Antonio Vital
|
O anúncio de um corte de R$ 15,9 bilhões no orçamento de 2005 não provocou a revolta que o governo esperava no Congresso. Contribuiu para isso a falsa crise da declaração desastrada de Lula a respeito do suposto caso de corrupção no governo Fernando Henrique. Mas também foi determinante para esse desfecho o fato, admitido até pela oposição, de que o orçamento aprovado pelo Congresso para este ano é uma peça de ficção. Dos R$ 15,9 bilhões que o governo “cortou” do orçamento, R$ 10,9 bilhões, na verdade, não passaram de uma redução da expectativa de receita. Ou seja, era dinheiro que não existia de verdade. Foi colocado lá para que os parlamentares fizessem de conta que estavam entregando ao governo uma proposta viável. Não estavam. Guardadas as proporções, é a mesma coisa que alguém planejar seus gastos mensais contando com um improvável aumento salarial ou a sorte grande da Mega-Sena. Publicidade
À primeira vista, esse surto fantasioso do Congresso tornaria mais difícil até mesmo se pensar em adotar o orçamento impositivo, modalidade que obrigaria o Palácio do Planalto a seguir o que estiver determinado na lei orçamentária. Afinal, como gastar qualquer coisa em algo que não tem cobertura financeira? Publicidade
Paradoxalmente, a imposição pode vir a ser a solução do problema, já que a alocação de recursos compulsória faria com que a elaboração da lei fosse encarada com mais seriedade na Câmara e no Senado. Poderia, pelo menos em tese, acabar com o deprimente espetáculo anual de aprovação da peça orçamentária sem discussão e a toque de caixa. PublicidadeMas, como o governo não quer nem ouvir falar disso, os diversos projetos em tramitação que tratam do assunto devem ficar esquecidos nos escaninhos empoeirados do Congresso. A menos, é claro, que outra tsunami desabe sobre o Palácio do Planalto. E a crise das declarações de Lula não parece ter força suficiente para isso. A oposição está no seu papel ao ir ao Supremo e tentar processar o presidente por crime de responsabilidade por, supostamente, ter calado sobre corrupção no governo do antecessor. Só que não há clima para decisões extremadas no Congresso, principalmente às vésperas de uma reforma ministerial que promete acomodar as novas correlações de força na Câmara e no Senado. O mais é barulho. Exemplo disso é a tentativa de se criar uma CPI para investigar as privatizações da era FHC, onde, segundo Lula, residiria a corrupção tucana. Há muito as CPIs deixaram de ser instrumentos eficientes de investigação e até mesmo de pressão política. O fiasco da CPI do Banestado é apenas o exemplo mais recente. E há outros piores ainda, como a CPI dos Combustíveis e seu rastro de suspeitas de achaques e acobertamentos. Na Câmara, existem 26 CPIs na fila para serem criadas. O negócio se banalizou a tal ponto que, agora, os deputados e senadores desistiram de protocolar pedidos de criação de comissões de inquérito com base apenas em assinaturas dos colegas. Eles preferem fazer isso por meio de projetos de resolução, que têm que passar por comissões e pelo plenário até serem aprovadas, procedimento que pode durar um ano ou mais. E, daqui um ano, quem vai se lembrar dessa específica incontinência verbal do presidente? |
Deixe um comentário