Num momento em que a mídia hegemônica brasileira, como sempre fazendo coro
com a norte-americana (vide que, mesmo em lados opostos, Judith de Brito do
Grupo Folha replica mesquinhamente Annita Dunn, porta-voz da Casa Branca, a
primeira a definir a Fox News como partido político, não como corporação de
imprensa), se declara francamente na “oposição” do governo Lula, a favor da
candidatura Serra e das forças conservadores e ultra-autoritárias que esta
representa, o artigo** de Paul Craig Roberts, economista e jornalista
norte-americano, autor de How the Economy Was Lost é dos mais
significativos. Por quê?
Comprova que não há limite para até onde se
pode engrupir o distinto público quando se trata de retomar o poder – lá,
perdido há dois anos, aqui, há oito. Afinal a guerra deles – das corporações,
dos banqueiros, dos donos de terras, dos neocons e fundamentalistas de quatro
costados – é rigorosamente civil – uma guerra contra os civis, isso
mesmo: a população toda!
Aliás, considere-se a recusa sistemática de
Serra em negociar com grevistas (professores, policiais, etc.) como um modus
operandi inspirado nas políticas e práticas neoconservadores do tipo hidrófobo
texano-americano (“não negociamos e nem damos satisfações, porra!”).
No
artigo referido, Craig observa que houve um tempo em que as pessoas acreditavam
na verdade e encaravam-na como uma força independente e não como um auxiliar de
classe, raça, ideologia, interesse pessoal ou financeiro. Hoje os americanos são
dominados pela propaganda. Os americanos têm pouco respeito pela verdade, pouco
acesso a ela e pouca capacidade para reconhecê-la. A verdade é uma entidade
importuna. É perturbadora. Aqueles que a exprimem correm o risco de serem
marcados como “anti-americanos”, “anti-semitas” ou “teóricos da conspiração”.
Ele diz: “A verdade é uma inconveniência para os grupos de interesse cujas
contribuições de campanha controlam o governo. A verdade é uma inconveniência
para promotores públicos que querem condenações, não a descoberta da inocência
ou da culpa. A verdade é inconveniente para ideólogos”.
Por toda parte, a
verdade sucumbiu ao dinheiro. Sempre que este é insuficiente para enterrar a
verdade, a ignorância, a propaganda e a memória curta terminam o serviço.
O autor comenta: “Lembro quando, após o testemunho do diretor da CIA,
William Colby, perante o Comite Church, em meados da década de 1970, o
presidente Gerald Ford expediu ordens que impediam a CIA de assassinar líderes
estrangeiros (se foram cumpridas, é outra história…). Em 2010, o Congresso dos
EUA foi informado por Dennis Blair, responsável pelo DNI (Direção Nacional de
Inteligência, órgão criado após o 11/9 para coordenar o conjunto de agências de
espionagem, incluindo a CIA) que agora os EUA não só assassinam líderes
estrangeiros, como seus próprios cidadãos.”
“Quando Blair disse ao Comitê
de Inteligência da Câmara que cidadãos dos EUA não precisam mais ser presos,
acusados, processados e condenados por um crime capital, mas assassinados só
pela suspeita de constituírem ‘ameaça’, não foi demitido. Nenhuma investigação
se seguiu, nada aconteceu. Nos anos 70, a CIA complicou-se por tramar a morte de
Fidel Castro, hoje são os cidadãos americanos que estão na lista de “inimigos a
serem eliminados”.
“Hoje os economistas americanos não têm consciência
de que a economia dos Estados Unidos foi destruída devido ao deslocamento do PIB
dos EUA para o exterior. As corporações dos EUA, na busca da vantagem absoluta,
do custo mais baixo do trabalho e bônus máximo de desempenho dos seus
presidentes, transferiram a produção de bens e serviços vendidos a americanos
para a China, Índia e outros países. Quando vejo economistas definirem
‘deslocamento do PIB’ como ‘livre comércio baseado em vantagens comparativas’,
percebo que não há mais inteligência ou integridade entre estes profissionais.”
A inteligência e a integridade foram compradas pelo dinheiro. As
corporações transnacionais ou globais dos EUA pagam milhões de dólares a
administradores de ponta, a título de “prêmios de desempenho”, exclusivamente
para substituírem trabalho americano por trabalho estrangeiro. Enquanto
Washington se preocupa com a “ameaça muçulmana”, os engodos de Wall Street, das
corporações e do “mercado livre” destroem a economia e as perspectivas de
milhões de americanos.
Aliás, os americanos engoliram a afirmação do
governo (Bush I e II) de que segurança exige suspensão de liberdades civis e
administração responsável (grifo meu). Espantosamente, os americanos
acreditam que liberdades civis – tais como o habeas corpus – servem para
proteger “terroristas” e não a eles próprios. Muitos acreditam ainda que a
Constituição é um antigo documento desgastado que impede o governo de exercer os
poderes de polícia de Estado necessários para manter os americanos seguros e
livres.
O autor conclui: “O destino da América foi selado
quando o público comprou do governo Bush a teoria conspirativa do 11/Set, este
evento definidor do nosso tempo – que lançou os EUA em guerras intermináveis e
num permanente estado policial interno – e é um tópico tabu na investigação da
mídia. Com mais de 21% de desemprego, PIB e tecnologia americanos transferidos
para China e Índia, com a guerra sendo o maior compromisso de Washington, com o
dólar sobrecarregado pela dívida, com as liberdades civís sacrificadas pela
falsa “guerra ao terror”, a liberdade e a prosperidade do povo americano foram
atiradas no lixo da história.”
A propósito:
graças à imprensa neocon norte-americana, tipo Fox News & asseclas, a
liberdade de imprensa também foi atirada no lixo da história. Lá, onde a nossa
imprensa hegemônica – Folha, Veja, Globo, Estadão
– há séculos já estava esperando.
** Texto original em
http://www.counterpunch.org/roberts03242010.html
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