Márcia Denser
Pegando carona na coluna do Cláudio Versiani ("O Brasil sumiu") e porque também andei viajando pelos brasis, semana que antecedeu as eleições, de segunda a domingo, entre Ribeirão Preto e Cuiabá, subindo e descendo de aviões e começam por aí a covardia, a caretice, a plastificação, a pasmaceira, a inééééééééééééééércia sem limites do brasileiro médio nos dias atuais. A perda total de capacidade de indignar-se, lutar por seus direitos, que sejam mínimos, mas é aí que o bicho começa a pegar
Para Ribeirão Preto fui de TAM, ainda infinitamente melhor e preferível à Gol, a despeito de TODOS os defeitos: atrasos, mudanças de portão de embarque etc. Mas, explico. Desde o check-in fui tratada com toda cortesia, toda mesmo, de acordo com minhas exigências habituais: ir atrás, na cauda, nas últimas poltronas. E sozinha. Por favor. Não é pedir muito. Todo o resto é tolerável.
Contudo, as vantagens não param aí: na TAM, por exemplo, permitem, até encorajam, com as bajulações de praxe e respectivo serviço de bordo, que se beba o próprio uísque/vodca/seilá daquelas garrafinhas adquiridas nas duty-frees dos aeroportos. Sabe Deus que qualquer um tem o direito de estar estressado, paranóico, com dor-de-cotovelo, cansado, com medo, querendo relaxar, não querer beber suco/cerveja/guaraná/fanta/ocaralho, inclusive porque NÃO É PERMITIDO FUMAR seja onde for, de forma nenhuma, então, please, um uisquinho ao menos. Pra garantir minimamente meus direitos humanos.
E permitam que lhes diga. Como escritora, ainda escrevo à mão lá em cima. Trabalho duro, duríssimo, não fico enrolando no laptop, fingindo que escrevo, fingindo que trabalho, que vivo ligada na web, onde naturalmente vi muito neguinho jogando pa-ci-ên-cia ele-trô-ni-ca. Duma pobreza abissal esses emergentes de lugar nenhum.
Aliás, em razão de preço e outras cositas más, o vôo da TAM nem vai nem volta lotado. Mesmo assim, talvez para compensar os atrasos, botam escadas de desembarque também na traseira do avião. Embarque e desembarque rapidinho, com toda a cortesia e ninguém te constrangendo a limpar nada na saída. Sim, a TAM, mil vezes. Essa companhia ainda é HUMANA, lembra a falecida Varig, que até ano passado, Bienal do Livro/2005, servia saladinha de frango e vinho branco na ponte aérea SP-Rio, sacumé? Então para Cuiabá não teve perhaps: ir Gol ou não ir. Fui. E ainda bem que voltei com o escritor Nelsinho de Oliveira, companheiro de viagem e de cruz aérea.
Parece que na Gol estão te fazendo um IMENSO FAVOR de te carregar pelo espaço desde que concorde com tudo, seja completamente passivo e PERMANEÇA quietinho ao ser amordaçado, amarrado e constrangido, como se a gente devesse ficar de castigo da vida quando em viagem e que isso fosse o NORMAL doravante, que futuramente, fora do castigo, não há salvação nem qualquer outra empresa aérea. Não pode isso, não pode aquilo, impossível… é o que mais se ouve, parece gravação: não é possível, impossível.
Pudera. Vôos lotadíssimos, que deviam ser proibidos por lei (em caso de acidente, não ia sobrar ninguém, a demografia a bordo não te daria nenhuma chance). Porque o avião vai arrebentando de gente & bagagens de mão. Trilhões passageiros, homens, mulheres, velhos, crianças de colo, milhões, milhares de sacos, sacolas, bags, bolsas, caixas, caixotes, o diabo. Fora o check-in. Queria ir atrás? Impossível, os lugares estão ocupados. Sozinha? IMPOSSIVEL, ESTAMOS LOTADOS. No corredor? Vamos verificar. Se você ficar boazinha, claro. Calminha.
Sem contar o atentado contra os direitos humanos: dois anos atrás, voltando desavisadamente pela Gol da feira de livros de Belzonte, fui PROIBIDA de beber meu próprio uísque (garrafinha supra referida) a bordo. Meus direitos. Alegaram serem proibidas bebidas alcólicas no avião. Por quê? A Gol pertence à Igreja Universal? Aos mórmons?, ironizei. Desde então, faço uma única ressalva aos patrocinadores de todas as minhas viagens: prefiro não viajar pela Gol, por favor.
No desembarque, please, a proposta indecente para que se limpe o avião, naturalmente para ELES economizarem empregos e tempo na limpeza entre vôos, a fim de cumprir o binômio contraditório nos termos: lotação máxima & pontualidade. Vão se danar! Ladies and gentlemens, fasten your seat belt, vamos contribuir para tornar a Gol, a opção inteligentíssima para os bolsos dos donos da Gol, a maior – e brevemente, a única – companhia aérea do Brasil, e estamos conversados.
Empresas como a Gol dão certo porque quando o econômico "coloniza" a empresa aérea, ele "lobotomiza" o consumidor, que aí vira passageiro da agonia, lembrando Lúcio Flávio, um pré-PCC anos 70.
(E para você, brasileiro/cidadão/consumidor/passageiro/eleitor, que não vai à luta, o pesadelo continua…)
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