No banho-maria do meio mundo com o termômetro na casa dos 36 graus, à sombra, amessentados num sábado desses, entre uma e outra gelada, vimos a crise, sem pedir licença, entrar como pauta única na roda de amigos da Confraria da Celina.
– A culpa é tua! Ivan apontou o dedo na direção de Pachanga. Minha? – Sim, tua. Mas como se eu não votei nela! – Então a culpa é do Lula. Alto lá! Disse um solitário petista do grupo, a culpa é do FHC. – Ledo engano meu caro, pulou um tucano, a culpa é do Sarney! – Do Sarney? Sim, não é ele o nosso Matusalém da corrupção? – Engano seu, amigo. Quer saber mesmo de quem é a culpa? – Claro, diga lá! – A culpa é da Dilma e do Temer, do PT e do PMDB, e também do Cunha. – Ah é! E o Maradona? Não entra nessa lista? Por acaso, não foi ele quem fez aquele gol de mão?
Peraí pessoal, sobre essa tenebrosa crise política e econômica, acho eu que vocês estão apontando o dedo para o varejo. Sei que todos estão loucos, não apenas para achar os culpados, mas também esmurrá-los até sangrar. Entendo, estamos todos enraivecidos, afinal viver em um país que tem tudo para dar certo, e ter que passar pelos apertos que estamos passando, isso só pode ser obra de gente com veia bandida, que precisamos identificar e responsabilizar pelos crimes continuados cometidos.
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Vocês são meus amigos, mais que isso, meus eleitores, e sabem que faço parte no Senado dessa representação política falida. Devo admitir, cheguei a pensar que fôssemos reagir e colocar um freio nessa marcha da insensatez chamada impeachment. Mas que nada, prevaleceram as negociatas e os interesses inconfessáveis, que agora estão sendo confessados nas gravações de Sérgio Machado. Os sarneys, renans, romeros, aécios e agripinos deixaram de lado a política, enterraram a oportunidade de construirmos, com as bênçãos do povo brasileiro, uma saída pactuada para por fim à crise. No entanto fizeram o que lhes convinha. Partiram para o confronto de vida ou morte, dando sequência ao impeachment proposto pelo seu “impoluto” colega de causas próprias, Eduardo Cunha, réu em processo criminal, um gângster renomado e poderoso.
Esse acordo sinistro fez com que o Senado, por maioria acachapante (55 dos seus 81 membros), apontasse o dedo na direção do Palácio do Planalto e sentenciasse: é ela a única culpada! E, com base numa lei senil, adiantaram a punição, afastando-a da Presidência da República por até 180 dias. Em seu lugar, empossaram interinamente o vice Michel Temer, chefe da conspiração e sócio da crise. Agradecido, devolveu o favor, chamando para junto de si mentores e autores da tramoia para livrá-los das mãos – infelizmente nem sempre implacáveis – da nossa Justiça. Mas, pelo andar da carruagem, pelo menos seus planos de barrar a Operação Lava Jato já foram para o brejo.
Convenhamos, nessa encalacrada em que nos enfiaram ultimamente, não é nenhuma novidade, vira e mexe pagamos a conta do descalabro promovido por essa turma do poder, que não se sente responsável por nada que não seja engordar seus ganhos. Esses, que pairam acima da lei, ofendem-se e chamam de mau caráter os que lhes cobram seu cumprimento. E mais: são uns craques, e dos mais habilidosos, em inventar bode expiatório.
Pensando, pensando para chegarmos aos culpados, acho que o melhor caminho é o da Constituição da nossa República, que define o quadrado de cada qual, se não vejamos, lá no parágrafo décimo (X) do artigo quadragésimo nono (49º): diz que fiscalizar e controlar, diretamente, ou opor qualquer de suas Casas, os atos do Poder Executivo, incluídos os da administração indireta, é de competência exclusiva do Congresso Nacional.
Bingo! Acho que encontramos o “x” da questão. Mais claro do que isso, paciência, só se desenhar. Reza a Constituição, repito, fiscalizar e controlar o Executivo é competência exclusiva do Congresso Nacional. Isso acontece? O Senado cumpre essa determinação constitucional? Claro que não! Pelo contrário, não só não fiscaliza e nem controla coisa alguma, como também os mandachuvas da casa se associam aos mandachuvas do Executivo para a prática criminosa da corrupção – taí o petrolão que não me deixa mentir, e as CPIs que invariavelmente terminam em pizza.
– Quer dizer então que não há esperança? Indagou-me Deuzimar com ar desanimado. – Claro que tem, amigo. Hoje dispomos de leis que permitem investigar e punir criminosos do andar de cima da sociedade, e isso virou fato com a Lava Jato, mas também temos leis que obrigam o poder público a prestar contas de seus atos. Cito a Lei de Acesso à Informação (LAI) e a Lei da Transparência, essa última de nossa lavra.
Agregue-se a esses meios legais a tecnologia digital como instrumento que nos permite exercitar a democracia direta, controlando e fiscalizando os gastos públicos. A bola agora está com a sociedade, que para tanto precisa se mobilizar para manejar essas ferramentas em defesa de seus interesses. E, por último, não menos importante, urge que cada um e cada uma faça sua parte. Adianto-lhes que nós estamos fazendo a nossa, por meio do Movimento #FiscalizaBr. Você está convidado a participar.
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