A tarefa não será fácil. Rosendo Severo, que não é político, enfrentará os deputados Sérgio Barradas Carneiro (PT-BA), Ana Arraes (PSB-PE), Aldo Rebelo (PCdoB-SP) e Átila Lins (PMDB-AM) numa votação entre os próprios deputados. Rosendo conta com a possibilidade de uma pressão da sociedade para tornar vitoriosa sua campanha para se tornar ministro do Tribunal de Contas da União. A plataforma de Rosendo é baseada na ideia de que o tribunal, responsável por analisar as contas do governo federal, deveria ser despolitizado. Hoje, o tribunal funciona como uma espécie de fim de carreira para políticos antes da aposentadoria. E eles têm uma tendência de amenizar os resultados das auditorias feitas pelos técnicos do tribunal.
Na sua campanha, Rosendo enviou esta semana uma carta aos deputados em que lista 11 pontos que justificam a sua candidatura. “Além dos requisitos constitucionais, é imprescindível que o futuro ministro possua a independência e a coragem necessárias para enfrentar com firmeza e determinação os desvios e a malversação dos recursos públicos, mormente no atual momento, em que os escândalos de corrupção e desperdícios se sucedem com intensidade e freqüência espantosas”, diz Rosendo, na carta aos deputados.
“O Movimento Ministro Cidadão representa uma quebra de paradigmas para a sociedade e para o TCU”, diz Rosendo, já que é a primeira vez que a sociedade civil envolve-se na escolha de um ministro do tribunal. Além de ter o apoio da União dos Auditores Federais de Controle Externo (Auditar), a candidatura de Rosendo é apoiada por entidades da sociedade civil, como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
Veja abaixo a íntegra da carta e dos 11 pontos elencados por Rosendo para justificar sua candidatura:
“Exmo(a). Senhor(a) Deputado(a) Federal,
Como é do conhecimento de Vossa Excelência, nos próximos dias, a Câmara dos Deputados elegerá um novo ministro para o Tribunal de Contas da União.
Além dos requisitos constitucionais, é imprescindível que o futuro ministro possua a independência e a coragem necessárias para enfrentar com firmeza e determinação os desvios e a malversação dos recursos públicos, mormente no atual momento, em que os escândalos de corrupção e desperdícios se sucedem com intensidade e frequência espantosas. É de grande relevância, também, que tenha conhecimento do sistema de controle externo, suas virtudes e possibilidades de aperfeiçoamento e que possua espírito inquieto, propositivo e, ao mesmo tempo, ponderado e criterioso de modo a propor e implementar os ajustes e as evoluções pertinentes às práticas atuais.
É nessa linha que, apoiado por várias entidades da sociedade civil organizada, estou colocando o meu nome à disposição da Câmara dos Deputados para este tão importante cargo da República. Sou auditor do Tribunal de Contas da União há mais de 20 anos e a minha formação e experiência profissional podem ser melhor analisadas no currículo resumido constante da página www.ministrocidadao.org.br. Encaminho, ainda, diversos posicionamentos pessoais acerca de questões que reputo relevantes para o controle, e que deixam claro o meu pensamento e disposição para o exercício efetivo do cargo.
Por fim, colocando-me à disposição para quaisquer esclarecimentos adicionais, peço a Vossa Excelência, em meu próprio nome e em nome das diversas entidades que apoiam o Movimento Ministro Cidadão, que examine a questão com o espírito público e a impessoalidade imprescindíveis e, assim, vote no melhor candidato a Ministro do Tribunal de Contas da União.
Respeitosamente,
ROSENDO SEVERO DOS ANJOS NETO
Candidato do Movimento Ministro Cidadão
www.ministrocidadao.org.br
Posicionamentos do candidato Rosendo Severo:
1) A candidatura – técnico ou político para Ministro do TCU?
A questão não é um embate entre as dimensões técnica e política. O que está em jogo na escolha de um ministro para o TCU são os requisitos fixados pela Carta Magna e, mais do que nunca, a disposição para combater os desvios e a malversação dos recursos públicos. Os requisitos constitucionais são idoneidade moral, reputação ilibada e notórios conhecimentos jurídicos, contábeis, econômicos e financeiros ou de administração pública. Tais conhecimentos devem ser não apenas teóricos, mas precisam ter sido exercidos profissionalmente durante, no mínimo, 10 anos. Isto é o básico. Entretanto, no momento atual, o País precisa de mais do que isso. É necessário colocar nos órgãos de controle pessoas que tenham a independência e a coragem necessárias para enfrentar as irregularidades.
2) A candidatura – o que diferencia o Ministro Cidadão dos demais candidatos?
O Movimento Ministro Cidadão representa uma quebra de paradigmas para a sociedade e para o TCU. Esta é a primeira vez que a escolha de um ministro do TCU mobiliza a sociedade. Isto, por si só, já representa uma evolução democrática e demonstra que a sociedade está interessada no trabalho do TCU. Consequentemente, a atuação do próximo ministro, quem quer que seja, será, constantemente, vigiada e avaliada, o que é muito bom. Por outro lado, caso venhamos a ter sucesso, o conhecimento adquirido nos últimos 20 anos de exercício do controle, a inquietação em relação a algumas práticas que não fazem mais sentido e a disposição para propor e discutir novas ideias para o aperfeiçoamento do controle externo, possibilitarão uma atuação propositiva, principalmente no que concerne ao combate rigoroso à corrupção e à malversação dos recursos públicos, à transparência das ações de controle externo e dos atos administrativos internos, ao fomento do controle social e à maior integração entre corpo técnico e ministros. Algumas destas ideias são expostas a seguir.
3) Aperfeiçoamento do controle externo – admissões e aposentadorias no serviço público.
O Tribunal é com certeza o órgão da Administração que recebe e tem acesso à maior quantidade e diversidade de informações sobre a Administração Pública Federal. São informações sobre pessoal ativo e inativo, evolução patrimonial dos gestores, informações financeiras e contábeis dos órgãos e empresas jurisdicionados, obras em andamento, programas de governo etc. Ocorre que tais informações são geralmente tratadas de forma isolada. O caso das admissões e concessões (aposentadorias e pensões) é típico: tais dados são analisados exclusivamente para verificar a legalidade dos respectivos atos. Penso que o Tribunal precisa utilizar as informações que recebe de modo a alimentar uma inteligência de controle. A área de pessoal está entre as mais importantes para isso, já que os desvios e fraudes são perpetrados por pessoas e em benefício destas. Só para exemplificar, o cadastro de servidores ativos e inativos pode ser confrontado com o dos sócios das empresas que contratam com o serviço público para verificar a possível ocorrência de favorecimentos e desvios.
4) Aperfeiçoamento do controle externo – arrecadação e renúncia de receita.
Hoje, o Tribunal se debruça quase que exclusivamente sobre as despesas. Ocorre que só se gasta o que é arrecadado. Portanto, mesmo que olhássemos apenas sob o aspecto da materialidade, uma atuação mais efetiva na área de arrecadação se justificaria. Além disso, a arrecadação está concentrada em pouquíssimos órgãos, os quais terceirizam significativas etapas do processo. Ou seja, quem de fato arrecada são os bancos. O Tribunal precisa fiscalizar melhor órgãos como a Receita Federal do Brasil e a atuação da rede bancária na arrecadação tributária. Outra questão importante são as renúncias de receitas. Este mecanismo legal precisa ser constantemente avaliado sob o ponto de vista da efetividade. Toda renúncia tem um propósito que, a princípio, é bom. Se este propósito não está sendo alcançado, a política precisa ser revista; se a renúncia já atingiu o objetivo para o qual foi criada é hora de ser extinta. Só para citar um exemplo, em 1969, com o objetivo de fortalecer a economia do estado do Espírito Santo abalada pela erradicação dos cafezais, foi criado o Fundo de Recuperação do Estado do Espírito Santo. A renúncia fiscal durou até 2001, sendo que há muito, o Estado, não apenas tinha se recuperado da crise, como voltará a ser um dos maiores produtores de café.
5) Aperfeiçoamento do controle externo – declarações de bens e rendas dos ocupantes de cargos e funções públicas.
A Lei nº 8.730/1993 obriga os detentores de cargos, empregos e funções públicas a apresentarem ao TCU declarações de bens e rendas, na posse e uma vez por ano. O Tribunal poderia utilizar as informações prestadas como insumo para a inteligência do controle, ou seja, para selecionar o que, quem e como fiscalizar. É difícil esconder dinheiro porque ele tem apenas uma utilidade para o detentor: só serve para gastar. Mesmo quando se poupa, o objetivo é gastar no futuro. É muito pouco provável que alguém que desviou recursos públicos mantenha o mesmo padrão de vida, continue morando na mesma casa, no mesmo bairro, usando o mesmo carro, sem adquirir outros bens imóveis e sem ter aplicações. É também improvável que mantenha tudo em nome de comparsas ou laranjas por tempo indeterminado. A evolução patrimonial e, principalmente a rapidez com que ocorre, é um sinal de alerta para os órgãos que pretendem reprimir a corrupção.
6) Aperfeiçoamento do controle externo – fiscalização de obras.
Todos nós sabemos da fundamental importância que a área de infra-estrutura tem para o desenvolvimento do País. Portanto, essa área precisa continuar sendo acompanhada de perto. Ao contrário do discurso de que TCU, Ministério Público, CGU e Polícia Federal atrapalham quando agem com rigor, penso que a fiscalização exercida pelos órgãos de controle é fundamental para inibir a corrupção e os desvios, estes, sim, males que precisam ser extirpados. Embora a capacidade de atuação seja limitada, se for direcionada com base em bons critérios, o resultado pode ser maximizado. Conhecer os gestores, os contratados, a origem e o destino dos recursos e a relação entre eles é de fundamental importância para identificar possíveis desvios, antecipar-se e, desta forma, evitá-los. Também defendo a manutenção do poder do TCU e do Congresso Nacional no bloqueio de recursos direcionados a obras com irregularidades graves. Infelizmente, hoje, gestores cometem verdadeiras barbaridades com o dinheiro público e, quando a obra é paralisada, culpa-se o controle. Obras bem planejadas, executadas e nas quais não há desvios de recursos públicos não são paralisadas.
7) Aperfeiçoamento do controle externo – processo de contas anuais.
Os gestores públicos têm o dever constitucional de prestar contas anualmente da sua gestão. Entretanto, o TCU não tem capacidade de examinar e julgar todas as contas da forma tradicional e, em razão disso, dispensa vários gestores desta obrigação. Defendo que a prestação de contas se dê nos moldes da declaração de imposto de renda: todos prestariam contas por meio de formulários eletrônicos, os quais seriam analisados preliminarmente por um programa de computador que selecionaria algumas contas, com base em critérios pré-definidos, para uma análise personalizada e julgamento. Uma espécie de malha fina. A qualquer momento, observado o prazo prescricional, contas não selecionadas inicialmente poderiam ser analisadas e julgadas. Como resultado disso, o Tribunal e a sociedade ganhariam um excelente banco de dados sobre a gestão pública. Além disso, entendo que as prestações de contas devem ficar disponíveis para o público em geral. Não há motivos para sigilo, neste caso, e a sociedade poderia ajudar na identificação de irregularidades, o que seria mais um passo para a consolidação do controle social.
8) Aperfeiçoamento do controle externo – qualificação da gestão pública.
O Tribunal tem buscado atuar de forma pedagógica, capacitando os gestores a bem exercerem suas funções. Desde 2004, o Tribunal vem realizando Diálogos Públicos para os quais são convidados gestores e sociedade em geral e nos quais são discutidos, de forma didática, temas relevantes para a gestão pública. Mais recentemente, o TCU colocou à disposição cursos à distância. Em 2010, mais de 20 mil gestores públicos participaram destes treinamentos. Penso que, com o crescimento dos meios de comunicação, principalmente do acesso à internet, estas iniciativas podem e devem ser incrementadas. Espero que em breve ninguém mais tenha a desculpa da ignorância para justificar irregularidades cometidas.
9) Aperfeiçoamento do controle externo – processo eletrônico e publicidade.
Tive o privilégio de supervisionar o desenvolvimento e a implantação do processo eletrônico no TCU. Desde outubro de 2010 todos os processos que entram no Tribunal são inteiramente eletrônicos. O ganho imediato é a agilidade e a facilidade de manuseio do processo, que agora pode ser, ao mesmo tempo, visualizado pelo relator e seu gabinete em Brasília, pelos responsáveis e seus advogados em qualquer local do Brasil e até do mundo, sem que isso impeça ou atrapalhe a sua análise concomitante por parte do auditor. Entretanto, penso que o maior benefício é que o processo eletrônico tem o potencial de conferir transparência total dos processos em curso no TCU. Qualquer pessoa, desde que tenha acesso à internet, deveria poder ter acesso ao inteiro teor dos processos, exceto nos casos em que a publicidade ofereça risco à integridade de pessoas, à segurança nacional ou possa prejudicar a apuração. O processo eletrônico tornou esta transparência tecnicamente possível, entretanto, isso ainda não foi implementado. Precisamos lutar pela publicidade total dos processos e, consequentemente, da atuação do TCU.
10) Aperfeiçoamento do controle externo – Lei da Ficha Limpa, inelegibilidade de gestores com contas irregulares e Cadicon – Cadastro Integrado de Condenações por Ilícitos Administrativos
A inelegibilidade de gestores com contas julgadas irregulares já constava da Lei Complementar nº 64/1990. A Lei da Ficha Limpa manteve, com pequenas alterações, o dispositivo. Entretanto, por dificuldades operacionais, cada tribunal de contas encaminhava a sua própria relação à justiça eleitoral local e, na maioria dos casos, isto nem era devidamente divulgado junto aos eleitores. Desta forma, era possível que um gestor condenado em um estado, concorresse em outro, sem que a Justiça Eleitoral e os eleitores tivessem conhecimento do fato. No biênio 2009/2010 tive a oportunidade de coordenar um grupo de trabalho, no âmbito da Rede de Controle, cujo objetivo era desenvolver um cadastro geral dos maus gestores, o Cadicon, que nada mais é do que uma solução tecnológica que busca nos diversos cadastros, reúne e organiza tais informações e possibilita a visualização por parte do interessado em um ambiente único. É uma espécie de SPC dos maus gestores públicos. Embora o Cadicon, no primeiro momento, tenha reunido apenas os gestores que tiveram suas contas julgadas irregulares, a ideia é que venha a conter informações sobre condenados por improbidade administrativa, empresas inabilitadas para contratar com a administração pública, gestores multados pelo TCU, TCEs e TCMs etc. O Cadicon é um exemplo de como a combinação entre tecnologia, integração de informações e parceria entre órgãos pode contribuir para o incremento da transparência e do controle social.
11) Aperfeiçoamento do controle externo – ações do TCU para estimular e fortalecer o controle social
Há várias formas de se incrementar o controle social. Em primeiro lugar, a sociedade precisa conhecer melhor o TCU, suas atribuições e forma de atuação. Uma maneira simples e barata de se atingir este objetivo seria a transmissão das sessões do Tribunal nas TVs públicas como a TV Câmara, TV Senado ou TV Justiça e, ainda, pela internet. As transmissões poderiam ser ao vivo pela internet, para atender àqueles que querem acompanhar o julgamento de um determinado processo, e em VT, pelas TVs públicas, em dias e horários em que não são realizadas transmissões ao vivo nos referidos veículos, por exemplo, nas segundas ou sextas-feiras. Além disso, o TCU precisa facilitar, e até incentivar, a participação popular denunciando desvios e malversação de recursos públicos. A Ouvidoria é o canal apropriado para o recebimento destas informações, no entanto, os procedimentos de apuração precisam ser aperfeiçoados e simplificados. É necessário estabelecer filtros de modo a classificar as denúncias entre as que precisam ser apuradas imediatamente a aquelas que vão ser armazenadas e tratadas em conjunto com outras informações. Várias outras ações podem ser adotadas. Penso, entretanto, que um pré-requisito essencial nesta aproximação com a sociedade é o aperfeiçoamento da página do TCU na internet, que precisa ser de fácil interação e agradável ao internauta. Não podemos perder de vista que a internet, a cada dia, está se tornando o meio de comunicação mais popular.“
Deixe um comentário