Augusto Carvalho* |
Em 1776, o economista e filósofo escocês Adam Smith observou que “não existe arte que um governo aprenda de outro com maior rapidez do que a de extrair dinheiro do bolso da população”. Infelizmente, essa constatação permanece viva e atual. A derrubada da MP 232, entretanto – fruto de levante da sociedade contra essa nova e infeliz proposta de “derrama” de tributos sobre o contribuinte brasileiro – demonstrou que está exaurida a prática habitual dos governantes brasileiros de aumentar sistematicamente a carga tributária para compensar o permanente e indesejável crescimento dos gastos públicos. Paralelamente, cresce a curiosidade da sociedade brasileira em saber onde estão sendo efetivamente aplicados os recursos arrecadados pela União, através das dezenas de impostos, taxas e contribuições que nós cidadãos pagamos. Cresce o interesse em saber por que a carga tributária tão elevada não se reverte em serviços públicos de boa qualidade. Com o Sistema Integrado de Administração Financeira, da Secretaria do Tesouro Nacional (SIAFI), temos – o deputado federal Roberto Freire (PPS-PE) e eu – procurado disponibilizar para todos os que nos procuram informações sobre a evolução dos dispêndios públicos. De fato, nos últimos vinte anos (1984-2004), as despesas do Executivo, Legislativo e Judiciário cresceram acentuadamente. Os juros e encargos da dívida pública elevaram-se, nesse período, a uma taxa média real de 16,4% ao ano. Os benefícios previdenciários cresceram em termos reais, no mesmo intervalo, 14,3 % ao ano, enquanto as despesas com pessoal e encargos foram majoradas em 11,3% ao ano. Esses crescimentos reais superaram, em muito, o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB). Simultaneamente, como forma de tentar equilibrar receitas e despesas, o governo federal aumentou a carga tributária de 25% do PIB, em 1980, para aproximadamente 36% do PIB, em 2004. Os sucessivos recordes de arrecadação, contudo, não estão trazendo benefícios diretos à economia brasileira. A derrocada, gritante, dos investimentos federais é sem dúvida um dos pontos centrais do drama econômico brasileiro. Em nome do ajuste fiscal, foram sendo reduzidos ao longo das últimas décadas os investimentos em áreas vitais, como, por exemplo, em energia e transportes, o que nos levou aos apagões e ao deplorável estado das rodovias brasileiras. Melhor seria termos buscado o ajuste fiscal através do combate à sonegação, da recuperação de créditos da Dívida Ativa da União, da contenção dos gastos burocráticos, da melhor utilização do Patrimônio da União, entre outras muitas medidas possíveis e não adotadas. Em nome de vultosos superávits primários, agradamos ao “mercado” – de quem o país é dependente – mas deixamos de realizar importantes ações sociais. Diante desse cenário, tenho permanentemente criticado a qualidade e a prioridade dos gastos públicos, valendo-me, sempre, dos dados oficiais do SIAFI. Através de exemplos até anedóticos, tenho procurado contribuir para popularizar o debate sobre gastos governamentais, transportando o tema dos cadernos de economia para as manchetes dos principais jornais brasileiros. Em 2004, por exemplo, denunciei que a primeira prestação paga do AeroLula (o novo avião presidencial) representava, na ocasião, 75% dos investimentos consumados da União com o orçamento do exercício. Vale ressaltar que considero essa aquisição absolutamente desnecessária diante da escassez dos recursos orçamentários e financeiros. Denunciei, também, o pífio andamento do programa “Primeiro Emprego”, anunciado com pompa pelo governo federal em 2003. Em março de 2004, apenas um empregador (APSL – Bar e Restaurante LTDA), localizado em Salvado, tinha recebido R$ 200,00 a título do estímulo oferecido para a contratação de jovens que estão ingressando no mercado de trabalho. Ao final de 2004, apenas 20,3% dos gastos com o programa tinham sido efetivamente pagos. Também em 2004 constatei no SIAFI e denunciei ao Tribunal de Contas da União (TCU) o crescimento vertiginoso dos gastos com o Cartão de Crédito Corporativo. O cartão mudou de nome e se chama hoje Cartão de Pagamento do Governo Federal, mas as práticas nocivas continuam a ocorrer. Em 2005, no primeiro trimestre, 58,2% dos gastos com o referido cartão foram realizados mediante saques de recursos, procedimento condenado pelo TCU, e só admitido em condições excepcionais. Da mesma forma, não se pode admitir que esses gastos deixem de ser claramente identificados no SIAFI, passando a constituir uma nova “conta secreta”, no valor anual de aproximadamente R$ 17 milhões, o que afronta a transparência dos gastos públicos. Alertei, ainda, sobre o crescimento de inúmeras despesas passíveis de contenção como passagens aéreas, diárias, veículos, auxílio moradia, etc. Em contrapartida, tenho informado à sociedade sobre a limitada execução de alguns programas como “Paz no Campo”, “Prevenção e Preparação para Emergências e Desastres”, “Melhoria Habitacional para o Controle da Doença de Chagas”, entre outros, ações que, se realizadas, teriam minimizado o sofrimento de milhares de brasileiros. Estou certo de que os eleitores do governo Lula, que pretendemos seja popular e democrático, não se conformam que o valor investido pela União nos últimos 24 meses do governo FHC seja superior – mesmo em valores correntes – ao investido nos 27 meses do governo Lula. Não é o que desejávamos. Tenho acompanhado minuciosamente as execuções dos Orçamentos da União, pois considero que fiscalizar o Executivo é uma das principais atribuições do Parlamento, prerrogativa da qual não abro mão, participe ou não o meu partido (PPS) do governo. Ao contrário, estarei sempre à disposição de qualquer interessado para informar sobre qualquer gasto público, seja do governo do Distrito Federal, seja da União. A sociedade tem o direito de saber como são utilizados os recursos dos impostos, taxas e contribuições que pagamos. É um direito intrínseco da democracia e da cidadania. *Augusto Carvalho é deputado distrital pelo PPS Os textos para esta seção devem ser enviados, com no máximo 4.000 caracteres e a identificação do autor (profissão e formação acadêmica), para congressoemfoco@congressoemfoco.com.br |
Deixe um comentário