A decisão do presidente Jair Bolsonaro de fazer vetos ao projeto de lei do novo marco do saneamento básico provocou preocupação em especialistas ligados à área. No entanto, as empresas do setor se mostraram otimistas com a sanção das novas regras.
A nova lei obriga as empresas estatais a fazerem licitação e facilita a entrada de empresas privadas no mercado de saneamento básico. Um dos vetos que causou maior insatisfação foi no artigo 16. O chefe do Poder Executivo decidiu vetar o trecho que trata de um período de transição de 30 anos para que os contratos firmados pelas empresas estatais sejam mantidos nas regras anteriores à lei.
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O advogado Rubens Naves, especialista em saneamento e autor de um livro sobre o assunto (Água, crise e conflito em São Paulo), afirmou que o veto do presidente ao artigo 16 pode impossibilitar totalmente a atuação das empresas estatais e fazer com que os serviços não cheguem às regiões carentes.
“O veto do presidente ao artigo 16 pode impossibilitar por completo a própria continuidade de atuação das estatais que já atuam no setor e comprometer seriamente políticas públicas de investimento nas regiões mais carentes”.
Naves já era contrário ao mérito inteiro da nova lei. “O projeto já tinha inúmeras deficiências, uma vez que praticamente desconsiderava os investimentos públicos e as boas e exitosas experiências de empresas estatais sérias. Mas, em que pese tudo isso, houve diversas discussões que resultaram no texto final sem ferir de morte essas estatais que têm apresentado bons resultados”.
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Antes da lei, os contratos assinados entre os municípios e as empresas estatais de saneamento eram dispensados de licitação. A mudança aprovada pelo Congresso coloca as empresas prestadoras de serviço, tanto privadas quanto públicas, nas mesmas condições de competição.
Com o veto a esse trecho que estabelecia um período de transição, as empresas estatais passam a ter de seguir imediatamente as novas regras e contratos em andamento terão de ser revistos para que seja realizada licitação.
O presidente do Congresso, senador Davi Alcolumbre (DEM-AP), já disse que vai trabalhar para derrubar o veto. A indefinição sobre o tema vai causar uma insegurança jurídica no setor, justamente o objetivo inverso da lei.
O advogado Maurício Zockun, que trabalha com direito administrativo no escritório Zockun & Fleury Advogados, afirmou que a decisão do governo vai trazer um impacto fiscal negativo para os municípios. “Isso tende a criar uma dívida gigantesca para muitos municípios, que vão ter que indenizar as empresas que possuem contratos vigentes, mas não terão verba para isso”.
Governadores
O artigo 16, vetado por Bolsonaro, previa um período no qual os atuais contratos estatais de programa poderiam ser renovados pelas partes, por mais 30 anos, até 30 de março de 2022. O mesmo se aplicaria às situações precárias, nas quais os contratos terminaram, mas o serviço continuou a ser prestado para não prejudicar a população até uma solução definitiva.
Antes do veto, um grupo de governadores enviou uma carta ao presidente pedindo que não ele fosse feito. Eles afirmaram que a exclusão do trecho traz insegurança jurídica no setor.
“Se esse dispositivo vier a ser vetado, como se sugere em recentes movimentos corporativos e políticos, extirpando assim o processo de transição para o novo marco, teremos não apenas insegurança jurídica, passíveis de questionamentos em medidas judiciais, com o risco de conduzir à estagnação do setor, mas também a paralisação imediata de uma série de ações e projetos em andamento”.
Empresas privadas estão otimistas
A recepção é diferente nas empresas privadas ligadas ao setor. Luiz Gonzaga, presidente da Associação Brasileira de Empresas de Tratamento de Resíduos e Efluentes (Abetre), defendeu a matéria e elogiou um dos vetos feitos pelo presidente, a exclusão do artigo 20, que retirava os lixões da regulamentação do marco.
“Com o veto, os ganhos de modernidade, livre concorrência e atração de investimentos proporcionados pelo marco do saneamento passaram a incluir estes serviços, não ficando mais restritos à água e ao esgoto”, disse.
Gonzaga defende que o setor privado tenha uma participação maior na gestão de lixões. “Nosso país está vivenciado desafios dificílimos nas áreas da saúde e economia, mas não podemos esquecer que o gargalo dos lixões, que ainda existem em mais da metade dos municípios brasileiros, é um dos fatores que fazem o cidadão adoecer e o governo gastar mais com saúde. E essa conta é simples e bem justificada: segundo a ONU, a cada US$ 1 investido em tratamento correto de resíduos, temos uma economia de US$ 4 nos gastos com saúde”.
A Passarelli, que atua há 88 anos no setor de construção civil, afirmou que aproveita as mudanças feitas pela lei para ampliar a participação no setor de saneamento.
“Já estamos participando de diversas conversas e desenhando parcerias com potenciais investidores e operadores interessados em ingressar ou ampliar a presença no mercado de saneamento, diante das inúmeras possibilidades que o novo marco traz”, disse Paulo Bittar, presidente da Passarelli.
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