Heitor Scalambrini Costa*
Mesmo com um sofrível serviço elétrico prestado aos consumidores brasileiros, segundo indicadores de desempenho da própria Agencia Nacional de Energia Elétrica (Aneel), as companhias distribuidoras seguem recebendo as benesses de um capitalismo sem risco.
Nos últimos anos as empresas dependeram de repasses do Tesouro Nacional e de aumentos tarifários bem acima dos índices inflacionários, o que lhes garantiu lucros líquidos e dividendos excepcionais aos seus acionistas, quando comparados com a realidade do país. Tudo para garantir o malfadado equilíbrio econômico-financeiro das empresas – como rezam os “contratos de privatização”. Em nome deste artifício contratual, as empresas têm garantido até a possibilidade de reajustes tarifários extraordinários. E é exatamente isso, segundo a Associação Brasileira das Distribuidoras de Energia Elétrica (Abradee), que será solicitado a Aneel pelas empresas no início de 2015, justificado pela “conjuntura do setor elétrico”.
O que se verifica na pratica é que, mesmo com a qualidade dos serviços prestados se deteriorando, os reajustes nas tarifas aumentam seus valores abusivos, beneficiando empresas ineficientes que deveriam ser cobradas e punidas, e não premiadas.
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Mas a tragédia que se abate sobre o consumidor de energia elétrica não acaba ai. A partir de janeiro, haverá uma cobrança adicional nas tarifas, com a implantação das bandeiras tarifárias. Então, além dos reajustes tarifários anuais ordinários (na data da privatização das empresas), cujas estimativas para 2015 apontam percentuais que podem chegar a ser de três a cinco vezes superiores à inflação, e da possibilidade de um reajuste extraordinário, se somarão os acréscimos das bandeiras tarifárias.
Este mecanismo indicará como está a situação do parque gerador de energia elétrica do país, utilizando as cores verde, amarela e vermelha. A bandeira verde indicará condições favoráveis de geração, e a tarifa não sofrerá nenhum acréscimo. A bandeira amarela indicará que as condições de geração são menos favoráveis, e a tarifa sofrerá acréscimo de R$ 1,50 para cada 100 quilowatt-hora (kWh) consumidos. A bandeira vermelha indicará as condições mais custosas de geração (uso das usinas térmicas), e a tarifa sofrerá acréscimo de R$ 3 para cada 100 kWh consumidos. A Aneel divulgará mês a mês as bandeiras que estarão em vigor em cada um dos subsistemas que compõem o Sistema Interligado Nacional (SIN).
Segundo a Empresa de Pesquisa Energética (EPE), o consumo médio brasileiro é de 163 kWh/ residência, e a tarifa média para o consumidor residencial é de R$ 400,00/ MWh. Assim, uma conta de R$ 65,20 na bandeira verde subiria para R$ 67,65, ao passar para a bandeira amarela; e para R$ 70,09, no caso da bandeira vermelha. Nestes cálculos não estão sendo levados em conta os encargos e impostos incidentes na tarifa elétrica.
Os valores parecem pouco significativos individualmente, mas considerando que existem 75,2 milhões de unidades consumidoras (sob o regime de bandeiras tarifárias) no país, em um mês de bandeira vermelha, haverá para os cofres das empresas, segundo cálculos da própria Aneel, o recolhimento de R$ 800 milhões a mais em todo o Brasil, e de R$ 400 milhões em um mês de bandeira amarela. Em 2014, considerando o sistema de bandeiras tarifárias, a bandeira amarela seria acionada apenas no mês de janeiro, e no restante do ano teria vigorado a bandeira vermelha para todos os subsistemas.
O mecanismo das bandeiras tarifárias funcionará efetivamente para arrecadar e aumentar o caixa das distribuidoras. Diferente do que alegam os promotores desta proposta que dizem que o sistema teria por objetivo estimular o consumo consciente. Ou seja, levar o consumidor a reduzir o consumo quando o custo do kWh for maior.
As bandeiras tarifárias estavam previstas para entrar em vigor em janeiro de 2014, mas foi postergada para janeiro de 2015. Mesmo após 12 meses de adiamento, nada foi feito para tornar esta proposta mais conhecida pela população, e mesmo discutida pela sociedade.
Sabendo-se que o setor elétrico tem como ingredientes um modelo mercantil, uma privatização “sem riscos”, dirigentes incompetentes, decisões autoritárias e antidemocráticas, além da notória falta de transparência – o resultado no bolso do consumidor não poderia ser diferente.
*Heitor Scalambrini Costa é professor da Universidade Federal de Pernambuco
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