Antonio Vital*
No meio da briga do Ministério da Educação (MEC) com o sistema S, surge uma idéia: por que não usar recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) para incrementar o ensino técnico-profissional de entidades como o Sesc, o Senac, o Senai e outras? A proposta foi lançada na noite de terça-feira (8) no programa Expressão Nacional, da TV Câmara. O programa debatia a proposta do governo de mudar a destinação de parte dos R$ 8 bilhões repassados anualmente ao sistema gerido pelos empresários, uma maneira de aumentar a oferta de cursos profissionalizantes e torná-los gratuitos.
Participaram do debate Luiz Gil Siuffo, vice-presidente da Confederação Nacional do Comércio (CNC); o deputado Alex Canziani (PTB-PR), coordenador da Frente Parlamentar da Educação Profissional; Getúlio Marques Ferreira, secretário de Educação Profissional e Tecnológica do MEC; e o deputado Gerson Peres (PP-PA), diretor do Senai (Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial).
As salas de aula do Senai já deram ao país um presidente da República, Lula, que mais de uma vez externou publicamente seu reconhecimento pela entidade onde se formou torneiro mecânico. Mas a memória afetiva do presidente não foi determinante a ponto de impedir o ministro da Educação, Fernando Haddad, de comprar uma grande briga ao propor mudanças no sistema.
Para o ministério, não há transparência na destinação dos recursos, provenientes de um desconto de 2,5% na folha de pagamento das empresas. Na avaliação da equipe de Haddad, também não há critérios para o atendimento, cursos de pouca duração não têm impacto na vida do trabalhador e, sobretudo, não há gratuidade universal no sistema, o que elitiza o público.
O MEC propõe aumentar os recursos destinados à formação de mão-de-obra na forma de um fundo, o Fundo Nacional de Formação Técnica e Profissional (Funtep), que seria gerido pelo governo, empresários e trabalhadores – no que ganhou a adesão imediata da Força Sindical.
Os cursos seriam gratuitos e destinados a estudantes de escola pública ou àqueles que freqüentaram colégio particular na condição de bolsista integral. E a distribuição dos recursos pelas dezenas de unidades regionais do sistema S seria feita de acordo com o número de vagas gratuitas oferecidas nos cursos e com a população economicamente ativa do estado.
No debate, ao vivo, Peres e Siuffo, representantes do Sistema S, bombardearam o diagnóstico e a solução propostas pelo MEC. "Não há falta de transparência na aplicação dos recursos. Tudo é auditado pelo TCU", disse Peres. "Só não há gratuidade total porque a demanda por cursos é maior do que os recursos existentes", explicou Siuffo.
Getúlio Ferreira, representante de Hadadd na mesa, defendeu a posição do MEC. Ele questionou a eficácia dos cursos de curta duração na formação do trabalhador e criticou a falta de gratuidade oferecida pelo Sistema S. Mas coube a Canziani sugerir o uso dos recursos do FAT. "O dinheiro do FAT tem que ir para este fundo proposto pelo MEC", disse.
O FAT, criado em 1990, é um fundo vinculado ao Ministério do Trabalho e Emprego. Ele é usado para o financiamento de programas de desenvolvimento econômico do BNDES, custeio dos programas de seguro-desemprego e de abono salarial, aplicações financeiras e, finalmente, em programas de apoio aos trabalhadores. E as quantias envolvidas são muitas vezes maiores que todo o dinheiro empregado no Sistema S. São quase R$ 100 bilhões por ano. Mas, em 2008, o orçamento destinado à promoção de cursos, oficinas e coisa do gênero não vai ultrapassar R$ 1 bilhão – mais de dez vezes mais que o orçamento de 2007.
Siuffo, vice-presidente da CNC, apóia a destinação dos recursos do FAT para o Sistema S. Ele já foi presidente do Conselho Deliberativo do fundo (Codefat). Mas Ferreira, do MEC, não ficou entusiasmado. "Os recursos do FAT são bem-vindos, mas são de outra fonte", disse.
O debate demonstrou que não será fácil a tarefa de Fernando Haddad de modificar a estrutura e a gestão de uma máquina que funciona há 60 anos e tem defensores ferrenhos no Congresso. Mesmo com a disposição de membros do governo, explicitada na ocasião da derrota da CPMF no Senado, de restringir a autonomia da gestão dos empresários, apontados como responsáveis pelo fim da contribuição – em especial uma certa entidade localizada na avenida Paulista, em São Paulo. O ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, chegou a insinuar, no Senado, que os recursos do sistema S foram empregados na suntuosa sede da Fiesp.
A falta de consenso sobre o Sistema S não esconde, porém, as deficiências da formação de mão-de-obra hoje no Brasil. Companhias como a Vale do Rio Doce chegam ao ponto de buscar trabalhadores qualificados no exterior. Segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), 9,1 milhões de trabalhadores procuraram emprego em 2007. Destes, 1,7 milhão tinha qualificação profissional. Os demais 7,4 milhões, não.
O programa sobre as mudanças no Sistema S será reprisado sexta (11), às 4h e às 11h30; sábado (12), às 12h; domingo (13), às 9h30; e segunda (14), às 6h e às 10h.
Na próxima terça-feira (15), às 22h, o Expressão Nacional vai debater ao vivo a questão indígena hoje no país – as mortes de índios por desnutrição, a ameaça cultural e os conflitos agrários, como na reserva de Raposa Terra do Sol (RR). Sugestões e perguntas podem ser enviadas pelo email expressaonacional@camara.gov.br ou pelo telefone gratuito 0800-619619.
*Antonio Vital é apresentador do programa Expressão Nacional.
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