Desde que reclamou do papel de vice “decorativo”, conforme sua própria definição em carta à então presidente Dilma Rousseff, Michel Temer tem tentando encarnar o papel de pacificador do país. Pacificar o Brasil e retomar o crescimento têm sido dois mantras repetidos à exaustão em seus discursos. Mas, seis meses após ter assumido a Presidência da República, o peemedebista encontra dificuldade para fazer a paz prevalecer entre os seus próprios auxiliares. De maio para cá, o novo presidente perdeu cinco ministros e viu este fim de semana Geddel Vieira Lima, da Secretaria de Governo, subir na corda bamba por força do último demissionário, o ex-ministro da Cultura Marcelo Calero. Até o momento, os ministros que não caíram em razão de acusações saíram atirando em algum colega, realçando o cenário de crise política.
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Os problemas de Temer começaram dez dias após sua posse, ainda na condição de presidente interino. Um dos principais articuladores do impeachment no Congresso, o senador Romero Jucá (PMDB-RR) durou uma semana à frente do Ministério do Planejamento. A divulgação de uma conversa entre ele e o ex-presidente da Transpetro, um dos delatores da Operação Lava Jato, foi fatal para o peemedebista. Entre os investigados no petrolão, ele defendeu a saída de Dilma para “estancar essa sangria” da Lava Jato. “Se é político (o problema), como é a política? Tem que resolver essa porra. Tem que mudar o governo para estancar essa sangria”, declarou.
Jucá voltou ao governo, mas não perdeu o protagonismo. Na semana passada, o senador assumiu a liderança do governo no Congresso. Um papel que ele conhece muito bem. Afinal, já foi líder no Senado dos ex-presidentes Fernando Henrique Cardoso (PSDB), Lula (PT) e Dilma.
Comissão de Ética
Acusado nesse sábado pelo agora ex-ministro da Cultura Marcelo Calero de lhe pedir que interferisse no Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) para salvar um empreendimento onde comprou um apartamento, Geddel começa a semana balançando no cargo. Embora tenha conversado com Temer e dado diversas entrevistas no fim de semana para se defender, o ex-deputado baiano terá de se explicar à Comissão de Ética da Presidência da República, que pode abrir já nesta segunda um processo disciplinar contra ele.
O caso dele foi incluído como primeiro item da pauta pelo presidente do colegiado, Mauro Menezes. No Congresso, várias lideranças da oposição já anunciaram que pretendem convocá-lo e até pedir uma acareação entre o ministro da Secretaria de Governo e o ex-ministro da cultura. Marcelo Calero, porém, não é o primeiro a entregar o cargo descarregando artilharia pesada contra o próprio governo.
Fogo amigo
Em setembro, Fábio Medina deixou o comando da Advocacia-Geral da União (AGU). Na saída, atribuiu sua queda à insatisfação do Planalto com as medidas tomadas por ele contra políticos investigados no petrolão. Medina atacou diretamente o ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, com quem teve maiores atritos: “O governo quer abafar a Lava Jato”.
A operação que apura o maior esquema de corrupção de que se tem conhecimento no país também derrubou outros dois ministros de Temer. Uma semana depois do desligamento de Jucá, o ministro da Transparência, Fabiano Silveira, entregou o cargo após ser flagrado em conversa gravada por Sérgio Machado em que ele sugere estratégia de defesa ao presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), um dos investigados na Lava Jato. Fabiano enfrentou forte resistência dos servidores da Controladoria-Geral da União (CGU) e chegou a ser impedido de entrar na sede do órgão. Durou duas semanas no cargo.
A Lava Jato também derrubou Henrique Eduardo Alves (PMDB) do Ministério do Turismo. Em 16 de junho, o ex-presidente da Câmara caiu após a divulgação de informações de que ele tinha contas secretas no exterior. Ele também foi citado por Sérgio Machado em sua delação como beneficiário de R$ 1,5 milhão de propina. Desde julho o deputado é réu na Justiça Federal em Brasília por omitir contas na Suíça.
Caso de corrupção
Ainda nesse sábado, em um evento no Rio, Marcelo Calero classificou a pressão feita por Geddel como um caso de corrupção. “Não desejo a ninguém estar diante de uma pressão política, claramente um caso de corrupção”, declarou. Segundo ele, o ministro da Secretaria de Governo o procurou cinco vezes pedindo que o Iphan autorizasse a construção de um prédio alto em uma região histórica de Salvador. Em duas ocasiões, ressaltou que tinha comprado um apartamento em andar alto do edifício.
“Percebi que estava diante no mínimo de uma advocacia administrativa. Ele queria que um agente público, no caso eu, fizesse uma intervenção num órgão público em razão de um interesse privado. Na última ligação, dia 6 de novembro, ele foi bastante enfático e disse que não queria ser surpreendido por nenhuma decisão, que não queria ser surpreendido e ter que pedir ‘a cabeça’ da presidente do Iphan”, disse Calero.
“Deixar o cargo por isso?”
O ex-ministro contou que levou o problema ao presidente Michel Temer. “Ele falou: ‘Mas o presidente sou eu, não o Geddel’. Só que eu percebi que a pressão ia continuar, então preferi sair”, relatou. Temer ainda não se pronunciou publicamente sobre o assunto. Geddel disse que conversou nesse sábado, pela manhã, com o presidente da República. E ouviu dele mensagem de confiança e apoio.
O ministro da Secretaria de Governo admite que conversou algumas vezes com o colega da Cultura sobre a construção do prédio, mas que não teve a intenção de pressioná-lo. Segundo ele, seu interesse não era no futuro de seu imóvel, mas na geração de empregos com o empreendimento. Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, Geddel minimizou a gravidade da denúncia feita contra ele, que pode ser enquadrada como crime de advocacia administrativa: “Deixar o cargo por isso? Pelo amor de Deus!”. “Onde é que tem maracutaia, problema, irregularidade nisso?”, acrescentou.
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