Cândido Vaccarezza*
Na história das relações entre os produtores rurais e os ambientalistas tem prevalecido a ideia de que eles estão em lados opostos. Trata-se de uma postura equivocada, em que nenhum dos lados ganha e o país é quem perde. Ainda mais porque, entre uns e outros, estão os pequenos proprietários, os maiores responsáveis pelo abastecimento da mesa dos brasileiros. A votação do novo Código Florestal, agora, é a oportunidade que temos de transformar essa disputa numa parceria positiva para toda a sociedade.
Não estamos falando de um assunto qualquer, mas de uma legislação que terá impacto direto na produção agropecuária e na preservação do meio ambiente. São temas estratégicos para nós, brasileiros, e também para toda a comunidade internacional. Pois o Brasil é o lugar onde se encontra a maior biodiversidade do planeta e, ao mesmo tempo, o país com as melhores condições para aumentar a oferta de alimentos para a população mundial.
São temas estratégicos e interdependentes. Segundo cientistas, o aquecimento global já afeta a produção agrícola no mundo. Estudo feito pela Universidade de Stanford, nos Estados Unidos, indica que nos últimos 30 anos as produções de milho e de trigo em todo o mundo caíram, respectivamente, 5,5% e 4% em resposta ao clima mais quente. A Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) fez um alerta no início do mês sobre os potenciais efeitos catastróficos das mudanças climáticas na produção de alimentos a partir de 2050.
Ano, em que, segundo o Banco Mundial, será preciso elevar em 80% a atual produção mundial de alimentos para abastecer toda a população. Segundo o Fórum Econômico Mundial na América Latina de 2011, o Brasil, com seus recursos naturais, terá um papel fundamental no desafio de aumentar a produção e a produtividade mundial de alimentos.
Esse é o tamanho da responsabilidade da decisão que estamos tomando. Ciente disso, a presidenta Dilma Rousseff determinou que os setores do governo ligados aos dois lados da questão encontrassem a convergência necessária para construir uma proposta que atendesse ao desafio de viabilizar a produção rural sem comprometer o meio ambiente.
Os ministros da Agricultura, Wagner Rossi; do Meio Ambiente, Izabella Teixeira; e do Desenvolvimento Agrário, Afonso Bandeira Florence, se envolveram diretamente nessa negociação. A primeira providência foi afastar as teses fundamentalistas da discussão. E, assim, pela primeira vez, o debate evoluiu e muito!
Foi possível avançar na solução de impasses importantes, como a regulamentação das áreas consolidadas em Áreas de Proteção Permanente (APPs) e compensação e uso sustentável nas Áreas de Reserva Legal.
Essa convergência entre as áreas ligadas ao meio ambiente e à produção rural estimulou um acordo mais amplo, envolvendo o relator do projeto na Comissão Especial, deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP). Com concessões de lado a lado, foi possível avançar num acordo que contemplou 98% da matéria. Não foi pouco!
Restam dois pontos importantes de divergência: a manutenção das áreas de proteção e a não anistia a quem desmatou reservas florestais, mas que podem e devem ser superados. Nunca houve convergência igual nesse tema e agora não podemos desperdiçar o enorme avanço já alcançado.
As mudanças climáticas globais já não são apenas teses científicas, mas transformações que o cidadão comum sente em todos os cantos do planeta. O aumento no preço dos alimentos e o desabastecimento são ameaças reais. Os argumentos de cada lado para defender suas teses deveriam se somar para construir um novo consenso. Um acordo é possível e necessário.
*Deputado federal (PT-SP), líder do governo na Câmara dos Deputados
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