A decisão da agência de classificação de risco Standard & Poor’s (S&P) de tirar o grau de investimento do Brasil, espécie de selo de bom pagador, mostra que o poço não tem fundo para a presidente Dilma Rousseff. Depois de resistir a um agosto que se apresentava como uma tormenta, Dilma avança setembro colhendo as tempestades que plantou na economia. A decisão de enviar ao Congresso Nacional uma inédita proposta orçamentária com déficit de R$ 30,5 bilhões, apesar da contrariedade do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, foi determinante para o rebaixamento da nota do país. E acrescentou mais um ingrediente à pressão dos oposicionistas pela saída da presidente.
A reação do governo à perda do grau de investimento deu mais munição aos oposicionistas e aumentou a desconfiança dos governistas em relação à capacidade de reação de Dilma. Da reunião marcada às pressas pela presidente com os ministros da chamada coordenação política, saiu apenas mais do mesmo: ou seja, promessa de apresentação de cortes de gastos e elevação de impostos para reequilibrar as contas públicas e atingir a meta de superávit primário (economia para pagamento de juros da dívida pública) de 0,7% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2016.
Dilma, em entrevista ao Valor PRO (serviço de informações em tempo real do Valor Econômico), minimizou o rebaixamento da nota do país, em contraste com as comemorações feitas pelo governo petista quando o país subia no ranking da confiança. “Você vai notar que de 1994 a 2015, só em sete anos, a partir de 2008, a nota foi acima de BB+. Portanto, essa classificação não significa que o Brasil esteja em uma situação que não possa cumprir suas obrigações. Pelo contrário, está pagando todos os seus contratos, como também temos uma clara estratégia econômica. Vamos retomar nesse caminho e retomar o crescimento deste país”, disse a presidente.
O ministro da Fazenda também tentou acalmar o mercado com sua fala mansa. “Uma das agências pode ter se precipitado. Quando a gente mostrar que o processo que já estava em andamento vai ter conclusão em algumas semanas, acho que talvez o afã de revisar a nota do Brasil arrefeça entre as outras agências e a própria avaliação do mercado irá se tranquilizar”, relativizou Joaquim Levy.
Depois de sucessivos rumores sobre sua saída do governo, o ministro da Fazenda sai, por contraditório que possa parecer, fortalecido de alguma maneira com a decisão da Standard & Poor’s. Afinal, Levy foi voto vencido dentro do governo nas discussões sobre o envio da proposta orçamentária. A rejeição de sua proposta, há duas semanas, foi interpretada como mais um sinal de desprestígio do ministro, que tem sido desautorizado pela presidente e questionado por outros integrantes do governo e da base aliada. Seu principal defensor e aliado tem sido o vice-presidente Michel Temer.
A decisão da agência de classificação de risco mostra que Levy tinha razão. Pior para os ministros Aloizio Mercadante (Casa Civil) e do Planejamento, Nelson Barbosa, que convenceram a presidente a empurrar para o Congresso a delicada tarefa de tapar o buraco orçamentário bilionário. Proposta que já havia causado novos atritos entre o Executivo e o Legislativo.
Economista e uma das figuras do governo mais próximas de Dilma, Mercadante é contestado pela oposição e por governistas, como o vice-presidente Michel Temer e até pelo ex-presidente Lula. Seu estilo considerado, por vezes, arrogante e autoritário tem causado turbulências no Planalto. Peemedebistas acusam o ex-senador petista de barrar indicações políticas e de dificultar o diálogo com o Congresso. Na sexta-feira (11), os jornais O Globo e Folha de S.Paulo informaram que Dilma procura um substituto para Mercadante. Só não pretende tirá-lo do governo. Deve ser remanejado para outra pasta. Encontrar alguém disposto a assumir a Casa Civil não será das tarefas mais simples. Cresce, entre os governistas, a sensação de que a oposição já esbravejava antes em seu discurso: a de que a casa caiu.
Enquanto o governo batia cabeça com o rebaixamento da nota do país, os oposicionistas, com apoio até de integrantes do PMDB, avançavam na articulação pró-impeachment, com o lançamento de um site com abaixo-assinado requerendo o impeachment da presidente Dilma Rousseff. O site www.proimpeachment.com.br está no ar desde quinta-feira (10). A iniciativa é encabeçada por deputados do PSDB, DEM, PSC, PPS e SD, e até do PMDB. Deputados ligados ao grupo acreditam que pelo menos 280 parlamentares já apoiam o afastamento da presidente. Para passar na Câmara, um eventual pedido de impeachment precisa ter o apoio de 342 deputados. Se as contas do movimento estiverem corretas, Dilma terá de redobrar suas atenções na Câmara sob o risco de descobrir que uma hora o poço chega ao fim.
* Este texto faz parte da seção Flashback, do projeto Truco no Congresso, feito pelo Congresso em Foco e a Agência Pública.
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