Antonio Vital*
O compositor Fernando Brant é conhecido por sucessos como "Maria, Maria", "Canção da América", "Nos bailes da vida" e outros, muitos outros. Dificilmente algum brasileiro não ouviu, alguma vez na vida, alguma dessas canções na voz de Milton Nascimento. O que pouca gente sabe é que Fernando também é líder de classe. Ele preside a União Brasileira de Compositores. E está furioso com o que classifica de apoio institucional do Ministério da Cultura – leia-se seu colega de profissão Gilberto Gil – à flexibilização dos direitos autorais.
Fernando Brant participou do programa de debates Expressão Nacional, da TV Câmara, na noite de terça-feira (16). Ele discutiu o tema com o deputado Fernando Gabeira (PV-RJ), o deputado Leonardo Picciani (PMDB-RJ) e Marcos Alves, coordenador de Direito Autoral do Ministério da Cultura. Picciani é presidente da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara.
Além disso, é autor de um projeto de lei que endurece as penas para crimes de pirataria, inclusive a violação de direitos autorais. Gabeira, que além de deputado é escritor, inovou no lançamento de seu último livro, Navegação na Neblina. Foi o primeiro título de autor de best seller brasileiro registrado sob "licença criativa comum", uma medida que autoriza a reprodução total da obra.
Esse tipo de licenciamento está no centro dessa discussão, que só agora chega ao Parlamento. As novas tecnologias, que facilitam a reprodução de qualquer obra audiovisual, e a internet, considerada território livre por vastas legiões de internautas, colocaram em xeque os velhos métodos de proteção aos direitos autorais dos artistas. A dificuldade de controlar a difusão de conteúdo gratuito na rede mundial levou Lawrence Lessig, professor de direito da universidade americana Stanford, a idealizar em 2001 um conceito novo para tentar resolver a questão, o chamado Creative Commons (CC), um conjunto de licenças autorais com as quais o criador permite acesso livre à sua obra, oficializa a cópia privada – ou pirataria sem fins lucrativos.
Na prática, em vez de ter "todos os direitos reservados", como asseguram as leis de copyright, o autor opta por ter "alguns direitos reservados", como a exclusividade do uso comercial, mas permite que a obra seja reproduzida por qualquer pessoa ou até modificada, sem que isso configure crime.
Para muitos artistas, a inovação não passa de uma maneira de driblar os direitos autorais. Já os defensores do modelo consideram a inovação uma estratégia de negócio. Partem do pressuposto de que, quanto mais a obra circula, maior é seu valor de mercado. O CC foi recebido com desconfiança no princípio, mas em três anos já tinha 60 milhões de obras licenciadas. Hoje o número passa dos 140 milhões.
O próprio Gilberto Gil cedeu todo o disco "O Sol de Oslo", lançado em 1998. E foi pesadamente criticado por Brant em artigos difundidos na mesma internet que ameaça alguns setores da indústria fonográfica. Gil foi defendido por Marcos Alves no debate. "Quem flexibilizou o direito autoral não foi o Ministério da Cultura, mas a internet", disse Marcos, que garantiu que o modelo não faz parte da política cultural do ministério – apesar de a pasta apoiar oficialmente pesquisas da Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas sobre o assunto.
"A tecnologia criou o problema e a tecnologia vai resolvê-lo", disse Gabeira. Ele chamou atenção para o fato do portal Youtube ter implantado um mecanismo que impede a reprodução de vídeos protegidos por direitos autorais – na verdade, uma maneira de escapar de processos por pirataria movidos pelas grandes redes de TV norte-americanas. Ele explicou por que optou pelo Creative Commons ao licenciar os direitos de seu último livro. "Eu queria me dirigir ao público da internet e, assim, qualquer pessoa poderia baixar o livro na rede. E consegui, já que foram feitos 80 mil downloads do livro".
É uma situação diversa da de um compositor que vive de suas obras, como Fernando Brant. "O Creative Commons seria uma flexibilização dos direitos autorais, mas quem entra nesse modelo não pode sair mais", disse.
Os participantes do debate tentaram separar o caso de um internauta que baixa uma música para consumo próprio daquele que faz a cópia para vender – o pirata. "Mas a lei iguala as duas ações. Quem baixa um arquivo de música sem permissão do autor está cometendo um crime também", informou Marcos. Gabeira ficou surpreso. "É preciso aperfeiçoar a legislação", reconheceu.
Próximo programa
Debate sobre a TV pública criada pelo governo Lula com a presença da presidente da nova emissora, a jornalista Tereza Cruvinel.
O Expressão Nacional é um programa da TV Câmara transmitido ao vivo todas as terças-feiras, às 22h. Os telespectadores podem enviar perguntas ou sugestões pelo correio eletrônico expressaonacional@camara.gov.br ou pelo telefone gratuito 0800-619-619. Quando há sessão plenária da Câmara, o programa é transmitido ao vivo pela internet: www.camara.gov.br/tv.
O programa sobre os direitos autorais será exibido novamente na TV Câmara nos seguintes dias e horários: sexta-feira (19), às 4h e 11h30; Sábado (20), às 2h e 12h; Domingo (21), à 0h15 e 11h; e Segunda (22), às 6h, 10h e 18h.
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