Rodrigo Chia*
Este início de ano poderá oferecer aos brasilienses uma surpresa tão bem-vinda quanto absurda: pela primeira vez o DFTrans espera entender as planilhas de custos das empresas de ônibus que venceram a licitação realizada em 2012 e que hoje operam o serviço na capital do país.
Para ficar claro: o DFTrans é a autarquia responsável por planejar, controlar e avaliar o transporte público do DF. Apesar disso, em reunião do Conselho de Transparência e Controle Social (CTCS) no início de dezembro, representantes do órgão afirmaram, sem esconder o constrangimento, que os dados de custos referentes a essa licitação são incompreensíveis até para eles. Ou, na definição de Frederico Martins, chefe de gabinete da diretoria-geral do DFTrans, “uma incógnita”.
Na prática, a autarquia que deveria “planejar, controlar e avaliar” o transporte por ônibus sequer sabe qual é seu custo – nem o alegado pelas empresas, nem, obviamente, o real.
Qual é o impacto concreto desse cenário surrealista? Um exemplo é a completa impossibilidade de julgar se as tarifas dos ônibus estão “baratas” ou “caras”. Do mesmo modo, falta base para avaliar os vultosos subsídios repassados periodicamente às empresas, num total estimado pelo governo em R$ 550 milhões apenas em 2015.
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A matemática do transporte público é complicada. De forma muito resumida, o preço pago pelo passageiro (atualmente de R$ 2,25 a R$ 4) cobre apenas parte do custo do sistema. As empresas são remuneradas de acordo com uma “tarifa técnica”, superior a R$ 6, que abrange todos os gastos com veículos, empregados, tributos, administração e também o lucro. A diferença entre essas duas tarifas, além das gratuidades legais (idosos, pessoas com deficiência e estudantes), é paga pelo GDF em forma de subsídio.
O problema fundamental é que, sem saber em detalhes quanto as empresas gastam – ou pelo menos alegam gastar – é impossível auditar as contas, o que permitiria, a depender do resultado, até reduzir a tarifa técnica contratada.
Por isso é absurdo o aumento instituído em setembro do ano passado. Em situação de aperto financeiro, o governo subiu a tarifa ao usuário para, supostamente, reduzir os repasses às empresas. A pergunta que cabia à época e permanece válida é: por que não buscar essa economia auditando os custos apresentados pelas empresas para verificar se são compatíveis com a realidade de mercado e o serviço efetivamente prestado?
A explicação oficial tem a ver com o fato de o DFTrans “não saber” quais são os custos alegados pelas empresas. No entanto, segundo os próprios representantes da autarquia, isso vai mudar. Depois de um esforço técnico para “interpretar” e “sistematizar” os dados disponíveis – alguns apenas em imensos processos de papel! –, os primeiros resultados estão previstos para este mês.
Espera-se que, com esse avanço, não só o DFTrans, como outros órgãos do governo, o Tribunal de Contas e o Ministério Público possam redobrar os esforços de fiscalização e avaliação de um serviço público recentemente alçado a direito social com status constitucional.
O passo seguinte será finalmente cumprir a Constituição em outro ponto e garantir livre acesso a esses dados – de caráter público – à sociedade. O esforço coletivo de entidades de controle social e de cada cidadão pode ajudar a alcançar o que nem uma CPI atualmente em curso na Câmara Legislativa parece ser capaz: lançar luz sobre a caixa preta do transporte público do DF.
*Vice-presidente do Observatório Social de Brasília, servidor público e advogado
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