Luciano Borges*
A sociedade brasileira e as instituições públicas demonstraram, nos últimos anos, constante preocupação em aproximar a Justiça brasileira da população.
E é justamente sobre algumas dessas iniciativas que gostaria de tecer considerações e sugestões.
O sistema carcerário padece de diversas mazelas e algumas medidas simples, do ponto de vista jurídico ou legislativo, permitiriam um melhor equacionamento das vagas hoje existentes.
A população carcerária ultrapassa 473.000 presos e o sistema conta com déficit de mais de 194.000 vagas.
Uma das diversas causas da superpopulação nos presídios é o fato de que os presos não têm defesa.
Ciente desse quadro, em agosto de 2009, foi criada a Força Nacional da Defensoria Pública em execução penal, por meio de termo de cooperação entre Ministério da Justiça, Defensoria Pública da União e Defensoria Pública dos Estados, com o escopo de levar assistência jurídica aos presos e familiares.
Em outras palavras, o objetivo da Força, que já atuou em vários Estados da Federação, é levar o trabalho do defensor público ao preso que já cumpriu pena ou foi condenado a um regime menos severo, mas que continua encarcerado e contribuindo para o problema da ausência de vagas.
A Força Nacional, portanto, volta-se para garantir uma política pública de acesso a direitos aos detentos.
Ainda no que toca o sistema carcerário, mas agora no âmbito de atuação da sociedade civil, a Pastoral Carcerária, em conjunto com a Associação Nacional dos Defensores Públicos Federais – Anadef, relata que, apenas no estado de São Paulo, maior população carcerária do Brasil, com aproximadamente 164 mil pessoas, existem cerca de 7.000 (sete mil) pessoas no regime fechado, com direito ao regime semiaberto. Quer dizer, estão ocupando vagas em penitenciárias, quando, na verdade, deveriam estar em colônia penal agrícola.
Em visita à penitenciária Nilton Silva, em Franco da Rocha/SP, voltada para receber presos em regime fechado, Pastoral e Anadef constataram, no mês de outubro de 2010, que, dos 1.413 presos, 587 encontravam-se em situação irregular, pois tinham direito assegurado ao regime semiaberto, mas lá ainda estavam custodiados.
Resta muito claro, portanto, que milhares de presos, apesar de terem direito a cumprir pena em regime mais brando, seja por assim mandar o édito condenatório, seja porque assim deferiu o Juízo das Execuções (pedido de progressão ao regime semiaberto), por uma inoperância do próprio Poder Público, acabam sendo responsabilizados pela culpa do Estado.
A Defensoria Pública da União tem inúmeros habeas corpus protocolados em favor de assistidos, junto ao Supremo Tribunal Federal, com provimentos favoráveis no sentido de responsabilizar o Estado pela ausência de vagas no semiaberto, determinando o encaminhamento do preso ao aberto, até a abertura de vagas no regime apropriado.
Apesar do entendimento do Supremo Tribunal Federal, muitos Tribunais pelo país ainda insistem em atribuir a responsabilidade pela ausência de vagas no semiaberto ao próprio condenado.
O que causa perplexidade é que uma questão decidida pelo STF, a Corte mais alta do país, o tribunal que dá a última palavra, receba decisão diferente, em causas idênticas, nos tribunais e juízos inferiores, obrigando o condenado a interpor recursos, percorrendo um caminho difícil, penoso, demorado, para, depois de anos e anos, chegar ao Supremo, a fim de obter a reforma daquela decisão.
Nessa linha, Anadef e Coordenação Nacional da Pastoral Carcerária, com o escopo de ver assegurado em todos os Tribunais do país o entendimento do STF, apresentaram minuta, em maio de 2010, de súmula vinculante, à Defensoria Pública da União.
Caso a proposta chegue ao STF, que tem inúmeros precedentes favoráveis à tese levantada, estaríamos contribuindo para diminuir o inchaço no sistema, sem a necessidade de construir novos presídios.
Apenas no Distrito Federal quase três mil presidiários extrapolam a capacidade das cadeias. Estima-se, segundo dados da Secretaria de Segurança do DF, que para viabilizar a criação de uma nova cadeia, com capacidade para 1,5 mil presos, a obra custaria R$ 70 milhões e levaria ainda três anos para ficar pronta.
Conjugando essas propostas com programas de reinserção social, estaríamos, também, trabalhando para a melhoria da relação dos apenados com a sociedade.
*Luciano Borges dos Santos é presidente da Associação Nacional dos Defensores Públicos Federais – Anadef
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