Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados e todo(a)s o(a)s que assistem a esta sessão ou nela trabalham: *
O senador Eduardo Suplicy (PT-SP), em pronunciamento na tribuna do Senado na semana passada, lembrou que em 2002, em reunião do Diretório Nacional do Partido dos Trabalhadores (que à época eu também integrava), defendi que todas as doações de pessoas físicas e jurídicas fossem amplamente publicizadas pelo PT. O tesoureiro Delúbio Soares foi contra: disse que isso inibiria os doadores. “Transparência demais é burrice!”, respondeu-me, com a concordância da maioria…
Hoje, é triste ver pessoas que têm um passado de luta contra as desigualdades, de resistência à ditadura, de utopia socialista na política estarem atrás das grades. Porém, infelizmente, desta vez não por subversão, mas por adaptação ao sistema vigente, como já ficara claro naquela decisão do Diretório Nacional em 2002. Quem se associa a notórias figuras da politicagem de negócios não sabe dos riscos que corre? “Passarinho que dorme com morcego acaba acordando de cabeça para baixo”, diz o dito popular, que o PT das origens não devia desconhecer… Ou será que, de tão convertidos à “realpolitik”, acreditaram na conhecida impunidade dos poderosos?
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Olívio Dutra, ex-deputado federal petista, ex-prefeito de Porto Alegre e ex-governador do Rio Grande do Sul, que prima pela correção e franqueza, lembrou que os malfeitos praticados não têm nada de transformador, de revolucionário: “Respeito a biografia passada dessas figuras que lutaram contra a ditadura, mas a sua conduta não pode se ver como correta. O que não se pode admitir é o toma-lá-dá-cá nas práticas dos mensalões de todos os partidos, nas quais figuras do PT participaram”, disse Olívio, segundo quem os condenados “não são presos políticos”.
O caso do PT que veio à tona é a “ponta do iceberg” de um problema muito maior. O correto e o justo é a conclusão dos julgamentos também de outros esquemas já denunciados: o mensalão tucano, em MG, que segundo o próprio Joaquim Barbosa é a matriz desse outro; o do DEM, no DF; as denúncias sobre propinas envolvendo a empresa Siemens e políticos importantes do PSDB e do DEM em São Paulo… São casos que envolvem banqueiros, empresários, políticos poderosos, dinheiro público e ‘apoios’ em campanhas e a governos que precisam ser condenados. Pena privativa de liberdade é sempre pesada para quem a sofre, mas é notório que há muitos outros desse mundo do poder e dos negócios que deveriam estar na mesma situação dos agora detidos, e há mais tempo…
Oitenta por cento dos que estão na vida pública nacional através de mandatos eletivos de alguma maneira, direta ou indiretamente, foram beneficiários de esquemas similares ao deste ‘mensalão’. Portanto, esse é um problema grave, mas sistêmico, estrutural, do modo de fazer política no Brasil e da nossa democracia do dinheiro e do tráfico de influências, sem fronteiras éticas e ideológicas.
Não há sequer autocrítica: há poucos dias, a Câmara e o Senado rejeitaram, com votos dos partidos governistas e da oposição conservadora, tanto um simples teto para os gastos da campanha – e com valores ainda elevados! – quanto a publicização dos doadores a cada 15 dias, nos três meses que antecedem as eleições. Novas candidaturas milionárias vencerão, novos escândalos virão.
Com relação à prisão de José Genoíno, há uma questão humanitária e de Justiça em jogo e sei, por experiência própria, que com doença cardíaca não se pode facilitar. Endosso integralmente a nota da OAB Nacional para que Genoíno – recém-operado e com constantes picos de pressão alta – seja transferido para São Paulo imediatamente, como requerem seus advogados.
Compartilho, também, da preocupação da Ordem dos Advogados do Brasil e da Associação Juízes para a Democracia sobre a regularidade da substituição do magistrado responsável pela execução das penas deste caso (Ação Penal 470). A imprensa levanta suspeitas de que o ministro Joaquim Barbosa teria feito pressão pela troca, o que seria uma violação à garantia republicana da independência do juiz. É fundamental que o presidente do Supremo Tribunal Federal e do Conselho Nacional de Justiça faça os esclarecimentos cabíveis.
Por fim, Sr. Presidente: já que se fala tanto das prisões e do sistema de execuções penais agora, vale lembrar que o Brasil tem 550 mil prisioneiros. Mais de 20% cumprindo penas diferentes daquelas pelas quais foram condenados (para pior), ou já as tendo cumprido integralmente – mas ainda assim encarcerados. E 20 mil menores de idade “apreendidos”, em internações que de “sócio-educativas” têm muito pouco. Esse modelo “medieval” – como o classificou o próprio ministro da Justiça – não reeduca ninguém, assim como o modelo político que não se quer reformar é estufa de continuada corrupção.
Agradeço a atenção
* Pronunciamento feito pelo deputado Chico Alencar na sessão da Câmara dos Deputados de 26 de novembro de 2013.
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