Soraia Costa
A participação das doações de empresas privadas no financiamento das campanhas eleitorais é vista com bons olhos por especialistas em política consultados pelo Congresso em Foco. Sobre o assunto, foram ouvidos os cientistas Fernando Abrúcio, professor da Fundação Getúlio Vargas, em São Paulo, David Fleischer, professor da Universidade de Brasília, e Alexandre Barros, pró-reitor de pesquisa e pós-graduação da UniEuro, em Brasília.
Para os três, o importante é ter transparência na prestação de contas para se evitar a entrada de dinheiro não contabilizado, o caixa dois. "Em vez de pensar em políticos descolados do mundo dos interesses, o que não é factível, é melhor ter um mundo em que há mais transparência entre os interesses", defende Fernando Abrúcio.
Os estudiosos admitem que não há doações sem interesses, mas defendem que ao ser declarado de onde veio o financiamento, a sociedade terá oportunidade de cobrar a lisura dos parlamentares. "Todos têm interesses, mas sendo explicitados os interesses poderá ser cobrada a isenção", argumenta Abrúcio. "Se nós temos dados, temos como cobrar", acrescenta ele.
Nenhum dos estudiosos defende o fim dos financiamentos privados, pelo contrário. Para eles, o baixo valor que seria usado legalmente nas campanhas daria margem a ampliação de doações não contabilizadas. "Se fechasse para financiamento público, teria caixa dois", afirma David Fleischer. Ele lembra que em 2003, uma estimativa previa um gasto de R$ 20 bilhões nas campanhas, mas a proposta do financiamento público estimava gasto de R$ 900 milhões. "Teria que ter os dois, mas com alguns limites. Nos Estados Unidos, por exemplo, pode haver R$ 5 mil de doação de pessoa jurídica e R$ 1 mil de pessoa física, para qualquer cargo", destaca Fleischer.
Com relação ao financiamento público, Alexandre Barros é o mais radical dos três: "Sou totalmente contra financiamento público de campanha. É uma violação da liberdade individual. O importante é ter um financiamento privado de campanha, porém bem fiscalizado".
A desarticulação da máfia das ambulâncias é citada por Barros como exemplo de que o país está avançando no aumento da transparência. "Esse escândalo das ambulâncias foi importante para mostrar que tem alguém fiscalizando. Antes essas coisas também aconteciam, mas ninguém descobria ou falava", explica. "Se as contribuições ficam transparentes, a cobrança fica mais fácil. Não tem porque um parlamentar receber dinheiro de empresas das quais não concorda. É melhor ser financiado por quem compartilha de seus interesses", defende o cientista político.
Publicidade"O sistema permite o financiamento privado e não há nenhuma irregularidade nisso. A crença é na transparência. Quanto mais transparente, mais os parlamentares serão cobrados. É muito difícil imaginar que os parlamentares percam completamente a isenção. Mas eles sabem que a população sabe de onde vem o dinheiro que os financiou", destaca Fernando Abrúcio.
Opinião de parlamentar
Procuramos os senadores eleitos Marconi Perillo (PSDB-GO), campeão de receita e gastos, de acordo com a prestação de contas fornecida ao Tribunal Superior Eleitoral, Epitácio Cafeteira (PTB-MA), cujo gasto declarado de campanha foi o menor entre os senadores eleitos, Jayme Campos (PFL-MT), pecuarista e ex-governador em seu estado que doou a si próprio R$ 840 mil, e Marisa Serrano (PSDB-MS), que recebeu diversas doações de baixo valor. Todos estavam em fazendas ou fora de seus estados, incomunicáveis. Apenas o deputado Renato Casagrande (PSB-ES), eleito senador, foi encontrado.
Tradicional defensor das questões ambientais, ele recebeu a doação de R$ 100 mil da Aracruz Celulose. Questionado sobre a possibilidade de receber cobranças das empresas doadoras durante o mandato, Casagrande foi enfático: "Não dou margem a isso. Meu compromisso com as empresas doadoras não ultrapassa minha responsabilidade como parlamentar", garantiu. Para o deputado e senador eleito, o que diferencia uma doação de outra é a atuação do parlamentar e os compromissos firmados durante a doação. "Essas empresas nunca me pediram nada além do que é legitimo para a defesa dos interesses do setor", diz.
Apesar de confiar na legitimidade do financiamento privado, Casagrande defende como ideal o financiamento público das campanhas. "As empresas sabem que o jeito da democracia se fortalecer é financiar, mas o ideal para nós é o financiamento público, porque limita o poder econômico nas campanhas e dá transparência ao processo".
Questionado sobre a necessidade de se investir tanto na campanha, Casagrande disse: "Um candidato ao Senado que gasta menos que R$ 100 mil deve sofrer auditoria, porque é muito pouco". Entre os eleitos, apenas Epitácio Cafeteira declarou ter gastado menos de R$ 100 mil. Segundo informações prestadas ao TSE, o petebista maranhense gastou R$ 81,27 mil para se eleger.
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