É possível o Brasil se tornar o campeão mundial de energia limpa servindo a dois senhores?
Quando se fala em Deus e no dinheiro, o sermão, transformado em dito popular, é direto: Não podemos servir a dois senhores. Quando se trata de tornar o país uma referência em energia limpa, a máxima dos dois senhores também deve servir.
O Congresso tem em mãos uma proposta que garante ao país caminhar a passos largos rumo a um futuro limpo na nossa matriz energética. Tramita na Câmara o Projeto de Lei 630/03 que, entre outras coisas, garante incentivos econômicos e tributários a empreendimentos e empreendedores dispostos a levar adiante projetos de energia eólica, solar, de biomassa e outras fontes de energia com menor potencial poluidor.
Mas, para avançar nesse sentido, o projeto precisa ultrapassar uma barreira: o lobby das usinas termelétricas à base de carvão. O PL das renováveis enfrenta forte resistência por parte desse setor.
Um artigo do projeto que mexe no bolso dos empresários do ramo é o principal motivador de tal aversão: o dispositivo cria uma contribuição das usinas termelétricas que utilizam combustíveis fósseis para o Fundo Nacional para Pesquisa e Desenvolvimento das Fontes Alternativas Renováveis. Ou seja, tira de uma para dar a outra.
Na prática, o dispositivo incentiva a energia limpa e onera as usinas baseadas na queima de carvão, consideradas as grandes vilãs da poluição advinda de fontes de energia. A intenção da proposta, segundo o autor do substitutivo, deputado Fernando Ferro (PT-PE), é exatamente a de ampliar a participação das fontes de energia renováveis na matriz energética brasileira e, ao mesmo tempo, inibir o setor de termelétricas a carvão. Não podemos servir a dois senhores, afirma Ferro.
Do ponto de vista das termelétricas a carvão, o dispositivo que onera o setor é considerado inadmissível. Um dos que rejeitam a proposta é o megaempresário Eike Batista. O projeto de energias renováveis fere diretamente seus interesses de expansão no setor energético. Dono do grupo MPX, Eike está investindo alto em usinas termoelétricas.
Somente no Rio Grande do Sul estado que detém cerca de 90% das reservas de carvão do país , a MPX adquiriu no ano passado a Termelétrica de Seival usina a carvão que produzirá 600MW de energia, num negócio da ordem de R$ 37 milhões e está à frente da MPX Sul, também movida a carvão mineral.
Na avaliação de ambientalistas, Eike está indo na contramão da tendência Green Business. E o empresário está tão empenhado no investimento nesse tipo de termelétricas que os negócios ultrapassaram fronteiras: o grupo de Eike pretende comandar também a megacentral termelétrica Castilla, na região de Punta Cachos, no Chile, área rica em biodiversidade. A promessa para acalmar os ânimos é de altos padrões de controle ambiental.
Com o projeto de Renováveis, o Brasil está diante de dois caminhos: um, o da revolução legal para projetar o país rumo a um futuro de energia limpa; e outro, o de manter tudo como está e deixar que, a mercê dos próprios lucros, empresários e donos do poder sigam servindo ao senhor que bem entenderem.
Uma revolução verde para nos tornar os campeões mundiais de energia limpa de fato, com exploração eficiente do nosso potencial solar e eólico, por exemplo não sai do papel se o país não definir a qual senhor ele quer seguir. Não se trata de maniqueísmo, mas de traçar os rumos do desenvolvimento. Afinal, se a missão sagrada do Brasil, como diz a presidenta Dilma, é mostrar ao mundo que é possível um país crescer aceleradamente, sem destruir o meio ambiente, então temos que fazer isso desde a base, mostrando qual setor que queremos incentivar e priorizar.
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