Nesses idos de março, havia jurado a mim mesma nunca mais escrever sobre a mulher e seus direitos, então fica só o registro lido ou visto ou ouvido não sei onde que a igreja católica excomungou a equipe médica que fez o aborto duma menina de nove anos violada pelo pai: vai ver a igreja passou a abençoar o incesto, sabe Deus?
Um amigo, testemunha da ditadura, dos anos de chumbo, me diz ao telefone que “estamos perdendo todas as nossas conquistas, tudo aquilo por que lutamos”. Pois é. O buraco é ainda mais embaixo, ainda mais fundo, a ferida bem maior do que imaginávamos e NÃO vai fechar, meu chapa. Sem contar a desmemória dos nossos contemporâneos que só sabem de ouvir falar (o que significa que nada sabem, porque não só a vivência é intransmissível, como a história recente anda terrivelmente mal contada, cooptada pelo capital), que não estiveram lá.
Mas o episódio dessa excomunhão indica quanto a religião com seus dogmas tornou-se absurda, extemporânea, bizarra, uma instituição sem nenhuma função ou utilidade, salvo aquela de tornar os homens, fiéis e infiéis, mais miseráveis, infelizes, acossados por terrores dogmáticos e demais fantasmagorias. Se igrejas subsistem e triunfam em nossos dias é, assim como a filmografia de Hollywood que passa na tevê a cabo, infundindo terror.
Para saquear cotidianamente 99% da humanidade sem que ninguém proteste, vale tudo, é compreensível, só não vale justificar e dar vivas ao saque, à mentira, negar a realidade. Mais ou menos o que fizeram Marcelo Coelho e a Folha de S. Paulo ao instituírem a “ditabranda”: que merda foi essa? Certo, academicamente o papel aceita tudo e é livre o pensar, posto existirem teses negando o holocausto dos judeus, contudo a realidade, tanto quanto a lei da gravidade, continua ditando as regras do jogo.
O resto é ideologia dominante (e por ideologia dominante entendam-se as ideias das classes dominantes, a visão de mundo pela ótica das elites) que, assim com a igreja e os filmes de Hollywood, presentemente apenas subsiste através do terror.
Deixe um comentário