Como revelou a Revista Congresso em Foco, dois anos antes de o então deputado Roberto Jefferson denunciar o mensalão do PT, em 2005, o procurador-geral da República na época, Cláudio Fonteles, pedia a devolução de R$ 12 milhões por irregularidades no “valerioduto” do PSDB em Minas Gerais em uma ação de improbidade administrativa. O deputado Eduardo Azeredo (PSDB-MG) e o senador Clésio Andrade (PR-MG) respondem atualmente a ações penais no STF acusados de montar um esquema de desvio de dinheiro dos cofres públicos estaduais com as agências de publicidade de Valério para custear a campanha eleitoral de 1998 ao governo estadual.
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Para o vice-líder do PT na Câmara, Fernando Ferro (PE), a demora do Supremo “salta aos olhos” e mostra um “tratamento desigual” entre o mensalão mineiro e o petista. “É a celeridade para um caso e morosidade para outro. Isso compromete mais ainda a imagem do Judiciário, que fica procrastinando propositadamente com intenções políticas”, disparou.
Ele destacou ter havido maior velocidade no julgamento do mensalão de Valério a serviço do PT, que acabou por condenar à cadeia o ex-ministro José Dirceu, além de quatro deputados, o empresário e mais 19 réus. “Nós sempre achamos estranho isso.”
Já o vice-líder do governo na Câmara, Henrique Fontana (PT-RS), chamou atenção para o desequilíbrio político gerado. “O Supremo, sabendo o impacto político desses dois julgamentos, não poderia ter desequilibrado o processo político do país julgando um e não julgando o outro”, afirmou.
Ele destacou o fato de a primeira denúncia do mensalão do PSDB ter chegado à corte em 2003, antes da acusação do valerioduto petista, que chegou em 2006, mas já foi julgada. “O Supremo equivocou-se ao não levar esses dois julgamentos dentro de um critério cronológico de prazo”, ponderou.
Correção
O senador Eduardo Suplicy (PT-SP) acredita que o Supremo errou. “Pode ter havido um viés de natureza política, mas que precisa ser prontamente corrigido”, disse ele. “Cabe responsabilidade a todos os ministros do Supremo, em especial o presidente, Joaquim Barbosa, a correção desse desequilíbrio de procedimentos”, afirmou.
Para Suplicy, o tribunal precisa analisar a denúncia do então procurador Cláudio Fonteles. Caso contrário, demonstrará “ter dois pesos e duas medidas”. A denúncia do procurador deve ser julgada não no seu mérito, mas apenas na remessa do processo para a Justiça de Minas Gerais, já que se trata de um caso de improbidade administrativa, para os quais o STF decidiu, ainda em 2005, que os réus não tem foro privilegiado no Supremo.
Fernando Ferro disse que a bancada acompanha o caso com preocupação e afirmou esperar que o mensalão mineiro também seja julgado logo. Ele lembrou que deputados do PT já cobraram isso do Supremo no plenário da Câmara. “É lamentável. Compromete claramente a imagem do Supremo.”
Demora e irrelevância
O subprocurador geral da República Eugênio Aragão entende que a demora do Supremo é o curso natural dos processos criminais no tribunais. Ele concorda com o novo ministro da corte, o relator do valerioduto tucano, Luís Roberto Barroso, para quem o mensalão do PT foi um “ponto fora da curva” em relação à velocidade do julgamento. A declaração de Barroso ocorreu antes da indicação e nomeação para a corte.
“Deu-se tratamento célere e simbólico a um caso que na verdade foge completamente ao comportamento que o Supremo tem em relação a matérias criminais, de improbidade, que são matérias que o Supremo deixa para o final da fila sempre. Sempre foi assim”, afirmou Aragão, que já atuou na corte e recentemente foi cotado para ser ministro do STF. “Então, o Supremo não está fazendo nada de novo. Fez de novo no caso do mensalão. Nesse daí, na verdade está dando tratamento que sempre deu a esses casos: não dá a maior relevância.”
Aragão defendeu o fim do foro privilegiado e disse que matérias criminais deveriam ser julgadas em primeira instância. O subprocurador ainda disse que “a grande maioria” dos processos penais prescreve no Supremo.
Estranheza
Professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), Pedro Estevam Serrano também critica o andamento dos dois mensalões, o tucano e o petista. Ele considerou estranha a demora de julgamento de um recurso no valerioduto do PSDB. “Claro que normalmente há incidentes formais que atrasam o julgamento de uma medida. Obviamente, oito anos é muito tempo. É de estranhar”, disse ele, que ressaltou não conhecer os incidentes formais que justificariam a demora.
Doutor em Direito de Estado, Serrano critica o peso menor que a presunção de inocência teve no julgamento do mensalão do PT. Ele entende que o comportamento do Supremo em outros casos vai dar legitimidade política e histórica às decisões tomadas no mensalão que condenou José Dirceu e outros 24 réus. “Inclusive nesse caso [do mensalão mineiro sem julgamento há oito anos], porque vai definir se aquele julgamento foi mudança de jurisprudência legítima ou se se tratou de uma decisão de exceção”, argumentou Serrano.
A reportagem procurou a assessoria do STF e do presidente do tribunal, Joaquim Barbosa, mas não obteve esclarecimentos. O ministro Roberto Barroso, novo relator do mensalão mineiro, está no exterior. Sua assessoria disse que ele só poderia falar depois do recesso do Judiciário.
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