmeras de segurança à disposição das autoridades.
O compromisso do Grupo Carrefour Brasil na luta antirracista vai além do discurso, com a implementação de mais de 50 ações nessa frente nos últimos dois anos. Essas ações incluem: o maior projeto de bolsas de graduação, mestrado e doutorado para pessoas negras; o Poder, programa de crescimento interno inédito aberto a todos os colaboradores negros; a parceria com a Universidade Zumbi dos Palmares no primeiro curso superior para agentes de segurança antirracistas, além do Programa Racismo Zero; entre outras iniciativas. Hoje, metade dos 150 mil colaboradores do Grupo são negros, e 40% da nossa liderança é formada por pessoas negras.”
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