Oswaldo Martins Rizzo*
“Mais ruinoso do que assaltar um banco é fundar um banco”. (Wladimir Lênin).
Preocupado com o futuro, o mundo assiste ao desenrolar de outra das inerentes crises do capitalismo contemporâneo de hegemonia bancária, um regime econômico insustentável por natureza baseado nos descontínuos e fugazes ciclos de crédito sempre abortados pela inevitável alta da inadimplência. Corretoras de títulos mobiliários estão oferecendo até ajuda de psicólogos aos incautos aplicadores sucumbentes dos voláteis movimentos dos pregões das bolsas de valores.
Iniciado há quase três anos, e recusando-se a findar, este mais recente desaprumo financista conseguiu até introduzir no cerne da nação mais rica do mundo atividades econômicas marginais como a “garimpagem urbana”, até então só observadas em países considerados pobres. Nos bairros das outroras prósperas periferias das metrópoles dos EUA – Detroit, por exemplo – o desemprego aumentou a criminalidade que alastrou os furtos de canos de cobre (e de outros metais) das instalações hidráulicas residenciais para a comercialização no mercado negro.
Demonstrando um incontido sentimento de ódio, a sociedade norte-americana identificou o culpado por tê-la lançado no atual calvário: o banqueiro, esse ser engravatado; branco e de fala mansa que se tornou a figura mais impopular do momento. O líder em audiência entre os programas humorísticos da televisão ianque, “Saturday Night Live”, semanalmente tem achincalhado os bancos, e artigo publicado na popular revista “Rolling Stone” assemelhou a atividade bancária à de um monstruoso vampiro sugador insaciável do sangue da humanidade.
Essa situação não me afeta, dirá o desmemoriado cidadão brasileiro entorpecido pelo alienante noticiário oficial divulgando que tudo vai bem nesta “Terra Descoberta por Cabral” e, segundo declarações das plantonistas autoridades econômicas na imprensa especializada, a economia nacional foi pouco afetada pela crise internacional (apesar do crescimento nulo em 2009), estando o saudável sistema bancário regularmente cumprindo seu papel no desenvolvimento social.
Isso merece credibilidade?
Entre setembro de 2008 e janeiro de 2009, justificando a necessidade de debelar uma crise bancária de proporções siderais, o governo federal (através do Banco do Brasil) assumiu o papel de emprestador de última instância transferindo, açodadamente, recursos públicos de bilhões de reais para salvar vários bancos privados à beira da falência, cujas solvências foram seriamente ameaçadas pelos saques de correntistas que, desconfiados, corriam aos seus caixas temendo serem caloteados. Esta quase ruína do setor bancário nacional só foi divulgada, sem alarde, pela mesma imprensa especializada cerca de um ano após ter ocorrido. Confirmada por um diretor do Banco Central da época, a revelação da iliquidez da banca precipitou a sua exoneração do cargo.
Em meados do século passado, um ganhador do Premio Nobel de economia – o austríaco Friedrich August Von Hayek – explicou este tipo de atuação governamental quando escreveu: “A democracia se tornou propriedade dos interesses particulares (…) a distribuição de benesses favorece grupos isolados, enquanto os custos são repartidos pelo conjunto dos contribuintes. Esta assimetria entre beneficiados visíveis e custos invisíveis cria a engrenagem que leva os governos a gastarem sempre mais para preservarem a maioria política”.
Todavia, o auxilio prestado pelo governo federal aos banqueiros para livrá-los da bancarrota não está limitado à injeção de dinheiro. A Procuradoria Geral da União (PGU) ingressou na demanda judicial reivindicadora do pagamento pelos bancos da diferença do rendimento das cadernetas de poupanças decorrentes dos fracassados planos econômicos de gestões passadas.
Em apertada síntese, o frágil argumento dos banqueiros para calotear os poupadores tenta demonstrar a tese da invalidade do direito adquirido para os contratos das cadernetas, e que honrar a obrigação avençada aumentará o risco de falências no setor. Noutras palavras: se tiverem que pagar aquilo que legalmente devem, quebrarão, o que justifica dar o calote nos poupadores.
Semelhante alegação foi usada pela equipe econômica do governo FHC para justificar o socorro aos bancos pelo programa Proer. De acordo com o professor da PUC, Samuel Kilszlajn, pela quantidade de variáveis econômicas envolvidas era impossível saber se os bancos realmente quebrariam ao não receberem a ajuda governamental.
*Osvaldo Martins Rizzo é engenheiro e ex-conselheiro do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES)
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