Há um universo de cerca de 80 milhões de brasileiros que são invisíveis para a maioria das instituições brasileiras. Não voltam seus olhos quase nunca para eles o Ministério Público, a Advocacia Geral da União ou qualquer outro setor dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. Mas é unicamente para atender a eles – a população mais pobre, mais carente, mais sem recursos – que existe a Defensoria Pública da União. “Aquele que está alijado de qualquer oportunidade social, de assistência, de educação, de saúde, em situação de vulnerabilidade extrema, essas pessoas procuram a Defensoria Pública depois que todas as demais portas se fecharam para elas”, resume o presidente da Associação Nacional das Defensoras e Defensores Públicos Federais (Anadef), Eduardo Kassuga, nesta entrevista ao Congresso em Foco.
Fruto, talvez, da desigualdade social que ainda é uma das chagas brasileiras, há uma imensa diferença em termos de estrutura quando a Defensoria é comparada com outros órgãos que atuam na área jurídica pública. São 645 defensores públicos. Enquanto isso, há 1.150 integrantes do Ministério Público, mais de 5 mil advogados públicos federais e cerca de 1.900 juízes. “Há uma situação de muito desequilíbrio em desfavor da população que realmente precisa”, diz Kassuga.
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Nesse sentido, a Anadef está particularmente preocupada com as repercussões que podem advir da reforma administrativa que está em curso na Câmara dos Deputados. Kassuga tem medo que a reforma acabe por cristalizar essa situação de desequilíbrio ou ainda piorar a possibilidade de trabalho dos defensores públicos.
Dois pontos especialmente preocupam a Anadef. O primeiro é o risco do fim da estabilidade do servidor. Ou mesmo de não haver estabilidade por um período. “Como os defensores acabam muitas vezes litigando contra o Estado, é necessária a manutenção da noção de independência desses servidores. Sem ela, toda a noção de autonomia fica em xeque”, diz Kassuga.
Mesmo que a estabilidade seja garantida para os atuais servidores, o risco prossegue, para o presidente da Anadef. “Tem se dito que isso seria preservado para os atuais servidores. Mas a gente precisa lembrar que as instituições se compõem de pessoas. Se daqui para a frente, os próximos defensores não tiverem estabilidade, em algumas décadas teremos uma instituição perdida”, argumenta.
Outro ponto que preocupa os defensores públicos é a possibilidade de proibição de pagamento de passagens e diárias que não estejam previstas em lei. No caso da Defensoria Pública, boa parte das ações dos defensores relaciona-se à necessidade de se deslocar a localidades distantes. A Defensoria Pública está presente somente em 29% das seções judiciárias do país. Para atender aos demais pontos, os defensores públicos têm que viajar. Boa parte do seu público vive em comunidades ribeirinhas, indígenas, quilombolas, por exemplo. Longe mesmo das capitais dos estados. “Como vamos alcançar essa população?”, questiona Kassuga.
Como, na defesa da população mais carente, a Defensoria Pública muitas vezes tem como adversária a própria União, nem sempre esse é um trabalho cujos resultados são bem quistos. Porque muitas vezes geram mais despesas. Graças ao trabalho dos defensores públicos, aumentou consideravelmente, por exemplo, o universo daqueles que receberam auxílio emergencial durante a pandemia de covid-19. Pessoas que tiveram seus pedidos indeferidos acessaram a Defensoria Pública. Desde o início da pandemia, os defensores públicos fizeram mais de 575 mil atendimentos somente quanto ao auxílio emergencial. E conseguiram que o benefício contemplasse mais de 150 mil novas pessoas. Um aplicativo chegou a ser lançado pela Defensoria Pública para facilitar as ações. O aplicativo pode ser baixado a partir do site da Defensoria.
Veja a entrevista com Eduardo Kassuga:
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