De olho na sabatina à qual será submetido no Senado, o subprocurador Augusto Aras já conversou com mais de 20 senadores desde que foi indicado pelo presidente Jair Bolsonaro para assumir o comando da Procuradoria-Geral da República (PGR), há exatamente uma semana. Nesta quinta-feira (12), por exemplo, disse ao senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) que alertou Bolsonaro sobre o fato de que o presidente não pode mandar nem desmandar no Ministério Público (MP). O discurso de independência, contudo, não convenceu Vieira. Em entrevista exclusiva ao Congresso em Foco, o senador disse que Aras molda o discurso de acordo com o interlocutor e, depois que essa declaração foi gravada pela TV Globo, indicou uma tendência de alinhamento com o governo federal.
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“A gente estava no início da conversa e eu toquei na questão da independência e da autonomia do Ministério Público. Eu pontuei que não tinha dúvida da legalidade da indicação porque a lista tríplice não é uma exigência legal, mas tinha dúvida se a busca pelo cargo, a aproximação e os compromissos com o presidente não podiam contaminar sua atuação”, contou Vieira. Segundo o senador, Aras respondeu essa questão dizendo que, logo no primeiro encontro com Bolsonaro, destacou as competências constitucionais que garantem a independência do procurador-geral da República e impedem o presidente de comandar o MP, como mostrou a TV Globo.
Logo depois disso, quando já não estava mais sendo gravado, contudo, indicou ter uma visão mais politizada e alinhada do Ministério Público. “O que ele fala não é que ele, Augusto Aras, terá essa independência. O que ele estava alertando era sobre a importância da escolha, uma vez que, depois de escolhido, não dava para voltar atrás. E o histórico aponta que os últimos presidentes foram alvo de denúncia”, esclareceu Vieira.
O senador explicou que, na conversa desta quinta, Aras mostrou ter uma visão mais estadista do papel do Ministério Público, o que indica a possibilidade de alinhamento com o governo federal. “Ficou bem claro que temos pelo menos duas grandes divergências. A primeira delas é com relação à compressão de qual é o papel do Ministério Público Federal. Aras entende que o MP deve atuar como um estadista na construção das políticas públicas. Já eu acho que isso está fora do papel do MP, que deveria ser um fiscal dessas políticas públicas”, revelou Vieira, dizendo que Aras defendeu uma atuação mais alinhada, em que o Ministério Público desenvolve políticas públicas em conjunto com o governo, sobretudo no campo econômico.
O segundo ponto questionado pelo senador diz respeito à autonomia do Ministério Público. “Os procuradores têm uma série de garantias constitucionais de independência. Mas o Aras entende que essa independência tem que ser mitigada por uma espécie de hierarquia, em que os procuradores mais antigos atuariam para unificar as posições do MP. Eu questionei se essa não seria uma ação inadequada, mas ele entende que não, ele acha que a autonomia excessiva da primeira instância seria prejudicial”, revelou o senador, dizendo que “fica claro nas entrelinhas uma promessa de enquadramento”.
Além dessas divergências, Alessandro Vieira notou certa contradição no discurso de Aras. O senador explicou que, ao conversar com a bancada do PT, o subprocurador teria criticado o politivismo do MP. Já com Vieira, que é grande defensor do combate à corrupção, focou a conversa na valorização e na ampliação do combate à corrupção, defendendo inclusive o fortalecimento da Operação Lava Jato. “São discursos que aparentam certa contradição”, avaliou Alessandro, dizendo que Aras mostrou ter grande experiência na advocacia, mas também aparentou ser “um cidadão que busca modular o discurso de acordo com interlocutor”.
O senador pretende, então, esclarecer esses e outros posicionamentos do subprocurador na sabatina à qual ele será submetido, provavelmente no próximo dia 25. “Ele vai ser indagado sobre temas sensíveis”, garantiu Vieira. O senador demonstra, então, que a sabatina não será tão fácil quanto espera o governo, mas admite que Aras deve ser confirmado para a PGR pelo Senado. Ele acredita que a rejeição é algo muito radical e que não deve haver votos suficientes para isso, sobretudo porque a votação é secreta.
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