Rodolfo Torres
A bancada ruralista reclama de prejuízos no setor agropecuário e se movimenta para alterar a Lei de Falências (Lei 11.101/2005). Na Câmara, tramita um projeto de lei obrigando o pagamento dos fornecedores antes que a dívida complete um mês.
No Senado existe uma emenda, pronta para ser enxertada em alguma medida provisória, que determina o pagamento de atividades rurais e pecuárias em até um ano, como já ocorre para questões trabalhistas.
As iniciativas dos ruralistas alteram o instrumento da recuperação judicial. Essa medida suspende o pagamento de dívidas e oferece ao devedor uma possibilidade de se recuperar de uma crise financeira. Para tanto, ele tem de apresentar em juízo um plano para sua recuperação.
O Projeto de Lei 5.089/09 e a emenda são propostas pelo deputado Ronaldo Caiado (DEM) e pelo senador Marconi Perillo (PSDB), respectivamente. Segundo o tucano, apenas no ano passado, a dívida dos frigoríficos que entraram em recuperação judicial com os pecuaristas do Centro-Oeste é estimada em R$ 700 milhões.
O senador aponta o caso de um frigorífico goiano que abateu, nos 21 dias que antecederam seu pedido de recuperação judicial, “nada menos que 180.000 cabeças de gado” no país inteiro. Conforme explica Perillo, a maioria do gado vinha de “pequenos pecuaristas, que entregaram para abate pequenos lotes de 50, 100, 200 cabeças”.
“O frigorífico estabeleceu, em seu plano de recuperação judicial, parcelamento do crédito desses produtores em 12 parcelas, com um ano de carência para inciar-se o pagamento, medida que inviabiliza a recomposição do rebanho, e termina por comprometer a continuidade da atividade pecuária”, justifica o senador do PSDB.
Caiado destaca que o “golpe” da recuperação judicial é comum em vários setores de atividade, não apenas no agropecuário. “Não raro, as sociedades empresariais têm deixado de pagar por suas aquisições realizadas junto a fornecedores, em decorrência de pedidos de recuperação judicial. Com isso, as empresas fornecedoras têm experimentado sérios prejuízos, o que vêm comprometendo significativamente a sua saúde financeira”, justifica Caiado em seu projeto, que atualmente está na Comissão de Desenvolvimento Econômico da Câmara.
Conforme afirma o Art. 47 da Lei de Falências, “a recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica”.
No Centro-Oeste, a situação é mais crítica em Mato Grosso, onde as dívidas dos frigoríficos com os pecuaristas é estimada em R$ 200 milhões. Dezessete dos 36 frigoríficos do estado estão em recuperação judicial. Segundo a Federação de Agricultura de Mato Grosso, a crise que atinge o setor já fechou, até agora, 12 mil empregos.
Em Mato Grosso do Sul, o número de demissões provocado pela crise que atingiu em cheio 20 dos 36 frigoríficos do estado chega a 8 mil. Em Goiás, 3,5 mil trabalhadores perderam o emprego com a adesão à recuperação judicial de cinco dos 32 frigoríficos instalados no estado.
A Lei de Falências foi aprovada pelo Congresso em 2005. A aprovação da nova legislação foi saudada pelo governo como medida importante para reduzir o chamado spread bancário – diferença entre a taxa de captação dos bancos e os juros cobrados nos empréstimos para o cliente. O entendimento era de que, com mais garantias, os bancos reduziriam a margem de risco incorporada ao spread. Quatro anos depois, a mudança ainda não causou efeito.
Uma das inovações da nova lei foi acabar com a figura da concordata, substituída pela recuperação judicial ou extrajudicial. Os ruralistas reclamam que, na condição de fornecedores, ficam por último no momento de receber os créditos dos frigoríficos. Pela legislação em vigor, têm a preferência os créditos trabalhistas (até o limite de 150 salários mínimos), os fiscais e os bancários. Os créditos sem garantia real, no qual se enquadram os pecuaristas, vêm apenas em quarto lugar na lista de prioridades.
O lado dos frigoríficos
Para o presidente da Associação Brasileira de Frigoríficos (Abrafrigo), Péricles Salazar, a crise econômica mundial foi um “fator preponderante” para que frigoríficos deixassem de pagar pecuaristas. “Houve uma baixa de liquidez que inviabilizou o adiantamento de contratos de câmbio.”
Para ele, muitos frigoríficos que entraram com pedido de recuperação judicial são empresas sérias com reais dificuldades. Outras têm problema de má-gestão. “Não se deve singularizar a situação. Mas alguns pedidos de recuperação prejudicaram produtores”, afirma.
Contudo, Péricles explica que os pedidos de recuperação judicial não são restritos ao setor dos frigoríficos e que a categoria não pode pagar por eventuais atos isolados de má-fé.
O Congresso em Foco procurou o líder do governo na Câmara, Henrique Fontana PT-RS), para questionar sobre a orientação do Palácio do Planalto, e da equipe econômica, em relação às propostas dos ruralistas. Por meio da assessoria, Fontana afirmou que ainda desconhecia o projeto de Ronaldo Caiado e que só faria comentários quando tivesse todas as informações.
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